Genebra (AE) – O Brasil pediu hoje à Organização Mundial do Comércio (OMC) o direito a retaliar os Estados Unidos em US$ 1,037 bilhão por causa dos subsídios oferecidos aos produtores americanos de algodão. Como Washington não reformou os subsídios, como ordenou a OMC, o Brasil pôde pedir a sanção. O setor privado brasileiro, porém, disse "estranhar" o valor, pois imaginava que seria maior. O próprio governo admite que não tomou a decisão de usar o direito de retaliar. "Isso ainda necessitaria de uma decisão da Câmara de Comércio Exterior (Camex)", afirmou Roberto Azevedo, coordenador responsável pelos contenciosos comerciais no Itamaraty.
A OMC havia dado até o dia 21 de setembro para que os EUA cumprissem a condenação declarada há seis meses e retirassem os subsídios. O Brasil conseguiu que a entidade declarasse ilegais os subsídios. Até o diretor-geral da OMC, Pascal Lamy, deixou de lado sua tradicional neutralidade e hoje (6) criticou os EUA por não terem retirado os subsídios.
O caso teve duas fases: a condenação dos subsídios internos e de exportação. Na primeira, vencida em julho, os EUA precisariam retirar os subsídios à exportação e não o fizeram. Mas os dois países acertaram um cronograma de reformas até o fim do ano. Enquanto isso, o Brasil não aplicaria a retaliação, calculada em US$ 2,9 bilhões. Com o pedido de hoje, referente aos subsídios domésticos, o Brasil acumularia o direito de retaliar em quase US$ 4 bilhões, de um total de US$ 11 bilhões no comércio bilateral.
O Brasil optou, portanto, por incluir em seu pedido de retaliação não apenas o aumento de tarifas para bens importados dos EUA, mas, principalmente, a suspensão de concessões em áreas como serviços e propriedade intelectual.
A estratégia do governo é atingir exatamente as áreas mais sensíveis para os americanos, caso as retaliações sejam aplicadas. "Estamos livres para escolher o setor que mais nos convenha para a retaliação", disse Azevedo.
Além disso, ao incluir questões como patentes e serviços financeiros, turismo, transporte e construção, o Brasil tenta atenuar os possíveis efeitos contrários da retaliação. Caso as sanções sejam impostas sobre produtos industriais, uma das conseqüências poderia ser o aumento de seu preço no mercado interno e, portanto, uma nova pressão inflacionária.
O tema entrará na agenda da OMC no próximo dia 18. Os americanos deverão discordar do valor pedido pelo Brasil e uma nova arbitragem terá de determiná-lo.
Pedro Camargo Neto, da Sociedade Rural Brasileira, não entende a metodologia usada pelo governo para calcular a retaliação. Jorge Maeda, presidente da Associação Brasileira de Produtores de Algodão (Abrapa), disse há dois dias, em Zurique, que o valor ficaria perto de US$ 3 bilhões.
O governo explicou que estipulou o valor com base no excesso de produção de algodão dos EUA possibilitado pelos subsídios. O Brasil multiplicou esse excesso pelo preço do algodão no mercado internacional e chegou ao US$ 1 bilhão. Para Camargo Neto, sem os subsídios não haveria algodão nos EUA e, portanto, a retaliação deve ser maior. Em 2004, os produtores americanos receberam US$ 4 bilhões em subsídios, 100% mais que o valor da produção.