Os sete primeiros dias de Liliane Pataquiva, de 38 anos, no Brasil foram vividos à base de água e arroz, nada mais. Nos quatro meses seguintes, teve de aceitar um emprego informal, a recusa de uma escola em matricular o filho caçula, Angelo, de 14 anos, e a burocracia exigida por locatários para conseguir moradia. “Muitas vezes aceitamos o que não devíamos porque não sabíamos se era um direito”, diz a colombiana, que está há dois anos e meio no País. Ela será atingida pela nova Lei de Migração.

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Dentre as garantias da nova legislação está a possibilidade de estrangeiros serem atendidos na rede pública de educação e de saúde e de tirarem carteira de trabalho, para conseguirem uma vaga na economia formal. A lei também facilita a obtenção de documentos e a regularização da situação sem a necessidade de sair do País. E coíbe a xenofobia e o racismo. Há ainda pontos considerados polêmicos, como a anistia aos imigrantes que já estão no Brasil, a proibição de deportação imediata e a permissão para que integrem partidos políticos e sindicatos.

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O direito à “acolhida humanitária” poderia ter evitado as dificuldades burocráticas enfrentadas por Liliane, que só conseguiu alugar uma casa porque um “anjo” aceitou. “Meu contrato é de confiança.”

Um ano depois, Liliane voltou a trabalhar atrás de um fogão, como nos 12 anos em que manteve um restaurante em Bogotá, com o marido Cesar Giovanni, de 36 anos. Com uma foodbike, lançou a Arepas Urbanika, especializada em arepas, espécie de pão de farinha de milho recheado, típico da Colômbia. Por ter um visto temporário, mesmo há dois anos no País, não conseguiu comprar um veículo para transportar a bicicleta. “Fui em tudo que é concessionária. Diziam que o Brasil tinha feito um favor em nos aceitar. Não imaginava que seria tão difícil.”

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Por isso, chegou a acumular mais de três meses de contas de água, eletricidade e internet, que foram quitadas quando colocou uma banca culinária em um galpão na Vila Madalena, na zona oeste, e o marido foi atrás de outro emprego em um restaurante.

“Dizem que essa nova lei vai nos dar os mesmos direitos que os dos brasileiros. O que queremos é ficar aqui, trabalhar, construir uma vida, nada mais. As pessoas gostam da minha comida, por que então não poderia ficar?”, indaga a colombiana, que também é mãe de Daniel, de 22 anos, que se mudou para o País após receber ameaças por se recusar a pagar propina a organizações criminosas.

Emprego de ‘imigrante’. Mohamad Alsaheb, de 35 anos, era designer gráfico e de animações em vídeo em Damasco, na Síria. Refugiado, ficou “por acaso” no Brasil, após ter a entrada negada na Europa. “Aqui é fácil chegar, mas, também, depois que a gente entra, tem de se virar totalmente sozinho”, diz ele, que relata dificuldades de encontrar emprego em sua área e hoje trabalha como professor de árabe e inglês e designer de tatuagem de henna.

“Eu gosto de ensinar línguas, comecei como voluntário, mas vejo que as pessoas não conseguem entender que a gente sabe fazer outras coisas, não acreditam quando conto qual era a minha profissão”, afirma ele, que está no País há dois anos.

Aprovada pela Câmara e pelo Senado, a Lei da Migração foi enviada anteontem para o Palácio do Planalto. O texto será analisado pela Casa Civil e pelos ministérios envolvidos e, segundo o Estado apurou, deve ser sancionada pelo presidente Michel Temer com poucos vetos. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.