CPI vai quebrar sigilo de fundos de pensão

Reunião da CPI Mista dos Correios discute atuação de fundos de pensão.

Brasília – A CPI Mista dos Correios vai quebrar o sigilo dos fundos de pensão de estatais Previ (Banco do Brasil), Postalis (Correios), Petros (Petrobras) e Real Grandeza (Furnas e Eletronuclear), cujas diretorias foram partilhadas entre PT, PTB, PP, PL e PMDB. A decisão será tomada em votação prevista para esta semana.

A CPI Mista dos Correios quer examinar as negociações com títulos financeiros realizadas durante os últimos 24 meses para identificar vendedores e intermediários. No alvo estão os investimentos milionários em títulos pós-fixados (remunerados com base na variação do IGP-M e no IPCA) e transações com os bancos Santos, Rural, BIC, BMC, BMG, Pine e Panamericano.

Há suspeita de fraudes, enriquecimento ilícito de diretores e pagamento de altas taxas de corretagem a intermediários ligados a partidos aliados do governo. Em alguns casos, fundos de estatais teriam comprado papéis de remuneração baixa – na base do IGP-M mais zero de juros, ou seja, apenas a correção da inflação e mais nada. Em outros, como ocorreu na Fundação Real Grandeza, compras de títulos (CDBs, principalmente) chegaram a corresponder a 25% do patrimônio do Banco Santos, 20% do Rural e 15% do BMG.

A CPI Mista pretende, também, dimensionar eventuais perdas dos fundos de estatais em renegociações de investimentos, nos quais teriam assumido até 100% do capital total e votante de empresas cujas ações sequer têm valor no mercado.

Partidos de oposição, PFL e PSDB preparam uma ação paralela e específica sobre a Petrobras, por causa de gastos de R$ 850 milhões com publicidade no ano passado – o triplo do ano anterior – e de encomendas de plataformas marítimas (US$ 1 bilhão) a fornecedores nacionais. Há suspeita de superfaturamento.

Integrantes da CPI Mista estão reconstituindo em detalhes o mapa do uso político de empresas públicas e de fundos de pensão. Eles encontraram no setor energético uma síntese dos negócios entre estatais e consultorias, corretoras e bancos privados, que resultaram em benefícios financeiros a integrantes de PT, PTB, PP e PMDB – intermediados por Marcos Valério de Souza, o suposto pagador do mensalão a parlamentares.

Logo após a posse, o então chefe da Casa Civil, José Dirceu, dividiu áreas-chave do comando das estatais Furnas e Eletronuclear entre o seu PT, o PTB do deputado Roberto Jefferson e o PP do deputado José Janene. São empresas com um fluxo de caixa mensal de R$ 400 milhões e 12 usinas (dez hidrelétricas e duas atômicas), que fornecem energia à região onde se concentram 65% do Produto Interno Bruto (PIB) do País.

O acordo se estendeu ao controle do fundo de pensão dos empregados dessas estatais, a Fundação Real Grandeza, cujos ativos somam R$ 4,8 bilhões. A presidência da entidade foi entregue a uma ala de sindicalistas do PT do Rio, liderada pelo deputado Jorge Bittar. O governo nomeou diretores indicados por PTB, PP e PMDB.

Como chefe da Casa Civil, Dirceu não participava de todas as etapas das negociações da base parlamentar. Elas eram conduzidas pelo então secretário-geral do PT, Sílvio Pereira, geralmente na sede do PT em Brasília. Ele escolhia a equipe de assessores de cada diretor nomeado por partido aliado. Sandra Cabral, assessora da Casa Civil, cuidava do arquivo com a memória desses acordos. Ela foi escolhida por relações de confiança com Delúbio Soares, então tesoureiro do PT.

A partir do primeiro semestre do governo Lula os negócios de Furnas, Eletronuclear e Real Grandeza mudaram de rumo. O milionário resseguro de Furnas e da Eletronuclear, por exemplo, foi entregue à corretora Assurê, do empresário carioca Henrique Brandão, habitual financiador de campanhas de Roberto Jefferson, então presidente do PTB. É proibida a atuação de corretoras privadas em negócios de resseguro na área nuclear. Mas isso não significou problema. A Assurê foi aceita por José Marcos Castilho, ex-prefeito de Angra dos Reis pelo PT, escolhido para a diretoria financeira da Eletronuclear por Marcelo Sereno, então assessor da Casa Civil.

Dirceu também entregara o comando do Instituto de Resseguros do Brasil a Jefferson e a Janene. O presidente do PTB indicou o então presidente, Lídio Duarte, e o líder do PP na Câmara conseguiu a nomeação do diretor comercial, Luiz Eduardo Lucena.

O corretor amigo de Jefferson queria ser escolhido pelo IRB para atuar no segmento de resseguros. Associou-se à Acordia, subsidiária do grupo norte-americano Wells Fargo e foi escolhido pelo IRB. No fim do primeiro ano de operação faturava mais de R$ 15 milhões e garantira os contratos de resseguro da Eletronuclear, de Furnas e da Infraero – estatais entregues por Dirceu ao PTB de Jefferson e ao PP de Janene.

Os documentos já reunidos pela CPI sugerem que o dinheiro do mensalão saía tanto de empresas públicas quanto privadas, fornecedoras de bens e serviços. A cobertura da coleta financeira era feita por uma das 14 empresas de Marcos Valério. O governo lhe dera contratos com estatais diferentes. No setor elétrico, um de seus clientes era a Eletronorte, que chegou a criar uma ?assessoria parlamentar de resultados políticos?, como informa o último balanço. Para empresas privadas, fornecedoras das estatais, a cobertura dada por Valério era com emissão de notas fiscais sobre serviços supostamente prestados.

Enriquecimento de Monteiro de Sá sob suspeita

Brasília – Na mira da CPI Mista dos Correios, as operações de compra de títulos públicos feitas pela Fundação Real Grandeza devem começar a ser investigadas a partir de requerimentos feitos pela oposição. Na investigação da administração dos R$ 4,8 bilhões do patrimônio do fundo de 6,6 mil servidores de Furnas a CPI Mista vai esbarrar em Jeronymo Monteiro de Sá, um assessor da área de investimentos que, nos últimos anos, construiu um robusto patrimônio de aproximadamente R$ 3 milhões. Os bens seriam incompatíveis com o seu salário.

Documentos obtidos em cartórios do Rio de Janeiro demostram que entre 2001 e 2004 Sá se tornou proprietário de dois apartamentos de luxo no Rio. Os salários pagos aos funcionários da Real Grandeza variam de R$ 2 mil a R$ 12 mil. Como assessor, Jeronymo ganharia algo em torno de R$ 6 mil. O fundo não paga comissões a seus operadores. Só o valor do condomínio no Barra Golden Green, onde fica um dos apartamentos do assessor, varia entre R$ 5.500 e R$ 7 mil.

Segundo certidão do 6.º Ofício de Distribuição, Sá é dono de um terreno de 111 mil metros quadrados em Nova Friburgo, comprado em 27 de dezembro de 1999; do apartamento 502 do bloco 3 na avenida Canal de Marapendi 2.951, adquirido em 18 de maio de 2001; e do apartamento C-502 na Estrada da Gávea 60, comprado em 24 de junho de 2004.

O apartamento da avenida Canal de Marapendi fica no edifício Blue Ash, um dos 14 prédios que formam o condomínio Barra Golden Green, na praia da Barra da Tijuca. A operação de compra do imóvel foi declarada ao cartório por R$ 650 mil, mas o preço de mercado do apartamento é superior ao dobro deste valor. O Golden Green tem heliporto, campo de golfe e jardim projetado por Burle Marx. Como informa a propaganda, ?todos os apartamentos são de quatro suítes, sendo uma master com closet?.

O segundo imóvel, na Estrada da Gávea, adquirido no ano passado, fica no prédio que já foi considerado o mais valorizado da Gávea. Hoje, os corretores da região avaliam que um apartamento no prédio vale cerca de R$ 1,8 milhão.

Sá, até fevereiro deste ano, trabalhava na mesa de operações do fundo de pensão. Era subordinado ao então gerente de Operações de Investimentos do Real Grandeza, Marcelo Soares Mendonça. Ambos foram transferidos e tornaram-se assessores do diretor de Investimentos, Jorge Luiz de Freitas. Os dois teriam sido removidos por terem concentrado investimentos do fundo em bancos como o Santos, liquidado pelo Banco Central (a quebra teria causado um prejuízo de R$ 153,6 milhões à fundação), e nos bancos BMG e Rural. Os dois últimos bancos emprestaram dinheiro ao PT por influência do publicitário Marcos Valério, acusado de ser o operador do suposto mensalão.

O deputado tucano Eduardo Paes (RJ) pretende fazer um requerimento para investigar o assunto. A descoberta de que, até o ano passado,12% dos investimentos da fundação estavam aplicados em papéis dos três bancos causou também o afastamento do gerente de Análise de Investimentos do Real Grandeza, Benito Siciliano, ligado ao PTB. Só em 2004, a fundação aplicou R$ 363,4 milhões em títulos (CDBs e RDBs) e FIDCs no BMG e no Rural.

Procurado na sexta-feira na fundação, o assessor não foi mais encontrado para comentar o assunto.

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