Depois de mais de um mês de incertezas, o Ministério da Educação (MEC) finalmente anunciou nesta quinta-feira, 2, que a avaliação da alfabetização das crianças será feita por amostragem. A prova havia sido cancelada pela gestão do ex-ministro Ricardo Vélez Rodríguez, como o jornal O Estado de S. Paulo revelou. Nesta quinta, o titular da pasta, Abraham Weintraub, disse que o exame é “importante” e será analisada a aprendizagem de alunos do 2.º ano do fundamental, de 7 anos. A avaliação até então era feita com crianças do 3.º ano.
As mudanças farão com que os resultados não possam ser comparáveis aos dos exames feito pelo MEC nos anos de 2013, 2014 e 2016. Ou seja, não será possível saber se as crianças melhoraram ou pioraram seu desempenho ao longo dos anos.
A ideia de fazer a prova no 2.º ano já era do governo anterior, de Michel Temer, mas a intenção era que todas as crianças participassem da prova. Isso porque a Base Nacional Comum Curricular (BNCC), aprovada em 2017, estipula que os alunos devem estar alfabetizados justamente ao fim dos primeiros dois anos do fundamental. Apesar de haver grupos no MEC que criticam a BNCC, a portaria sobre a avaliação diz que ela seguirá o documento. E indica os objetivos de aprendizagem para cada ano escolar.
“Vamos começar do zero. E vai ser difícil avaliar os resultados; o desempenho é baixo porque não se adotou a BNCC ou porque as crianças não sabem mesmo?”, questiona o especialista da Universidade de São Paulo (USP) Ocimar Alavarse. Para ele, o fato de a BNCC ter sido aprovada há menos de dois anos faz com que ela ainda não esteja presente na maioria das escolas. “Vai acabar sendo uma prova para induzir, ameaçar, e não para avaliar os alunos.”
Já o diretor do Iede, Ernesto Faria, que faz pesquisas educacionais, acredita que atrelar a avaliação à BNCC é positivo. “A prova de alfabetização já teve quebra de série histórica, já mudou várias vezes, é importante começar a ver se os objetivos de aprendizagem da BNCC estão sendo cumpridos.” Em 2015, a prova foi cancelada durante o governo de Dilma Rousseff por falta de recursos. Em 2018 também não foi feita porque o governo Temer esperou a aprovação da BNCC.
Segundo especialistas, a vantagem da avaliação censitária é poder recuperar as defasagens com mais facilidade, já que é feito um diagnóstico para cada escola e cada município. Por amostra, só será possível saber o desenvolvimento da média. O governo ainda tem até o dia 30 de junho para divulgar como será calculada a amostra, com escolas públicas e privadas. Para o ministro da Educação, a série histórica já estava prejudicada por causa da adequação do exame à BNCC. Ele justificou o uso de amostra pela economia de recursos. “O objetivo é fazer universal e uma vez por ano. É importante para o País conhecer individualmente cada uma das crianças da rede”, disse. “Se eu pudesse, eu faria universal. Mas a gente está chegando. A gestão Bolsonaro tem apenas quatro meses.”
Demissão
O cancelamento da prova, em março, levou à demissão da então secretária de Educação Básica do MEC e do presidente do Instituto Nacional de Pesquisas Educacionais (Inep). O cargo ficou vago por cerca de um mês, até que o ex-delegado da Polícia Federal Elmer Vicenzi fosse nomeado.
O MEC vai manter as avaliações para alunos do 5.º ano e 9.º ano, e do 3.º do ensino médio. Serão provas para todos, de Português e Matemática. Uma amostra dos estudantes do 9.º ano fará ainda provas de Ciências da Natureza e Ciências Humanas pela primeira vez. Os exames fazem parte do Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb). É a partir desses resultados que se calcula o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb), que se tornou o grande indicador de qualidade do ensino no País.
Ditado
Pela primeira vez, a prova de alfabetização do MEC terá ditado. A justificativa de usar o antigo método de checar se as crianças sabem escrever corretamente é a de “aperfeiçoamento”. Mas, para a educadora Patricia Diaz, da ONG Comunidade Educativa, o ditado só testa conhecimento mecânico. “É uma pegadinha, o único conhecimento a que a criança pode se apegar é a letra e o som, não tem uma palavra conhecida, um contexto que tenha trabalhado.” Até então, a avaliação tinha muitas questões de leitura de texto, de observação de desenho, e poucas de escrita.
Para muitos educadores, a alfabetização precisa estar atrelada ao contexto da criança para ser efetiva. “Há chance de que o 1º e o 2º anos se tornem um treinamento”, diz Patricia.
A última avaliação mostrou que mais de 50% das crianças não tinham desempenho suficiente em leitura e escrita. Elas não sabiam escrever palavras como “porco”. O MEC também vai avaliar este ano a educação infantil, mas com questionários para professores e diretores. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.