Com R$ 20 bilhões investidos em pagamentos por serviços ambientais seria possível reduzir o desmatamento legal no Brasil pela metade até 2030 e ainda evitar a emissão de 3,8 bilhões de toneladas de gás carbônico (CO2) na atmosfera.

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Esse é o cálculo feito por uma equipe de pesquisadores da Universidade Federal de Minas Gerais em estudo que tinha por objetivo avaliar as possibilidades do País de recuperar o que já foi desmatado e reduzir, em propriedades particulares, a supressão de vegetação que é autorizada por lei.

Os dados estão sendo apresentados para o governo federal como uma sugestão de ações que poderiam ser tomadas para ajudar o Brasil a cumprir a meta apresentada pela presidente Dilma no final de setembro, como contribuição para a Conferência do Clima de Paris, de reduzir as emissões totais do País em 43% até 2030, com base nos níveis de 2005.

A equipe fez esse cálculo considerando um mecanismo chamado cota de reserva ambiental, previsto no Código Florestal. Pela lei modificada em 2012, proprietários que têm excedente de área protegida em suas terras (em formato de Reserva Legal) podem negociá-lo com quem está devendo.

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No caso da Amazônia, por exemplo, médios e grandes fazendeiros têm de manter 80% de sua propriedade protegida. Se alguém mantém intocada uma área maior do que essa porcentagem pode negociar com quem desmatou além do permitido e tem de, por lei, se regularizar.

A expectativa é que esse mercado poderia ajudar a evitar novos desmatamentos legais, já que, em vez de cortar a área que lhe é permitida, o proprietário com reserva excedente poderia ser pago por um outro dono de terra para mantê-la em pé.

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Para os pesquisadores liderados pelo cientista Britaldo Soares Filho, coordenador do Centro de Sensoriamento Remoto da UFMG, esse mercado, porém, pode ter algumas limitações e um mecanismo ainda mais eficiente seria negociar parte dessas terras pelo valor que elas têm por conta dos serviços ambientais que prestam – adotando o chamado pagamento por serviços ambientais.

Florestas, como já é muito bem documentado pela ciência, servem como protetoras de água, da biodiversidade, evitam erosão. E absorvem carbono da atmosfera – além de que, mantidas em pé, evitam a emissão do gás. Lembrando que foi justamente o desmatamento da Amazônia que mais contribui para as emissões de gases de efeito estufa do Brasil.

De acordo com cálculos da equipe de Soares, 189 milhões de hectares (Mha) de florestas brasileiras (em todos os biomas) estão distribuídos em propriedades privadas. Pelas regras do Código Florestal, 92 Mha poderiam ser desmatados legalmente, liberando para atmosfera 21 gigatoneladas (Gt) de CO2-equivalente contidas na biomassa. Só para se ter uma ideia, hoje o Brasil emite como um todo, por ano, cerca de 1,60 Gt.

Quebra-cabeça

Soares explica que descontadas desses 92 Mha áreas que têm potencial agrícola alto – e muito provavelmente vão ser usadas para esse fim (sendo, assim, desmatadas) – e somadas outras porções de floresta presentes em pequenas propriedades (nesse caso não precisa ser excedente, eles podem negociar a própria Reserva Legal como as tais cotas), há uma oferta potencial de 119 Mha em todo o País.

Soares lembra que algumas iniciativas isoladas já foram adotadas no Brasil de pagamento por serviços ambientais, mas sem continuidade. Em Minas, por exemplo, produtores que têm terra perto de nascentes receberam uma verba para proteger a mata no entorno dos corpos da água, mas o programa só durou dois anos.

“Nós defendemos que esse mercado das cotas de reserva ambiental sejam usadas também para programas de pagamento por serviços ambientais. Uma concessionária de água ou um programa de conservação de recursos hídricos poderiam, por exemplo, mapear quem tem essas cotas em cabeceiras de rio e comprar esse título”, explica Soares.

Para ele, a sustentabilidade do projeto se daria por projetos de longo prazo. “O ideal seria que o interessado compre o título à vista por 30 anos e coloque o dinheiro em um fundo fiduciário, que libere o valor em formato de anuidades para o proprietário”, diz.

Pelo levantamento que o grupo fez de valor da terra em diferentes biomas e contextos econômicos pelo País, o pagamento por serviços propriedades seria vantajoso para áreas de baixo potencial de utilização para a agricultura.

Soares sugere também que o mecanismo seja usado com verbas de compensação ambiental. “A hidrelétrica de Belo Monte, por exemplo, poderia aplicar parte do seu recurso compensatório que é de até R$ 5 bilhões para a compra de cotas nas cabeceiras do rio Xingu, o que garantiria a água para a própria geração de energia”, sugere o pesquisador.

Limitações

O estudo da UFMG aponta que se o mercado de cotas de reserva ambiental não for muito limitado, pode sofrer com uma sobre-oferta de títulos, o que inviabilizaria sua efetividade.

O Código Florestal prevê que a cota de reserva legal de uma propriedade pode ser vendida para a compensação do déficit de Reserva Legal de outra, desde que tenha equivalência em área e esteja situada no mesmo bioma e, de preferência, no mesmo Estado.

O problema é que isso abre uma possibilidade para que o comércio seja feito com outros Estados, e é aí que mora o perigo, de acordo com Britaldo Soares Filho.

Pelos cálculos do pesquisador há um passivo ambiental em todo o Brasil de 24 milhões de hectares (19 milhões de Reserva Legal e 5 milhões de área de preservação permanente em propriedades privadas que foram desmatados ilegalmente). Alguns estudos usados pelo governo federal falam em metade disso.

Seja como for, a distribuição de oferta e demanda é desequilibrada. Segundo o levantamento da equipe de Soares, as maiores demandas estão em São Paulo e no Mato Grosso, já a oferta, muito maior, se encontra em outros Estados, especialmente no Amazonas.

“A cota foi desenvolvida para baratear a compensação da reserva legal. Em vez de alguém que tem passivo restaurar a vegetação, o que é caro, compra cota de outro. Mas se todo mundo que tem oferta inundar o mercado com títulos, o valor da cota vai ficar barato demais, e aí não vai compensar. Por isso, para funcionar, tem de ser muito restrito, dentro do mesmo Estado”, diz.