Uma operação malsucedida de transferência de óleo de um navio em movimento para outro, conhecida como “ship to ship underway”, transformou-se em uma das hipóteses para explicar o vazamento em alto-mar que provocou o desastre ambiental no Nordeste brasileiro. Relativamente comum, a manobra é segura quando feita oficialmente. Mas, longe da costa e da fiscalização, pode ter sido executada de forma irregular e causado o acidente.
Quando o óleo é extraído de plataformas em alto-mar e precisa ser transportado para terra, é necessário o uso de um navio especial, com posicionamento dinâmico. Trata-se de um equipamento que oferece estabilidade à embarcação, para que ela fique parada e possa receber o petróleo em seus tanques. O uso dessa aparelhagem, porém, encarece o frete do navio. Por isso, a tendência dos transportadores é, o quanto antes, transferir esse óleo para uma embarcação comum.
A operação pode ser feita no porto mais próximo, com os dois navios parados em um ambiente seguro, ou em mar aberto, com os dois navios em movimento. Nesse caso, a manobra é um pouco mais arriscada.
Números
Dados da Marinha do Brasil e das empresas petrolíferas mostram que em 2018 o equivalente a 77 milhões de barris de óleo foram exportados por meio de operações “ship to ship”. Este ano, somente até setembro, o volume já chega a 69 milhões de barris. Os números são referentes apenas a operações realizadas na costa de São Paulo, onde são autorizadas. No Brasil, os procedimentos técnicos e administrativos para obtenção de uma autorização ambiental para esse tipo de operação foram regulamentados pelo Ibama em 2013. Também é necessário o aval da Marinha, que define a área onde as atividades podem ser realizadas.
Quando ocorrem nos portos, as transferências são consideradas mais seguras. Mesmo em caso de acidente, há mais condições de correção imediata. Em mar aberto, há fatores de risco adicionais, como condições climáticas adversas, rompimento das mangueiras de conexão entre os navios e limitação da capacidade de resposta a eventuais acidentes.
E há ainda a hipótese mais provável no caso de acidente: operações irregulares, feitas por navios fantasmas – que estão fora dos radares. “A operação ‘ship to ship’ é comum, normalmente feita em áreas específicas, com as devidas autorizações”, explicou o engenheiro naval Floriano Pires, do Instituto Alberto Luiz Coimbra de Pós-Graduação e Pesquisa de Engenharia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (Coppe/UFRJ). “Pode haver um vazamento? Pode. Mas o sistema tem redundâncias e controles. Seria incomum numa operação ‘ship to ship’ normal um vazamento de óleo tão grande. Teria de ser uma operação irregular, clandestina, sem o mínimo de cuidado.”
A engenheira naval Gabriela Timmerman, especialista em “ship to ship”, dona da consultoria Iskra, concorda com o colega. “A operação tem diversos mecanismos de segurança e, se houver um vazamento, ela é automaticamente interrompida”, explicou. “Para um vazamento desse volume, o mais provável é que tenha havido algum outro problema, como uma avaria grave de casco ou uma explosão dentro do navio.” As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.