Depois de um dia tumultuado, com protestos dentro e fora do Congresso Nacional, a Câmara dos Deputados rejeitou, na madrugada de hoje, texto substitutivo da PEC 171, que reduziria a maioridade penal de 18 para 16 anos para alguns crimes, sobretudo hediondos. Foram 303 votos a favor. Como se tratava de uma Proposta de Emenda à Constituição, eram necessários 308. Um total de 184 deputados foram contrários e 3 se abstiveram.
Principal defensor da redução, o presidente da Casa, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), ficou em silêncio ao ver o resultado. “A gente sabia que ia ser uma luta. Eu fico feliz de a gente ter conseguido levar a votação. Apesar de todos os contratempos, foi uma sessão histórica”, disse após a votação. Dezessete peemedebistas votaram contra a orientação do partido.
O texto discutido na Câmara reduziria de 18 para 16 anos a maioridade penal para crimes hediondos, homicídio doloso, tráfico de drogas, lesão corporal grave ou seguida de morte e roubo com causa de aumento de pena, como o uso de arma. O governo manobrou contra a proposta durante todo o dia. O governo Dilma Rousseff defende que se mexa no prazo máximo de internação de menores que cometem crimes hediondos, passando do limite de 3 para 8 anos. Proposta nesse sentido, do senador José Serra (PSDB-SP), começou a ser discutida ontem no Senado, mas teve o debate adiado.
O texto rejeitado na Câmara era um substitutivo apresentado na comissão especial que discutiu o tema. Com a rejeição, os deputados votarão o texto original, que determina a redução da maioridade penal para todos os tipos de crime. A sessão, que durou cerca de cinco horas, foi marcada por discussões acaloradas. “Não somos vingadores. Somos legisladores. Temos de garantir o futuro da nossa juventude. O mesmo Estado que não acolhe, que não dá educação, cultura, lazer, não pode ser o Estado da punição”, disse Ivan Valente (PSOL-SP).
Integrante da chamada “bancada da bala”, o deputado Alberto Fraga (DEM-DF), coronel da reserva da Polícia Militar, criticou texto escrito pelo grupo parlamentar contrário à redução da maioridade penal. “Quem escreveu isso aqui ou fumou maconha estragada ou não sabe o que diz”, afirmou da tribuna.
Ao concluir seu discurso, Fraga foi alvo de manifestação de estudantes que acompanhavam a sessão nas galerias do plenário. Outros deputados da “bancada da bala”, todos vestindo camisetas pretas onde se lia “redução da maioridade penal já”, reagiram. O Capitão Augusto (PR-SP) olhou para os manifestantes e friccionou os dedos, insinuando que havia recebimento de dinheiro. Concluída a votação, manifestantes comemoraram a rejeição cantando “O Cunha é ditador”, “Nas ruas, nas praças, quem disse que sumiu, aqui está presente o movimento estudantil”.
Confusão
Estudantes contrários à redução da maioridade e a polícia já haviam entrado em confronto antes de a discussão sobre o tema começar no plenário da Câmara, às 20h15. Houve tumulto em uma das entradas do prédio e no interior do Congresso. O acesso às galerias do plenário ficou restrito a 200 senhas, distribuídas pelo presidente da Câmara, o que provocou revolta. Manifestantes entraram no espelho d’água diante do Congresso e subiram até o Salão Verde.
Segundo a Polícia Legislativa, manifestantes tentaram forçar a entrada com paus e pedras e os agentes reagiram com spray de pimenta. Os estudantes negaram ter usado violência. O deputado Jean Wyllys (PSOL-RJ) conversava com os estudantes, quando teve início a confusão e foi atingido por spray de pimenta. Ele reclamou da postura do que chamou de “homens do Cunha”.
“Isso é uma loucura. Isso é culpa de Eduardo Cunha, porque ele não deveria radicalizar desta maneira. Se ele permitisse que a galeria fosse ocupada por 50% das pessoas a favor (da maioridade) e 50% contra, isso não estaria acontecendo.”
Cunha alegou estar “garantindo a ordem” ao impedir a entrada nas galerias do plenário da Casa de manifestantes que obtiveram habeas corpus do Supremo Tribunal Federal (STF) para acompanhar a votação. “Habeas corpus é para transitar aqui, não é para entrar na galeria. Galeria tem de ter senha.”
Questionado se não estaria desrespeitando a Justiça, Cunha negou. “A ordem está muito clara. A que recebi tem de ser com garantia da ordem. Estou garantindo a ordem.” (Colaboraram Ricardo Della Coletta e Isadora Peron) As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.