Rio
– O Brasil deve dar no domingo, salvo uma grande surpresa, uma histórica virada à esquerda e entregar a presidência do País ao ex-metalúrgico Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que não promete milagres e sim “o necessário” para remediar as injustiças sociais. “Quero provar que um metalúrgico é capaz de governar este País melhor que a elite brasileira que governou nesses últimos 100 anos”, disse Lula, que segundo todas as pesquisas possui 60% das intenções de voto, praticamente o dobro de seu adversário, o candidato do atual governo, José Serra (PSDB).“Não peçam milagres”, declarou Lula esta semana. “Vou começar fazendo o necessário. Depois vamos fazer o possível”, disse Lula. No primeiro turno, 76% dos eleitores votaram em candidatos de oposição ao governo. Caso confirme sua vitória, Lula tomará posse em janeiro e pega uma dívida de US$ 200 bilhões, equivalente a 60% da produção, e uma moeda que sofreu desvalorização de 40% este ano. Além disso, terá que atender as demandas de 12 milhões de desempregados e de 54 milhões de pobres.
Lula deixou de lado o sonho revolucionário, mas pode ser o primeiro presidente brasileiro a chegar ao poder com um partido de definição “operária”, como é o caso do PT, que ele ajudou a fundar em 1980 e que reúne de centro-esquerdistas a esquerdistas radicais. “A vitória de Lula é algo histórico e fantástico para a democracia”, afirmou o sociólogo Hélio Jaguaribe, que considera definido o resultado da eleição e o atribui ao “modelo econômico equivocado” aplicado nos oito anos de FHC.
“O Brasil foi levado a um modelo econômico estancado e tem que sair disso. Existem muitas demandas que têm razão de existir”, disse Jaguaribe. Tanto Lula quanto Serra basearam suas campanhas em promessas de mudanças sociais, mas o candidato do governo parece ter fracassado na tentativa de convencer o eleitorado de que seu governo não será igual ao de Fernando Henrique Cardoso.
“O Brasil precisa de mudanças, mas com os pés no chão”, afirmou Serra, que considera enganosas as promessas de Lula sobre criação de empregos e aumento de salários. Ao longo da campanha, a perspectiva de uma vitória de Lula manteve os mercados nervosos. A Bolsa de Valores de São Paulo está em seu menor nível desde 1993 e o real não pára de se desvalorizar em relação ao dólar.
O FMI concedeu ao Brasil um empréstimo de US$ 30 bilhões com base em severos compromissos de austeridade fiscal, que Lula se comprometeu a respeitar. Ao mesmo tempo, o candidato convocou todas as forças empresariais, sindicais e sociais para discutir acordos econômicos que possibilitem o crescimento da economia. “Essa é a única forma de gerar emprego”, disse Lula, cujo programa estabelece uma meta de criação de 10 milhões de empregos.
Os mercados passaram por um momento de calma esta semana, depois que a equipe de Lula se comprometeu a fortalecer a bolsa de São Paulo e começou a negociar com os bancos novas linhas de crédito, atualmente prejudicadas por uma taxa básica de juros de 21%. Lula recebeu 46% dos votos válidos no primeiro turno e o PT se tornou a maior bancada na Câmara dos Deputados. No entanto, Lula não teria maioria absoluta e precisaria articular acordos para aprovar suas propostas e atender as necessidades de seus eleitores. “Lula enfrentará problemas de governabilidade muito grandes. Certamente pedirá um ou dois anos para oferecer resultados”, disse Jaguaribe.