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Brasília – O relatório "Situação mundial da infância", divulgado ontem pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), mostra que 27,4 milhões de crianças brasileiras vivem abaixo da linha da pobreza e suas famílias ganham menos de R$ 4,33 por dia, ou seja, menos de meio salário mínimo por mês. O Rio de Janeiro aparece logo na apresentação do documento: "Imagens da infância: meninos e meninas revirando pilhas de lixo em busca de alimento, em Manila; obrigados a carregar uma AK-47 pelas florestas da República do Congo; forçados a se prostituir nas ruas de Moscou; mendigando comida no Rio de Janeiro".

Assim o Unicef abre seu relatório, que volta a apontar como maiores dramas para a infância a aids, os conflitos armados e a pobreza. Não há outra explicação para a citação do Rio.

Foi uma imagem escolhida pela entidade para abrir o texto, mas há citações elogiosas ao programa bolsa escola e ao programa de aids. O documento diz ainda que muitos países não vão cumprir as metas de melhoria de indicadores acertadas para 2015.

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Na tabela de indicadores sociais, a situação do Brasil piorou. Na taxa de progresso, que usa como referência a redução da mortalidade de crianças menores de 5 anos, o País saiu da posição 93 e foi para a 90 (quanto menor o número, pior a situação). Mas a piora na classificação brasileira se deve ao fato de outros países terem feito mais avanços porque, se for considerada apenas a taxa de mortalidade, o País melhorou: no relatório anterior, a taxa de mortalidade era de 36 mortes para mil nascidos vivos. Neste, a taxa é de 35. Ou seja, o País melhorou, mas menos do que os outros para ficar numa posição melhor no ranking do Unicef.

O Unicef usa como referência indicadores de privações impostas às crianças: de abrigo (mais de 5 pessoas por cômodo ou chão de terra na casa); saneamento (nenhum tipo de sanitário); e educação (nunca estiveram na escola). Na América Latina, 21% das crianças até 18 anos passam privações graves de abrigo, 16% de saneamento e 3% de saúde. Na África, chega a 64% em relação ao abrigo e 35% em saneamento.

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Pobreza brasileira

"A pobreza brasileira tem cara de criança do semi-árido", afirmou Marie Pierre Poirier, representante do Unicef no Brasil, na divulgação do relatório "Situação mundial da infância 2005 – Infância ameaçada". Para Marie Pierre, um dos dados mais preocupantes do relatório é a situação de vulnerabilidade infantil na região do semi-árido brasileiro. De acordo com o estudo, 75% das crianças vivem em famílias pobres e, em alguns municípios da região, esse percentual chega a 90%.

Em 95% das cidades do semi-árido, a taxa de mortalidade infantil supera a média nacional, que é de 33 mortes para cada mil crianças nascidas vivas, antes de completarem um ano de idade. Além disso, 46% dos meninos e meninas que vivem na região são analfabetos e 42% não têm acesso a água potável.O documento traz dados sobre a situação de meninos e meninas brasileiros relacionados à pobreza e suas diferentes dimensões, violência e epidemia de HIV/aids. O relatório revela ainda que uma em cada duas crianças vive em situação de pobreza em todo o mundo.

O relatório será entregue ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva na próxima segunda-feira.

Pobreza, guerra e aids: as causas

Brasília – Mais da metade dos 2,2 bilhões de crianças do mundo vive em grande privação por causa da pobreza, da guerra e da aids – três problemas que põem em perigo suas vidas e o futuro do planeta -, alerta o Fundo Mundial das Nações Unidas para a Infância (Unicef).

A pobreza não é exclusiva dos países em desenvolvimento e a proporção de crianças que vivem em lares de baixa renda nos últimos dez anos cresceu em 11 de 15 países industrializados.

As estatísticas do Informe Mundial da Infância mostram que 640 milhões de meninos e meninas carecem de moradia adequada; 500 milhões não têm acesso a saneamento básico; 400 milhões não dispõem de água potável e 270 milhões não têm serviços de saúde. O Unicef lembra que 140 milhões de crianças nunca foram à escola e que 90 milhões sofrem grave privação alimentar.

Também sublinha que 10,6 milhões morreram em 2003 em todo o mundo antes de completar 5 anos e que a maioria dessas mortes poderia ter sido evitada. Segundo o relatório, 2,2 milhões de crianças morreram porque não foram vacinadas – ou pelo menos não adequadamente.

No Brasil, o órgão apontou que 27,4 milhões de crianças vivem em famílias com meio salário mínimo ou menos por pessoa. "No caso da mortalidade infantil, (…) o país tem um nível mais alto de mortalidade que países vizinhos da América do Sul", disse. O Brasil ocupa o 10.º lugar na lista que inclui os 12 países sul-americanos, na frente apenas de Guiana e Bolívia.

Segundo o relatório, em 2003, no Brasil, 33 crianças em cada mil nascidas morreram antes de um ano de vida – o índice mais recente divulgado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) é de 27,5 mortes por mil nascidos vivos.

Aids

O relatório do Unicef faz também um alerta sobre o "crescimento assustador" da epidemia de HIV/aids no Brasil entre meninas e adolescentes do sexo feminino entre 13 a 19 anos. Em 2003 a taxa de incidência por cem mil habitantes foi de 1,6 para os meninos e de 2,1 para as meninas nessa faixa etária.

"Estamos a ver uma epidemia tipo generalizada, com representação cada dia maior da mulher. Em termos de vulnerabilidade, podemos dizer que, no Brasil, aids tem cara de mulher e de mulher adolescente", afirmou Marie Pierre Poirier.

Ela destacou que, enquanto em 1995 a proporção era de 24 homens infectados pelo HIV para cada mulher portadora do vírus, essa relação hoje é de dois homens para cada mulher. Segundo Marie Pierre, dos 17,4 mil casos notificados entre crianças e adolescentes, mais de oito mil são de crianças com menos de cinco anos.