O governo Lula, que nunca foi um sinônimo de consenso, está cada vez mais dividido. A crise dos últimos meses explicitou ainda mais a guerra interna e a divisão dos grupos dentro do governo sobre os mais diversos temas, inclusive os rumos da economia. Uns tentam diminuir a crise e defendem uma trégua com a oposição, enquanto outro grupo pressiona por um enfrentamento imediato.
Na economia, a polarização é entre os que querem uma flexibilização e os que insistem em manter uma linha ortodoxa. "Todo governo é assim. No PT isso fica mais exacerbado porque o partido tem uma tradição de debate. Esse comportamento não vai mudar", reconhece o ministro das Relações Institucionais, Jaques Wagner. A divisão mais explícita no momento é entre os chamados belicistas e pacifistas em relação à crise política.
Apesar de algumas vezes o presidente Lula manifestar o desejo de partir para guerra, ele tem sido convencido de que o melhor para o governo, neste momento, é tentar diminuir a temperatura no Congresso Nacional. O núcleo dos pacifistas é formado pelos ministros Antônio Palocci (Fazenda), Márcio Thomaz Bastos (Justiça) e Jaques Wagner, além do líder do governo no Senado, Aloizio Mercadante (PT-SP). Com o recrudescimento da crise, esse grupo tem agido para acalmar o presidente e setores do governo e do próprio PT. Entre os que acham que agora é hora de ir para guerra estão o ministro do Trabalho, Luiz Marinho, e o presidente do PT, Ricardo Berzoini. "Existe essa divisão. Mas o governo é uma média dessas opiniões. Não se pode confundir uma visão pacifista com covardia", diz Wagner.
Os pacifistas já constataram a dificuldade de neutralizar os que defendem o enfrentamento, principalmente depois dos ataques constantes da oposição. O próprio presidente tem demonstrado disposição maior para o embate. Lula avalia que o recrudescimento dos ataques deve-se ao desespero da oposição que, na sua visão, teria percebido a recuperação da popularidade do governo e à possibilidade concreta de uma reeleição.
Sobre as últimas denúncias que alimentaram a crise (a de dinheiro cubano para a campanha do PT em 2002 e a confirmação pela CPMI dos Correios de que dinheiro do Banco do Brasil irrigou o valerioduto) o PT foi orientado a enfrentar a oposição para tentar desqualificar a denúncia. Mas com o cuidado de não acirrar ainda mais o clima.
Lula pede diálogo com a oposição
Brasília – Desde que a temperatura voltou a subir em Brasília, Lula determinou que integrantes do governo abrissem diálogo com tucanos e pefelistas. Nas últimas semanas, Palocci, Wagner, Thomaz Bastos e Mercadante estão mantendo contatos com a oposição para estabelecer um entendimento. Mas esse grupo reconhece que toda vez que o PSDB e o PFL atacam fica mais difícil segurar a tropa petista.
Até mesmo ministros como Ciro Gomes, da Integração Nacional, que costumam ajudar no contato com a oposição, já defendem nos bastidores uma ação mais afirmativa. Dilma Rousseff também quer uma posição mais firme. O chefe do Núcleo de Assuntos Estratégicos, Luiz Gushiken, que estava sumido, voltou a ter influência com a eleição de Berzoini para o comando do PT e passou a defender o enfrentamento com a oposição. Quem ajuda a alimentar a tensão nesse grupo é o ex-chefe da Casa Civil e deputado José Dirceu (PT-SP).
Na economia, é cada vez mais explícita a divisão: enquanto os ministros Palocci e Paulo Bernardo (Planejamento), além do presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, tentam manter o rigor do ajuste fiscal com um superávit primário elevado, Lula está sendo pressionado por Dilma, Marinho, Ciro Gomes e a base petista para estimular o crescimento da economia no próximo ano, com maior liberação de recursos para investimentos.
Lula está sendo alertado que só com um crescimento expressivo em 2006 vai conseguir neutralizar a crise e ter chance de reeleição. O superávit primário recorde serviu de sinal amarelo para o grupo que defende a flexibilização.