Rio de Janeiro – O procurador federal Fábio Aragão afirmou ontem que mais três auditores confirmaram a existência de um esquema de propina em que a Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan) pagaria mensalidade a integrantes do governo federal. A Firjan convocou a imprensa e negou as acusações.
Segundo Aragão, a auditora Maria Teresa Alves, que aparece conversando com Maria Auxiliadora de Vasconcellos na gravação apresentada na edição da última segunda-feira no Jornal Nacional; o marido de Maria Teresa, Francisco Santos Alves; e uma terceira pessoa que ainda vai depor, confirmaram o esquema.
O vice-presidente da Firjan, Carlos Mariani Bittencourt, afirmou ter recebido a notícia com surpresa. ?A Firjan recebe a informação com surpresa porque teve contato com o procurador ao longo do mês de maio. Todas as informações que vieram do procurador seriam sempre na linha de que esta senhora (a presidente do Sincera, Maria Auxiliadora de Vasconcellos) teria ouvido dizer?, afirmou.
Segundo o vice-presidente do Centro Industrial do Rio de Janeiro (Cirj), João Lagoeiro Barbará, as denúncias são ?fantasiosas e delirantes?. ?Era impossível que houvesse um contrato como a senhora Maria Auxiliadora diz entre a Firjan e a fiscalização do INSS. Ainda mais um contrato que viria do governo Fernando Henrique e que atravessou incólume essa transição bastante drástica do PSDB para o PT?, afirmou.
Desde maio, quando surgiram as denúncias sobre um suposto esquema de ?caixinha? na Firjan, a entidade realizou uma auditoria externa e entregou a conclusão do trabalho ao Ministério Público Federal. A auditoria, no entanto, se limitou a verificar se havia algum tipo de contrato formal entre o Sindicato dos Auditores Fiscais do Rio de Janeiro (Sinsera) e a Firjan. Segundo Barbará, a federação não tem poderes para verificar os níveis de fiscalização das empresas fluminenses. ?A Firjan não tem poder de fazer isso, não pode chegar na empresa e verificar a conta de INSS ou a folha de pagamento?, disse.
Segundo Barbará, o presidente da federação, Eduardo Eugenio Gouvêa Vieira, afirmou por telefone jamais ter tido qualquer contato com Delúbio Soares ou Amir Lando. O presidente da federação está fora do País.
A denúncia
O Ministério Público Federal está investigando acusações de que a Firjan pagaria propina ao PT para que as empresas fluminenses não fossem fiscalizadas pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). A apuração se baseia em conversa telefônica gravada em agosto do ano passado pela Polícia Federal, com autorização judicial. Na conversa, a então presidente do Sinsera, Maria Auxiliadora de Vasconcellos, diz que o ex-ministro Amir Lando lhe relatou um esquema em que a Firjan pagaria propina ao PT.
Maria Auxiliadora foi presa em 6 de maio pela Polícia Federal, acusada de dar suporte a uma quadrilha de 13 fiscais do INSS que praticavam extorsão contra empresas fluminenses. O esquema, segundo a PF, teria causado um rombo de R$ 3 bilhões na Previdência Social. Auxiliadora sozinha, calcula a Polícia Federal, causou prejuízos de R$ 9 milhões, excluindo débitos inscritos de nove empresas em troca de propinas.
Gravação rica em monossílabos
Rio de Janeiro – Na gravação exibida pelo Jornal Nacional, Auxiliadora fala quase todo o tempo com outra auditora, Maria Teresa Alves, que responde apenas com monossílabos. Auxiliadora relata, com aparente surpresa, que o ministro Amir Lando lhe contara ter recebido ordens do então ministro da Casa Civil, José Dirceu, para afrouxar a fiscalização: ?Aí foi que ele disse, olha, na realidade, o que acontece é o seguinte. Eu, no Rio de Janeiro, não vou mexer no Rio porque eu me comprometi a não mexer no Rio de Janeiro. O Rio tem um contrato com a Firjan… Abriu o jogo, ele mesmo abriu o jogo. A Firjan dá uma mensalidade, dá não sei quê, e quem vai buscar é o Delúbio de Souza, sei lá, Soares…?.
Na fita, ela amplia as acusações, afirmando que o esquema teria sido montado ainda no governo passado, quando o Ministério da Previdência era ocupado por Waldeck Ornéllas – e foi mantido depois por José Cechin. Ornéllas rechaçou as denúncias: ?O meu período no ministério é marcado pelo combate firme e rigoroso à corrupção e à fraude na Previdência Social?, afirmou.
Na reportagem exibida pelo telejornal da Rede Globo, o ex-ministro Amir Lando também negou as acusações. ?O (então) ministro José Dirceu jamais determinou que não se fiscalizasse o Rio de Janeiro?, assegurou Lando. ?Pelo contrário, nós recebemos denúncias de que as 500 maiores empresas do Rio de Janeiro não eram fiscalizadas há mais de dez anos?, disse. Ele acrescentou que na sua gestão foram criados mais órgãos que melhoraram a forma de arrecadação da Previdência Social.
Especulações
A Firjan emitiu nota onde afirma desconhecer o esquema de propina mencionado por Maria Auxiliadora e garante que jamais se reuniu com o ex-ministro Amir Lando e com Delúbio Soares. Também em nota, o deputado José Dirceu disse que as acusações são infundadas. Advogados de Delúbio Soares afirmaram que ele desconhece as denúncias.
Nos últimos dias, cresceram as especulações de que o presidente da Firjan, Eduardo Eugênio Gouvêa Vieira, seria convidado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva para ocupar o Ministério da Previdência ou o das Cidades. Gouvêa Vieira está na comitiva do presidente Lula em Paris, que partiu ontem, de Brasília, para a capital francesa.
Reincidente
Não foi a primeira vez que Maria Auxiliadora acusou a Firjan. Em maio, ao ter sua prisão preventiva pedida pelo Ministério Público Federal, por corrupção passiva, ela afirmava, em gravações de diálogos com cúmplices, que pessoas ligadas à Firjan lhe indicavam empresas dispostas a pagar aos auditores para não serem fiscalizadas.
Previdência afirma que há fiscalização no Rio
Brasília – Diante das denúncias de existência de um esquema de corrupção envolvendo a Federação das Indústrias do Rio de Janeiro (Firjan), o PT e o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), o Ministério da Previdência Social divulgou nota ontem, explicando como atuam os fiscais do órgão e na qual afirma que a média de fiscalizações feitas pelo INSS no Estado do Rio de Janeiro é bem superior às realizadas nos demais estados, o que mostraria que não há abstenção em se fiscalizar as empresas fluminenses.
Segundo a nota, das 15.050 maiores empresas no Brasil, 71,02% (o que equivalente a 10.689 contribuintes) foram fiscalizadas nos últimos dez anos. Dessas 15 mil maiores empresas, 989 são do estado do Rio. Dessas 989, 77,55% (o equivalente a 767 empresas) sofreram ação previdenciária no período de 10 anos. De acordo com a nota, esses dados apontam que o Rio de Janeiro apresentou um desempenho de fiscalização 6,53 pontos percentuais superior ao alcançado na média do País.
A nota diz ainda que o cadastro da Secretaria da Receita Previdenciária (SRP) tem 5,3 milhões de empresas cadastradas, que representa uma arrecadação efetiva de R$ 8,5 bilhões por mês. O quadro de profissionais da SRP é composto por 4.500 auditores fiscais responsáveis por fiscalizar esse universo de contribuintes. Dessa forma, cada auditor seria responsável por fiscalizar aproximadamente 1.178 empresas. Para atingir um melhor resultado da ação fiscal, o Plano de Ação da Fiscalização da Receita Previdenciária, instituído em 2000, definiu a meta de atuar na cobertura dos grandes contribuintes.
Assim, o foco da fiscalização está voltado para a auditagem das 15.050 empresas no Brasil que representam 65% da arrecadação previdenciária mensal. As demais empresas são fiscalizadas por amostragem, aliada ao acompanhamento permanente, realizado por meio de sistemas corporativos da Previdência, feito pelos 6.500 servidores administrativos que atuam na SRP.
Jucá nega
Além da nota, também o ministro da Previdência Social, Romero Jucá, nega a existência de um esquema de ?caixinha? por parte das indústrias do Rio de Janeiro, para pagar propina ao PT e escapar da fiscalização da Previdência. ?Na minha gestão eu posso garantir. No ano passado eu não era ministro?, disse Jucá, que substituiu no ministério o seu colega de partido (PMDB), Amir Lando.
Segundo Jucá, desde que assumiu o ministério, em março passado, determinou a obrigatoriedade de monitoramento sobre as empresas que representam 70% dos maiores contribuintes em cada Estado. Desta forma, garantiu o ministro, os maiores contribuintes no Rio de Janeiro estão sendo monitorados mensalmente pela previdência.