Dom Cláudio Hummes: unanimidade. |
São Paulo – O cardeal-arcebispo de São Paulo, dom Cláudio Hummes, disse por telefone, ontem, que o cardeal alemão Joseph Ratzinger foi eleito o novo papa ?praticamente por unanimidade? pelo conclave que reuniu 115 cardeais. No final da tarde (já noite na Itália), dom Cláudio telefonou para a Cúria Metropolitana de São Paulo e, rapidamente, conversou com o bispo-auxiliar da Arquidiocese de São Paulo, dom Manuel Parrado Carral.
Dom Cláudio Hummes comentou que a cerimônia que oficializará o início do pontificado de Bento XVI já está marcada para o próximo domingo.
?Dom Cláudio mostrou estar bastante contente e disse que a eleição foi praticamente por unanimidade. Ele já havia até participado de um jantar com o novo papa?, disse dom Manuel, que preferiu não comentar sobre o porquê de os cardeais não terem obtido consenso no primeiro dia de votação, na segunda-feira.
Melhor forma
Alaíde Hummes, irmã de dom Cláudio Hummes, arcebispo da Arquidiocese de São Paulo, afirmou que a família acompanhou na frente da tevê a escolha do novo papa e acredita que o cardeal Joseph Ratzinger não vai mudar nada nos rumos da igreja, seguindo os passos de João Paulo II.
?Acho que ele vai seguir os caminhos exatos. Ele passava 24 horas por dia com o papa João Paulo II e ouvi que ele ficou 33 vezes no lugar dele. O novo papa só não vai viajar tanto, está meio velhinho. A gente torcia por dom Cláudio, mas rezava para que fosse feita a vontade de Deus. Na nossa religião, acreditamos que Deus decide da melhor forma, então tudo bem, vamos lá e vamos continuar rezando?, disse Alaíde. A família de dom Cláudio Hummes mora na cidade de Salvador do Sul, no Rio Grande do Sul, e fez orações diárias durante o período de escolha do novo papa.
Na Cúria Metropolitana, o secretário-geral da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), dom Odilo Scherer, pediu para que fiéis ?não tivessem preconceito ou recebessem o novo papa com clichês?. Conhecido pelo perfil conservador, o cardeal alemão era considerado retrógrado por analistas religiosos em função de sua posição em temas polêmicos, como pesquisas científicas com célula-tronco.
?Não podemos ter preconceitos. Assim vamos todos nos surpreender. O novo papa não pode ser visto neste momento como o opositor da teologia da libertação, mas como alguém que vai lutar pela vida, pela fé e por valotes éticos fundamentais?, disse dom Odilo, que comentou a escolha de um dos mais idosos cardeais para assumir o posto deixado por João Paulo II. ?Ao escolher um papa de certa idade, isso já significa que, teoricamente, não se espera que seja um pontificado muito longo. Mas a escolha de um papa com uma boa idade em vez de um papa mais jovem claro que indica um pontificado mais breve. Mas, por outro lado, ninguém espere simplesmente um pontificado insignificante?, afirmou o secretário-geral da CNBB.
Lula deseja que papa promova paz e justiça social
Brasília – O presidente Luiz Inácio Lula da Silva enviou ontem mensagem ao novo papa, o cardeal alemão Joseph Ratzinger, Bento XVI, expressando sua confiança em que ele promoverá ?paz e justiça social? e ?reavivará os valores da igreja?. Eis a íntegra da nota, divulgada pela assessoria de imprensa do Palácio do Planalto:
?Mensagem do presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, à Sua Santidade o Papa Bento XVI:
Neste momento de renovada esperança para o mundo, tenho especial satisfação em cumprimentar Sua Santidade, em nome do Governo e do povo brasileiros, por sua eleição ao Trono de São Pedro.
Estou seguro de que Sua Santidade promoverá com empenho a paz e a justiça social, ao mesmo tempo em que reavivará os valores espirituais e morais da Igreja?.
Alencar
O vice-presidente e ministro da Defesa, José Alencar, elogiou a escolha do novo papa e afirmou que a indicação do cardeal alemão Joseph Ratzinger para substituir João Paulo II não causou surpresa, pois o nome era o mais comentado no mundo inteiro. José Alencar desejou ?sucesso? a Bento XVI. ?Espero que ele siga o exemplo de João Paulo II, de quem ele foi um auxiliar de primeira e basta prosseguir o trabalho maravilhoso do papa, um grande papa?, disse o vice-presidente, após a cerimônia de apresentação dos 52 oficiais promovidos das três forças, no Palácio do Planalto.
Evitando a polêmica sobre a escolha de um nome considerado conservador pelo Vaticano, o vice-presidente lembrou que, de certa forma, todos os cardeais são conservadores. ?Hoje estamos vivendo um tempo em que a igreja tem estado mais aberta. Por exemplo: João Paulo II deu um lição ecumênica, mais importante do que todos os outros. Ele aceitava a convivência com todas as religiões, mesmo as não cristãs. Eu acredito que esse (Joseph Ratzinger) irá fazer a mesma coisa?.
Quanto ao fato de o arcebispo de São Paulo, d. Cláudio Hummes, não ter sido escolhido para o posto, brincou: ?Torcemos muito para que fosse o d. Cláudio Hummes, porque ele também tem todos os méritos. Ele é jovem, só tem 70 anos, o atual papa, Bento XVI, tem 78 anos. Então eu acho que o d. Cláudio Hummes também tem a sua chance.?
Boff admite dificuldades para ?amar esse papa?
Rio – Perseguido pelo cardeal Joseph Ratzinger no período em que, como frade franciscano, era um importante porta-voz da Teologia da Libertação, o teólogo e escritor Leonardo Boff disse ontem que terá ?dificuldades em amar esse papa, por causa de suas posições perante a igreja e o mundo?. Boff desejou que o escolhido ?pense mais na humanidade, especialmente nos pobres, do que na igreja?. Disse ainda esperar que Ratzinger ?mantenha o diálogo com outras igrejas e com a ciência, para buscar os melhores caminhos para a humanidade?.
Na avaliação do teólogo, em relação a temas polêmicos da Igreja Católica como o celibato dos padres, o sacerdócio das mulheres, pesquisas com células-tronco e homossexualismo, Ratzinger manterá as posições conservadoras de João Paulo II e será ?ainda mais fechado?. Ressalvou, no entanto, que ?como cristão?, mantém a posição de ?aceitar e respeitar a decisão, fruto da escolha dos cardeais?.
Ratzinger foi o responsável pela punição de ?silêncio obsequioso? imposta a Boff em 1985, já no pontificado de João Paulo II. Na época, o papa diminuiu a duração do castigo que era por tempo indeterminado, para um ano. Em entrevista recente, Leonardo Boff, que se desligou da igreja em 1992, disse que Ratzinger ?é um dos cardeais da cúria mais odiados? e estimou que ?jamais fosse eleito papa, porque seria um excesso do mesmo, coisa que a inteligência dos cardeais não permitiria?. O teólogo lembrou que muitos cardeais foram humilhados pelo colega alemão em várias conferências, pois o novo papa sempre tratou questões da religião ?de forma autoritária?.
Parentes de Ratzinger no Sul comemoram eleição
Porto Alegre – A notícia de que o sucessor de João Paulo II é o alemão Joseph Ratzinger alegrou uma família que tem o mesmo sobrenome, origem alemã, está instalada no Rio Grande do Sul há pelo menos um século e é luterana. ?Todos os Ratzingers são parentes?, disse o motorista aposentado Ardino Ratzinger, de 61 anos, em Ivoti, cidade do Vale do Rio dos Sinos, a 46 quilômetros de Porto Alegre, enquanto atendia dezenas de telefonemas de jornalistas e recebia felicitações de parentes e amigos depois de torcer e vibrar com a eleição do novo papa.
Sem referências que comprovem sua afirmação, Ardino promete reunir fotos antigas do ramo brasileiro da família e enviá-las ao Vaticano à espera de uma resposta de Bento XVI que confirme o parentesco. A primeira tentativa já foi feita e não deu certo. Em 1988, incentivada por um padre que ia a Roma, uma cunhada de Ardino enviou uma carta ao então cardeal Ratzinger solicitando informações sobre possível parentesco com o marido, o representante comercial Irineu. Recebeu como resposta um rosário abençoado pelo papa João Paulo II e um cartão de Natal assinado por Ratzinger, mas nenhuma palavra sobre o suposto parentesco.
Assim como Ardino, Luiza, que mora com o marido em Balneário Camboriú (SC) passou a tarde recebendo visitantes interessados na história, enquanto Irineu, em viagem, não atendia o celular. Ardino, Irineu e mais quatro irmãs, três em Ivoti e uma em Palmitos (SC) são a terceira geração dos Ratzingers no Brasil, mas não guardam informações sobre o passado da família. Sabem que descendem do imigrante João, mas desconhecem a região de onde ele veio e a data correta de seu desembarque no Brasil.