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Brasília – A Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) que apurou irregularidades cometidas no âmbito do Banco do Estado do Paraná (Banestado) terminou ontem sem que o relatório final fosse votado. Depois de um debate de mais de uma hora, o presidente da comissão, senador Antero Paes de Barros (PSDB-MT), encerrou os trabalhos sem colocar o texto do relator, o deputado José Mentor (PT-SP), em votação. O relatório propõe o indiciamento de 89 pessoas, todas acusadas de crimes como evasão de divisas e lavagem de dinheiro. Ao todo, foram apresentadas 51 emendas.

Após o encerramento da CPMI, Mentor avisou que vai continuar se valendo de todos os meios possíveis para garantir a votação do relatório final e informou que entrará na Justiça, se for o caso. "Para o relator, não acabou a CPMI", assegurou.

Mentor disse ainda que sem votação o relatório não poderá ser utilizado como prova e, portanto, não poderá ser encaminhado ao Ministério Público (MP), como pretende o presidente da comissão, Paes de Barros. O senador tucano, porém, confirmou que vai encaminhar ao MP o relatório de Mentor e seu próprio voto em separado. Paes de Barros argumentou que a comissão deveria ter votado o relatório na última sessão, realizada no dia 21. Segundo ele, a votação não ocorreu por causa das obstruções feitas pelo relator da CPMI.

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Mais cedo, Mentor e a líder do governo no Senado, Ideli Salvatti (PT-SC), haviam dito que, de acordo com a Constituição e com os provimentos da Câmara e do Senado, o relatório final não poderia mesmo ser votado nesta segunda-feira. De acordo com os dois, a votação do relatório não fazia parte da pauta da autoconvocação do Congresso e por isso não poderia ser colocado em votação.

Seis dias antes da data marcada para votação do relatório, Paes de Barros apresentou um voto em separado que pede o indiciamento do atual presidente do Banco Central, Henrique Meirelles. Esse voto em separado também deveria ser apreciado. O presidente da CPMI já tinha alertado que encaminharia ao Ministério Público cópias do relatório de Mentor e do seu próprio voto em separado se não houvesse votação.

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"A comissão foi conduzida de maneira muito passional, devia ter sido mais racional, de forma que não atingisse tanto a imagem do Congresso e não servisse tanto a especulações", criticou o presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP).

Voto em separado

O voto em separado de Paes de Barros foi apresentado uma semana após o relator, José Mentor, entregar uma proposta de relatório final amplamente bombardeada pelos demais integrantes da comissão. Paes de Barros sustenta que seu relatório é uma tentativa de consertar supostas falhas no documento proposto por Mentor. O senador tucano centra fogo em Meirelles, absolvido no relatório de Mentor da acusação de enviar dinheiro ao exterior sem declarar à Receita Federal. Em seu relatório de 398 páginas, Paes de Barros pede ao Ministério Público Federal que indicie Henrique Meirelles por crime contra o sistema financeiro e por evasão de divisas, pela transferência de US$ 50,6 mil para uma conta administrada por doleiros. Antero sugere o indiciamento do ex-presidente do Banco do Brasil Cássio Casseb Lima e os ex-diretores do BC Luiz Augusto Candiota e Beny Parnes, por movimentações financeiras internacionais não declaradas. A direção do Banco Central não quis se manifestar.

Paes de Barros isentou um dos principais nomes do rol de indiciados do petista: Gustavo Franco, ex-presidente do BC. Ele tivera seu indiciamento pedido por Mentor, que o apontou como responsável pela autorização especial concedida pelo BC em 1996, quando se iniciaram as fraudes nas remessas ao exterior por meio de contas CC5 (destinadas a não-residentes).

O tucano pede ainda que a Polícia Federal e o Ministério Público investiguem operações financeiras do ex-presidente da Transbrasil, Antônio Celso Cipriani, que, sustenta, foi poupado por Mentor por ter sido um dos principais doadores da campanha do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Trajetória de denúncias

Rio – A Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) do Banestado, instalada em 18 de junho de 2003 e que apura a evasão de US$ 30 bilhões do País através das contas CC-5, enfrentou divisão política e denúncias de vazamento de informações e prática de chantagem. O vazamento ocorreu em relação a 534 mil operações feitas por doleiros no MTB Bank, de Nova York, em nome de brasileiros. A divulgação da lista das pessoas que movimentaram US$17 bilhões entre 1997 e 2003 fez surgir a suspeita de que estaria sendo montado um banco de dados para chantagem. O presidente da CPMI do Banestado, senador Antero Paes de Barros (PSDB-MT), e o relator, o deputado federal José Mentor (PT-SP), passaram a trocar acusações desde então. Um dizia que o outro era responsável pela divulgação de informações sigilosas das investigações.

Em setembro, um dos integrantes da CPMI, o senador Heráclito Fortes (PFL-PI), denunciou que informações circulavam de forma clandestina nas mãos de poucos e se transformavam em instrumento "perigoso de pressão e de chantagem". O mesmo senador afirmou na época que nomes de envolvidos na remessa ilegal de dólares do País estavam sendo liberados de acordo com interesses políticos. Informações divulgadas na época davam conta que pelo menos oito empresários, executivos do mercado financeiro e doleiros teriam sido chantageados por supostos representantes de parlamentares que integram a comissão. Entre os chantageados estaria o ex-diretor de Política Monetária do Banco Central Luiz Augusto Candiota. O presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), classificou o vazamento como um dos casos mais graves da história do Congresso.

Em agosto, o relator da CPMI, José Mentor, chegou a suspender a investigação sobre dados obtidos na quebra de sigilos bancário, fiscal e telefônico de empresários, banqueiros, políticos e empresas. Os documentos, segundo ele, foram lacrados e guardados no cofre da CPMI até que as investigações fossem retomadas.