Se Lula quer acabar com a fome no Brasil, terá de promover o aumento do salário mínimo e acelerar a reforma agrária no País. Essas são as principais recomendações do documento preparado pelo relator especial da ONU para o Direito à Alimentação, Jean Ziegler, e que será divulgado oficialmente em março de 2003 para a comunidade internacional.
Ziegler, que esteve no Brasil entre os dias 1.º e 18 de março, ainda vai incorporar as respostas e argumentos do governo ao estudo. Mas a versão preliminar, de 42 páginas, obtida com exclusividade pelo Estado, já mostra resultados preocupantes: um a cada três brasileiros sofre de desnutrição, um dos índices mais altos do planeta, situação causada exclusivamente pela desigualdade social.
O governo diz que 22 milhões de brasileiros passam fome. Já estimativas do PT apontam 44 milhões. O relator da ONU considera o índice excessivo, em especial para um país com recursos abundantes. Segundo ele, os níveis atuais não são muito diferentes do início da década de 80, quando 23 milhões passavam fome no Brasil. Ziegler ainda estipula que, todos os dias, 280 crianças morrem por doenças causadas pela má-nutrição antes de completar um ano no Brasil.
Segundo o documento, o País, um dos maiores exportadores agrícolas do planeta, produz alimentos em quantidade mais do que suficiente para alimentar seus habitantes. “A questão da fome no Brasil não é sobre existência de alimento ou não, mas sobre acesso aos produtos.” Segundo o documento, o fim da fome poderia contribuir para a redução da violência.
O relator destaca que o País teria alimentos para dar 2.900 calorias por dia a cada um dos 170 milhões de cidadãos. Mais de 16 milhões de pessoas, porém, vivem com menos de 250 calorias por dia. O índice mínimo recomendável pela ONU é de 1.900 calorias.
Salário
Apesar da abundância de alimentos, as dificuldades para fazer a população se alimentar são muitas. O primeiro obstáculo, para Ziegler, é o salário mínimo. O documento destaca que o salário não é suficiente para uma pessoa comprar alimentos por um mês.
Outro obstáculo é a falta de acesso à terra, um impedimento ao desenvolvimento da agricultura familiar. Ziegler mostra preocupação também com o modelo econômico adotado pelo Brasil nos anos 90. “O modelo neoliberal conseguiu trazer crescimento, mas não erradicou a pobreza e a fome.”