Uma comissão especial do Senado aprovou nesta terça-feira, 17, uma proposta de reforma do Código Penal sem mexer em temas polêmicas. O texto prevê punições mais rigorosas para crimes contra a vida, como o aumento de pena e maior tempo para um condenado ter direito a progressão de regime por homicídio. O texto inclui novos crimes ao código, como em relação a caixa dois, enriquecimento ilícito de servidores públicos, terrorismo e maus tratos a animais.
Para evitar que o projeto não avançasse na Casa e temendo resistência de grupos religiosos, senadores decidiram não mexer radicalmente em legislações referentes ao aborto e à homofobia. O projeto seguirá para apreciação no plenário do Senado, caso não haja recurso para que a proposta também tramite pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Casa. A previsão é que a votação do projeto no Senado só ocorra em 2014. Se passar, a reforma do Código, que está em vigor há 73 anos, vai para análise da Câmara dos Deputados.
No caso de homicídios, a pena mínima subiu de seis para oito anos de prisão – a máxima permaneceu em 20 anos. A progressão de regime, para quem for condenado por esse tipo de crime, também ficou mais demorada: no caso de um réu primário, a pessoa terá de passar um quarto do período para poder progredir de regime e não mais um sexto, como atualmente vigora.
“Você não pode entender que um crime contra a pessoa é um crime simples. Temos uma preocupação com o sistema carcerário brasileiro, mas não podemos deixar de fazer leis duras por que o sistema carcerário é ruim”, afirmou o presidente da comissão especial, Eunício Oliveira (PMDB-CE).
Caixa dois
A comissão incluiu a tipificação do crime de doação eleitoral ilegal, prevista apenas em legislações específicas. A pena é de dois a cinco anos de prisão para quem fizer caixa dois. O colegiado também aprovou a criação do crime de enriquecimento ilícito de servidores públicos, também com pena de dois a cinco anos de prisão mais a possibilidade de perda dos bens obtidos de maneira ilícita.
O relator da reforma do Código Penal na comissão, senador Pedro Taques (PDT-MT), desistiu de incluir sugestões de mudanças à legislação sobre o aborto feitas no ano passado por uma comissão de juristas nomeada pelo Senado. Por pressão da bancada religiosa, ele retirou a possibilidade de se interromper a gravidez até doze meses de gestão caso um médico ou psicólogo avalie que a mãe não tem condições de levar a maternidade adiante.
Taques manteve a previsão do aborto constante do Código Penal de 1940, isto é, que só pode ocorrer caso a gravidez ofereça risco à vida da mãe ou resultar de estupro. Ele incorporou ao projeto à decisão do Supremo Tribunal Federal que, em abril do ano passado, liberou o aborto de fetos anencéfalos. A interrupção da gravidez, que também vale para bebês que possuam anomalia que inviabilize a sobrevivência após o parto, deve ser atestada por dois médicos.
Homofobia
A proposta também prevê a criminalização da homofobia para quem for condenado por praticar discriminação ou preconceito de “identidade ou orientação sexual”. A pena varia de um ano a cinco anos de prisão. O projeto, contudo, colocou uma reserva para não enquadrar como crime a conduta: quem manifestar seu pensamento “de natureza crítica, especialmente a decorrente da liberdade de consciência e de crenças religiosas”. Isso só não vale se ficar demonstrado inequivocamente a intenção de discriminar ou de agir preconceituosamente.
“O grande debate que deve ser feito, além desses pontos que causam polêmicas, são os avanços para a sociedade brasileira”, afirmou o relator. Segundo ele, dos 540 artigos do novo Código Penal, não passam de dez aqueles que suscitam maiores debates. “Não é o (projeto) ideal. Existem algumas modificações que ainda precisam e podem ser elaboradas no decorrer dos trabalhos e eu, como relator, não tenho verdade absoluta”, destacou Taques.
A comissão incluiu também a previsão de se incluir o crime de corrupção como crime hediondo. Essa inclusão significa que os condenados por esse delito vão demorar mais tempo para ter direito a progredir para um regime de cumprimento de pena menos rigoroso. Logo após o início das manifestações de rua de junho, o plenário do Senado aprovou uma proposta com esse teor, que, desde então, está na Câmara.
O colegiado também retirou do texto a sugestão de se descriminalizar o porte de drogas para uso próprio. Dessa forma, valem as atuais regras, que consideram a prática crime, embora não sujeita à prisão. Caberá ao juiz da causa definir se é um usuário ou um traficante, como ocorre atualmente.