Mesmo seis anos após a morte do marido, o então prefeito de Campinas Antonio da Costa Santos, conhecido como Toninho do PT, a viúva Roseana Garcia ainda se sente abandonada pelo diretório do Partido dos Trabalhadores. ?Não quero falar do PT, nem do Lula?. As memórias do dia 10 de setembro de 2001 ainda doem para a psicanalista. Eram quase 22 horas quando Roseana e a filha Marina esperavam Toninho para jantar. Ele havia ido ao Shopping Iguatemi trocar uma roupa. Como estava demorando, Marina resolveu ligar em seu celular, e foi atendida por um policial. Assustada, desligou.
Roseana acionou Gerardo Mello, atual presidente do PT de Campinas, para que ele a ajudasse obter informações sobre o que havia ocorrido. Minutos depois, recebeu a notícia de que o então prefeito da cidade havia sido assassinado. Três tiros foram disparados por quatro ocupantes de um Vectra prata em direção ao Palio do prefeito – um deles atingiu fatalmente Toninho. Toda a cúpula petista se deslocou a Campinas para o velório. Estiveram presentes o senador Eduardo Suplicy, a ministra do Turismo Marta Suplicy, que à época era prefeita de São Paulo, o deputado José Genoino e o hoje presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva.
Lula deu declarações incisivas nos primeiros meses sobre o assassinato e, segundo a viúva, chegou a dizer, na campanha presidencial de 2002, que colocaria a Polícia Federal para investigar o crime se fosse eleito – o que não ocorreu. Até hoje não há uma conclusão sobre os assassinos, nem sobre a motivação do crime. Os promotores do Ministério Público de Campinas, Ricardo Silvares e Fernando Vianna, atribuem a autoria do assassinato à quadrilha de Wanderson de Paula Lima, o Andinho, que está preso. Ele, no entanto, assume diversos crimes, mas não esse.
Hipóteses
A apuração dos promotores aponta que Toninho do PT teria sido morto por ter atrapalhado uma fuga dos bandidos no trânsito. Entretanto, o monitoramento do celular de um integrante da quadrilha revelou que Andinho estava a 77 km do local do crime no momento da morte e a arma do crime nunca foi localizada. A família de Toninho sempre contestou a versão apresentada pelo MP e pela polícia, que chegou a cogitar, prematuramente, uma tentativa de assalto – versão desmentida posteriormente.
Para a viúva do prefeito, as investigações ?foram mal feitas? e ?muita coisa deixou de ser apurada?. Roseana diz, convicta, que seu marido foi assassinado por ações na Prefeitura que contrariavam interesses políticos e empresariais, como no caso do contrato do lixo, cujas negociações para redução de valores a serem pagos foram bastante intensas durante os poucos meses de mandato de Toninho. Ela pondera ainda que o projeto de expansão do aeroporto de Viracopos, que teria que deslocar favelas que predominam em seu entorno e onde há tráfico de drogas, pode ter estimulado os assassinos.
Dúvidas cercam a cabeça de Roseana, mas de uma coisa ela tem certeza: quem o matou sabia que era o prefeito que estava naquele carro e tinha motivações para isso. ?A convicção, que foi ficando cada vez mais forte, até tornar-se uma certeza, é de que o crime do meu marido foi de mando?. Segundo a viúva, muitas pessoas foram favorecidas com a morte de Antonio, "especialmente políticos, empresários ligados à prefeitura e especuladores imobiliários, só para citar alguns?.
Atos e homenagens
Amanhã, prestes a completar seis anos de morte, atividades serão realizadas para manter viva a memória de Toninho. A família optou por antecipar os atos para ter mais participação popular, mesmo sendo parte de um feriado prolongado. ?No domingo as pessoas não trabalham e fica mais fácil de participar?, comenta Roseana.
Pela manhã, a partir das 10 horas, as atividades ocorrem na Avenida Mackenzie, próximo ao Shopping Iguatemi, onde Toninho foi morto. Lá estão previstas uma abertura com duas sacerdotisas um ato contra a impunidade e um terço em memória do prefeito. À noite, às 19h, uma missa está agendada na Igreja Nossa Senhora Aparecida, no bairro Jardim Proença, onde Toninho viveu durante muitos anos de sua vida, em um casarão histórico.
Crime ofuscado
A dor diante da falta de explicações perdura na vida de Roseana. Emotiva, ela diz que seu marido foi assassinado ?de uma maneira covarde?. ?Irei chorar sempre no dia 10 de setembro. Interromperam a vida e os sonhos de Antonio, e levaram um pedaço da minha vida também?, declara ela, que atualmente vive em São Paulo. A viúva acredita ainda que o crime de Toninho do PT caiu no esquecimento, à exceção de Campinas. ?Fora de lá, a imprensa nunca deu o merecido destaque?, critica. O crime acabou ofuscado por um acontecimento histórico. Menos de doze horas após o assassinato, o mundo acompanhava os atentados aos Estados Unidos que culminaram com a queda das torres gêmeas do World Trade Center e milhares de mortos.
Caso Antonio ainda estivesse vivo, teria 55 anos, e, para Roseana, estaria ?muito provavelmente no seu segundo mandato de prefeito?. E mesmo não querendo falar sobre o PT, ela observa: ?Ele não teria compactuado jamais com as falcatruas que o PT vem fazendo. Como político, ele mesmo dizia que não tinha o rabo preso com ninguém?. E continua: ?Antonio era um urbanista apaixonado por Campinas e a cidade estaria bem melhor hoje se ele não tivesse sido assassinado. Mas estaria melhor para as pessoas preocupadas com o bem comum?.
Ora com discurso mais duro, ora com os olhos marejados, Roseana conta que, apesar de mais descrente sobre um desfecho "justo" sobre as investigações, ela mantém a luta. ?O que me fez agüentar firme foi a minha indignação frente ao descaso das autoridades em esclarecer o crime, foi ter conhecido de perto a podridão das instituições que, em princípio, deveriam proteger o cidadão. Mas acho que foi meu amor por Antonio que realmente me deu forças?.