Bondade municipal

O prefeito Cassio Taniguchi, de Curitiba, decretou que todos os contribuintes em atraso com o IPTU podem pagar o imposto até o dia 18 deste mês, livres da regular atualização monetária, juros e multa. A bondade municipal, segundo informou a assessoria do prefeito, beneficia exatos 68.929 contribuintes inadimplentes que, naturalmente, devem estar agradecidos.

Antes mesmo que lhe fosse perguntado (nem mesmo sugerido se dentre os indultados estão amigos, amigos dos amigos ou parentes), justificou o alcaide não estar promovendo nenhum tipo de renúncia fiscal. “Não abrimos mão do imposto – disse – apenas retiramos os juros e multas por atraso para pagamento à vista”. Esclareça-se que no valor do IPTU, além de eventuais acréscimos por atraso, está embutida a taxa de coleta de lixo, um serviço essencial para a vida da cidade.

A medida reacende a polêmica que sempre acompanha indultos, perdões e favorecimentos do gênero. Quando receberam os carnês, no início do ano, os curitibanos foram advertidos que, pagando em quota única até 31 de janeiro, teriam desconto de 10% sobre o valor lançado. Os que pagaram em quota também única até 10 de fevereiro não tiveram desconto algum, enquanto sobre o recolhimento fora dos prazos estabelecidos (assim cada folha do carnê advertia o contribuinte) incidiria atualização monetária pela tabela de correção da Prefeitura (como se a moeda fosse própria), mais juros de 1% ao mês ou fração, além de multa de 0,33% ao dia até o limite de 10%.

Esta é, aliás, a sistemática utilizada pela Prefeitura de Curitiba com relação aos demais tributos, como o Imposto sobre Serviços – ISS. Ninguém em atraso escapa do complicado cálculo que os próprios caixas das agências bancárias receptoras torcem o nariz ao serem intimados a fazer (e às vezes se recusam a fazê-lo). Já aqui, portanto, salta à vista o tratamento desigual estabelecido pela autoridade municipal entre contribuintes iguais de impostos diferentes…

É forçoso considerar que os menos de 70 mil inadimplentes do IPTU estão sendo favorecidos frente aos mais de 335 mil proprietários bons pagantes. E como! Muitos deles pagaram à vista, outros em parcela única para não correr o risco do esquecimento mensal; outros, metodicamente, todo mês compareceram no guichê para depositar a sua parte. Mas muitos pagaram com atraso e, portanto, acrescidos de multa, juros e correção. Quem nada pagou, agora é anistiado por decreto. Dois pesos e duas medidas que acabam, sempre, em confusão. No mínimo, agride os brios do bom pagante. É claro que ano próximo outros poderão deixar de pagar na esperança de obter o mesmo benefício…

O que atrapalha a vida dos brasileiros – entre outros (muitos) problemas – é a falta de regras claras e duradouras subordinando todos os cidadãos a uma mesma rotina. Um tratamento justo, como se costuma dizer. Mas com a irresponsabilidade com que não se cumprem normas estabelecidas, elas também são alteradas de uma hora para outra, seja no Imposto de Renda, no cálculo da aposentadoria, nos planos de saúde, nas multas de trânsito, no IPTU, enfim, nas mais de 60 taxas, impostos, contribuições e assemelhados que infernizam a vida do contribuinte. Este vive a síndrome permanente do assalto praticado pelo Estado com a vaga sensação de que o pior está, sempre, por acontecer.

Assim, o que seria um ato de bondade do prefeito, passa a ser visto como uma espertice, no mínimo endereçada a completar uma meta de arrecadação, como se o Estado pudesse dispor dos contribuintes como objetos em liquidação, como fazem lojas comerciais. E pensar que o tema sequer interessou aos representantes do povo – os vereadores -, cujos salários são, também, pagos pelos contribuintes.

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