Quase fechando as portas de seu governo – e de uma era de financiamento cultural baseada em duas leis de incentivo -, o presidente Fernando Henrique Cardoso assinou decreto, no último dia 1.º, modificando a regulamentação da espinha dorsal dessa política: a Lei Rouanet (Lei n.º 8.313, de 1991)
Segundo o governo, o decreto número 4.397, que modifica a lei, cria um novo mecanismo de financiamento cultural. ?A exemplo dos sistemas de ?endowment? dos Estados Unidos, as instituições culturais brasileiras poderão captar patrocínio, em montantes de R$ 2 milhões até R$ 20 milhões, para planos plurianuais, com periodicidade de três a cinco anos.?
A mudança é benéfica especialmente para instituições cujo planejamento de atividades exige comprometimento prévio de recursos. Casos muito claros são os dos Patronos do Theatro Municipal de São Paulo ou do Mozarteum, que têm dificuldades para marcar concertos de música erudita – geralmente acertados com até três anos de antecedência por agentes.
Com a possibilidade de captar patrocínio antecipadamente instituições dessa natureza trabalham com mais confiança e planejamento. Os tetos estão fixados entre R$ 2 milhões e R$ 20 milhões. ?Os planos anuais e plurianuais de atividades de sociedades civis de natureza cultural equiparam-se a projetos culturais, desde que assim considerados e aprovados pela Comissão Nacional de Incentivo à Cultura?, informa o ministério.
Empresas maiores estarão certamente mais aptas do que as menores instituições culturais para buscar esses recursos antecipados, por conta de sua estrutura. A previsão antecipada do faturamento de certos patrocinadores também ajuda muito, o que restringe um pouco a medida.
A questão fundamental é: se essa era uma reivindicação antiga, e se era tão obviamente benéfica, por que só agora a atual gestão federal resolveu mudar a lei? ?Como disse o presidente Fernando Henrique, o governo estará em funções até 31 de dezembro?, afirmou o ministro da Cultura, Francisco Weffort. ?E esta inovação é exatamente uma função de governo. Uma inovação que, aliás, sendo decreto, também não engessa ninguém, nem mesmo o próximo governo?, ponderou.
Weffort também defendeu, em entrevista, uma outra mudança na lei, mas essa parece inaplicável ainda nesta gestão: a mudança do porcentual de dedução da renúncia fiscal das empresas. Após 8 anos à frente do ministério, ele deu ?dicas? de como melhorar o desempenho da área.
?Além dos projetos plurianuais que se propõem agora, haverá que ampliar os recursos de orçamento direto e abrir um pouco mais as válvulas de captação de recursos pelo mecenato, por exemplo admitindo a dedução fiscal de empresas de lucro presumido, ampliando o porcentual de dedução fiscal de 4% para 6% (como era até 1997), estabelecendo critérios de dedução fiscal que beneficiem em particular projetos propostos para outras regiões além da Sudeste.?
A Lei Rouanet foi alterada várias vezes nas duas gestões de Fernando Henrique Cardoso. Em 1995, recebeu sua primeira revisão total. Dois anos depois, o presidente promoveu nova alteração para igualar benefícios da legislação com os benefícios da lei do cinema, que permitia vantagem fiscal de até 100%.
?Vamos dar apoio às excepcionalidades, da mesma forma que estamos fazendo com o cinema, que teve um impulso extraordinário nestes últimos dois anos?, disse na ocasião Francisco Weffort. O governo fixou quatro grandes áreas a serem beneficiadas: artes cênicas, música, livros de arte e acervos para museus e bibliotecas públicas. Todas elas passaram a ter também os 100% de vantagem fiscal.