Acendeu a luz vermelha entre parlamentares simpáticos ao Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). Estão cada vez mais preocupados com o rumo que as coisas tomaram na CPI da Terra e com a possibilidade de ser aprovado um relatório desfavorável ao movimento. Na ponta do lápis, a CPI teria 8 parlamentares ao lado do MST e 16 na banda de lá.
Segundo o deputado Adão Pretto (PT-RS), um dos principais porta-vozes dos sem terra no Congresso, o clima de antagonismo na CPI chegou a níveis intransponíveis. Tanto que, em vez de um, estariam sendo redigidos dois relatórios finais. Um será assinado pelo relator, deputado João Alfredo (PT-CE), simpático à causa da reforma agrária. O outro sairá das mãos do presidente da comissão, senador Álvaro Dias (PSDB-PR).
Às turras com o relator desde o início, Dias dedicou-se sobretudo a investigar as contas das instituições que representam legalmente o MST, como a Associação Nacional de Cooperação Agrícola (Anca) e a Confederação das Cooperativas de Reforma Agrária (Concrab). Fez verdadeira devassa, apesar dos protestos dos sem terra.
Ele tem dito que encontrou irregularidades nos convênios assinados entre estas entidades e instituições do governo. E, no relatório que prepara, deve pedir o rompimento de alguns convênios e exigir o ressarcimento de recursos que teriam sido aplicados indevidamente. Só do Iterra, o instituto gaúcho que representa a face legal do MST na área da educação e assina convênios com várias entidades do governo, seria pedida a devolução de R$ 3 milhões. A Anca e a Concrab seriam intimadas a devolver bem mais.
Preocupado, na semana passada, Pretto pediu ao Planalto que se esforce para mobilizar a base aliada e impedir a aprovação de um relatório desfavorável. O governo pende para o MST. O secretário-geral da Presidência, Luiz Dulci, encarregado pelo presidente Lula de dialogar com movimentos, associações, organizações religiosas e sindicatos, conversa regularmente com representantes dos sem terra.
Para ele, os convênios com o MST são bem-sucedidos e os repasses, administrado de forma rigorosa e escrupulosa: ?Se tem gente que usa bem o dinheiro dos convênios, é a dos movimentos sociais.? Ele diz que os convênios são vistoriados constantemente para impedir irregularidades. ?Os movimentos nunca escondem nada, isso não interessa a eles.?
O ministro, um dos mais próximos de Lula, suspeita que a investida contra os convênios é, na verdade, um ataque à proposta de reforma agrária: ?Golpeia-se os movimentos com argumentos falsos, para atingir a reforma agrária, que tem adversários muito poderosos.?
O governo estimula vários ministérios a aproximarem-se dos sem terra. Em palestra sexta-feira à noite para os metalúrgicos de São Bernardo do Campo, o ministro da Integração Nacional, Ciro Gomes, contou que fez reuniões com representantes do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra para discutir a transposição do Rio São Francisco e está celebrando convênios com assentamentos rurais para produção de mudas de árvores que serão usadas na recuperação das matas ciliares do rio.
Ambigüidades
É essa proximidade com o governo federal que tem provocado ambigüidades no comportamento do próprio movimento sem terra. Embora discorde visceralmente da política econômica do governo Lula e reclame dos números pífios da reforma agrária, com poucos assentamentos em 3 anos de governo, na prática o movimento se beneficia da retomada de convênios com entidades públicas e do bom tratamento que recebe em quase todos os gabinetes oficiais.
Assim, também o movimento vive uma crise de identidade que poderia ser definida da seguinte forma: é ruim com o governo Lula, mas seria muito pior sem ele. Nessa fase tranqüila de namoro, entre governo, petistas e sem terra, o relatório da CPMI da Terra, da banda de lá, é visto como trovoada, prenunciando uma tempestade.