Brasília e São Paulo – Nos últimos dias o ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares apresentou versões contraditórias sobre a avalanche de denúncias da qual virou protagonista. Mas pelo menos num fato Delúbio não mentiu: ele tinha livre acesso aos corredores do poder e alardeava sua amizade com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Costumava impressionar seus interlocutores ao demonstrar que tinha portas abertas não apenas no Palácio do Planalto, mas também no Alvorada e na Granja do Torto. Era também freqüentador de comitivas presidenciais.
Na semana passada, a Agência O Globo ouviu oito pessoas, entre assessores, parlamentares e dirigentes petistas com acesso ao Planalto, ao Alvorada e ao Torto. Todos confirmaram que Delúbio freqüentava os palácios, inclusive nas peladas no Torto.
Em alguns relatos, parlamentares petistas mostraram-se surpresos com o excesso de intimidade demonstrado por Delúbio em conversas com pessoas de fora do núcleo próximo do presidente. No dia 27 de março, quando assistia ao jogo da seleção brasileira contra o Peru, no Estádio Serra Dourada, em Goiânia, Delúbio fez um convite inusitado a um dirigente esportivo. O Brasil tinha acabado de derrotar a seleção peruana por 1 a 0.
?Quando você vai aparecer para jogar futebol lá na Granja do Torto??, convidou o ex-tesoureiro, com naturalidade. Quem estava próximo de Delúbio estranhou o convite.
Era com conversas desse tipo que Delúbio aproximava-se de empresários para tentar obter recursos para o PT e aliados. Nesses encontros, relatados por dois empresários, Delúbio costumava ser direto: dizia que era ele quem falava pelo governo.
?O que o Delúbio fez foi errado. Ele exagerou na dose. Você não pode usar a amizade com um presidente para tirar benefício pessoal ou mesmo partidário. Sou amigo de Lula e também visito o presidente no Alvorada e no Torto. Mas nunca tirei proveito disso. Ele traiu a confiança de Lula?, diz o deputado Devanir Ribeiro (PT-SP).
A credibilidade de Delúbio junto aos empresários foi cuidadosamente construída pelo ex-tesoureiro em aparições públicas constantes ao lado do presidente desde a transição. No fim de 2002, foi presença constante na Granja do Torto, onde Lula ficou hospedado antes de tomar posse.
Em 2003, era um assíduo passageiro em viagens oficiais de Lula. Em abril daquele ano, parlamentares que acompanhavam Lula numa viagem ao Mato Grosso do Sul ficaram espantados com a intimidade de Delúbio com o presidente durante o vôo. O ex-tesoureiro ficou o tempo todo na cabine presidencial, no sofá, ao lado de Lula. Os dois fumavam cigarrilha e conversavam como grandes amigos.
?Quando entramos na cabine presidencial, lá estava o Delúbio fumando uma cigarrilha com Lula. Não havia protocolo entre os dois. Delúbio estava à vontade?, conta o deputado Murilo Zauith (PFL-MS), que não conhecia, até então, o tesoureiro petista.
Em maio de 2003, fazendeiros mineiros também ficaram impressionados com a proximidade entre Lula e Delúbio, durante a ExpoZebu, em Uberaba (MG). Delúbio ficou numa mesa próxima do presidente e levantava-se o tempo todo para falar ao ouvido do presidente. Em novembro do mesmo ano, sem cargo no governo ou agenda a cumprir na África, o então tesoureiro do PT integrou a comitiva oficial do Brasil como convidado de Lula. Na Namíbia, chegou a se sentar à mesa da delegação oficial na reunião bilateral com o governo local.
Soares arrecadou R$ 48 mi para a campanha de 2002
Brasília – O prestígio de Delúbio Soares com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva se consolidou apenas com a eleição em 2002, graças a seu desempenho na campanha presidencial: foi ele o artífice da arrecadação de mais de R$ 48 milhões para o PT na campanha que elegeu Lula presidente.
Embora gostasse de se gabar da amizade com o presidente, o ex-tesoureiro nunca pertenceu ao pequeno círculo de amigos de Lula. A relação era partidária e de tesoureiro e candidato.
?Dentro do PT, o presidente sempre teve apenas dois grandes amigos íntimos: Gilberto Carvalho (secretário particular do presidente) e Luiz Gushiken (ex-ministro). Com os demais, Lula só mantém relações políticas. Algumas mais estreitas, como já foi com (o deputado) José Dirceu?, afirma um dos coordenadores das campanhas de 1998 e 2002.
Outro amigo do presidente lembra que Delúbio era inexpressivo no partido até 1999. ?Nunca vi Lula e Delúbio juntos antes de 2002. Foi graças ao Dirceu que Delúbio saiu do anonimato. Delúbio era homem da confiança de Dirceu, que o escolheu como tesoureiro?, diz o petista.