Cela com capacidade para 36 presos abriga 281 no ES

“Um desafio às leis da física.” A expressão usada por um agente da Polícia Civil capixaba é a melhor definição para a situação em que se encontram 281 presos detidos no Departamento de Polícia Judiciária (DPJ) de Vila Velha, amontoados em uma única cela com capacidade para 36 detentos.

Os números são medidos em um “presômetro” afixado em uma das paredes da unidade. Redes são amarradas umas sobre as outras, mas ainda assim dezenas de presos têm de ficar agachados ou em pé, espremidos entre grades e paredes.

Vários estão doentes e dividem apenas dois banheiros. A grande maioria é preso provisório, jovens que foram pegos no crime. “Os banheiros estão entupidos. Tem preso com tuberculose, gonorréia. Todo mundo tem que revezar entre as redes e ficar agachado. Um dorme um dia, outro dorme no outro [dia]. Tem rato e barata na caixa d’água, infiltração”, descreveu, com o rosto entre as grades, Jefferson Rodrigo, 22 anos, que cumpre pena por assalto à mão armada.

Os presos são tratados de forma desumana, sem a menor condição de sobreviver

Carla Pedreira, representante da Comissão de Direitos Humanos da OAB

“Aqui só gera mais ódio e raiva. Nossa família vem aqui e nos vê nessa humilhação. Quem está aqui porque roubou vai sair querendo matar para descontar tudo”, desabafou.

Alguns centímetros acima de Rodrigo, com pelo menos mais dois presos entre eles, Francis Pinheiro, 27 anos, detido por furto, relatou uma sensação de sufocamento: “A gente respira o ar que sai da boca do parceiro.” Segundo outro companheiro de cela Caio César, 19 anos, preso por roubo à mão armada, lá dentro “tem epidemia de furúnculo, coceira, muita dor de barriga.”

Os poucos policiais civis que se veem obrigados a guardar os presos convivem o tempo inteiro com o risco de fuga em massa, revoltam-se por não estarem exercendo a função típica de investigar e cobram da Justiça uma solução para pôr fim à superlotação.

“Só quem pode soltá-los é a Justiça. O preso provisório da Polícia Civil fica sob nossa guarda no máximo 90 dias. Não existe Defensoria Pública no Espírito Santo. São sete defensores para uma população carcerária estimada em 7 mil presos”, criticou o presidente da Associação dos Investigadores da Polícia Civil do Espírito Santo, Júnior Fialho.

A advogada Carla Pedreira, representante da Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil – Seção Espírito Santo (OAB-ES), a instituição vem alertando há anos para a situação degradante do Departamento de Polícia Judiciária de Vila Velha. “Isso aqui sempre foi um grande problema. Os presos são tratados de forma desumana, sem a menor condição de sobreviver. A sociedade tem que tomar conhecimento. Eles não têm banho de sol, não tem têm direito a visita íntima e não entram homens em dias de visita por questões de segurança, já que são poucos policiais.”

O DPJ de Vila Velha será inspecionado ainda hoje pelo juiz auxiliar da presidência do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), Erivaldo Ribeiro, procedimento que antecede o lançamento de um mutirão carcerário no estado para tentar minimizar a superlotação de unidades.