O secretário-geral da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), dom Odilo Pedro Scherer, abriu ontem na ilha do Combu, em Belém, a Campanha da Fraternidade deste ano, que tem a Amazônia e seu povo como tema, criticando a destruição da região pelo desmatamento ilegal, grilagem e conflitos de terra. ?É uma insensatez, é falta grave de responsabilidade e de fraternidade?, disse Scherer, para quem somente a fraternidade ?promove a partilha e a sustentabilidade da vida na floresta?.
Ele explicou que a campanha não se volta somente para a questão ambiental, mas principalmente para os seres humanos que habitam a região, como indígenas, caboclos, quilombolas, nativos ou migrantes, populações ribeirinhas e gente das pequenas e grandes cidades da Amazônia.
Essas pessoas são a referência da fraternidade a ser despertada e aprofundada na região. ?O povo da Amazônia é vítima, com freqüência, de esquecimento, discriminação e graves conflitos?, observou Scherer. Na ocupação da terra e na exploração dos recursos naturais, muitas vezes, segundo o padre, impera a lei da selva, a lei do mais forte, por causa da ?ausência, ou da ineficiência? do Estado e de suas instituições.
Uma mensagem escrita pelo papa Bento XVI foi lida. No documento, o papa convida todos os brasileiros a uma ?mudança de vida? no sentido de assumir o ?compromisso? de um maior cuidado com ?os povos e toda a natureza, em especial a da Amazônia?. O coordenador-executivo da campanha, padre José Carlos Tofolli, da CNBB, disse que a mensagem é um convite para ?refletirmos sobre o bioma que é a floresta amazônica, bioma que é o grande berço de vida e que a gente tem que aprender a cuidar melhor para que, inclusive, os povos que nela habitam possam ter uma vida mais digna?.
O secretário da CNBB na região Norte, dom Flávio Giovenale, acredita que a campanha poderá despertar a atenção do País para a preservação da Amazônia. Segundo dados do Instituto de Pesquisa do Homem e do Meio Ambiente da Amazônia (Imazon), 17% da região já está desmatada. A ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, disse que o governo federal está fazendo sua parte, combatendo os crimes ambientais. ?Já foram criadas 48 unidades de proteção ambiental e hoje temos mais de 20 milhões de hectares protegidos por lei?, resumiu Marina.
A governadora do Pará, Ana Júlia Carepa, lembrou o assassinato da missionária Dorothy Stang, dois anos atrás, afirmando que não permitirá que a polícia seja cúmplice de grileiros e violadores de direitos humanos. ?A polícia não mais baterá em lavradores, agora ela irá protegê-los?, garantiu Ana Júlia.
Enquanto o lançamento da campanha acontecia, nove organizações de base da Igreja Católica divulgavam um manifesto, protestando contra a participação da Companhia Vale do Rio Doce como patrocinadora do evento. Em nota, a Comissão Pastoral da Terra (CPT), as pastorais da mulher, do menor, juventude rural, migrantes e o grito dos excluídos criticavam a organização da campanha pela ?ausência do povo?, e ?convites restritos?, mas se detinha em ataques à Vale, dizendo que a empresa é uma das principais responsáveis pela destruição ambiental e por conflitos com as populações tradicionais da Amazônia.
Outra acusação é de que a Vale tem problemas com índios e comunidades quilombolas, além de movimentar seus fornos para produção de ferro-gusa com carvão vegetal de 300 mil hectares de florestas derrubadas.
A assessoria da Vale informou que a empresa tem por norma não divulgar os valores de eventos que patrocina. Para a empresa, o tema escolhido este ano pela CNBB se identifica com a postura que ela vem adotando de preservação do meio ambiente. Ninguém da CNBB quis comentar o protesto das entidades ligadas à igreja, nem o patrocínio da Vale.