Mais rapidamente do que se previa, os cardeais elegeram outro não italiano para bispo de Roma e, por extensão, sumo pontífice da Igreja Católica Apostólica Romana, com o nome de Bento XVI. A repetição de um não italiano para ocupar o posto dá continuidade à política que levou Karol Wojtyla, um polonês, ao comando de cerca de um bilhão de católicos, depois de séculos de italianos ocupando aquelas funções. Este fato tem significado, embora seja certo que mais do que a sucessão não italiana importe a continuidade do conservadorismo do papa polonês. Este tinha em Joseph Ratzinger seu braço-direito, confidente e principal conselheiro. E Ratzinger não só compartilhava como reforçava as posições ortodoxas e conservadoras do papado a que servia, como guardião da Congregação para a Doutrina da Fé.

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Essa congregação, embora pouco se pareça com sua origem, o Tribunal da Inquisição, pelo menos na inspiração ortodoxa, traz uma herança que os tempos modernos tendem a rejeitar. Se não tanto, a modificar ou pelo menos amainar.

Havia uma tênue esperança de que um latino-americano viesse a suceder a João Paulo II, embora a maioria dos vaticanistas considerasse mais provável um sucessor italiano, talvez o prestigioso arcebispo de Milão. A América Latina, e nela o Brasil, é o continente com a maior população católica do mundo. E é aqui que a Igreja Católica, apesar do indiscutível prestígio de João Paulo II, até adorado por nosso povo, mais tem recebido contestações em suas posições dogmáticas ortodoxas. Entre nós crescem as igrejas e cultos não católicos, muitos por atuarem com maior flexibilidade, buscando resolver problemas como o do clero feminino, do casamento entre pessoas do mesmo sexo e tantas outras bandeiras que são entendidas como liberais e, por isso mesmo, mais atuais.

O fato de Bento XVI não ser italiano, em si, nada influi. Ele vive há tantos anos em Roma que é considerado pelos italianos como um deles. Se sua nacionalidade não influiu, influirá sua idade, pois sendo o mais velho dos cardeais papáveis, com 78 anos completados no último dia 16, há a perspectiva de que seu reinado seja realmente bem mais curto do que o de Karol Wojtyla, que foi papa por quase 27 anos e, apesar de seu conservadorismo, soube usar seu natural carisma e admirável diplomacia para conquistar, à unanimidade, corações em todo o mundo, mesmo não conquistando as mentes, na mesma proporção.

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Aqui mesmo, no Brasil, todos conhecem o silêncio imposto a frei Boff, pelas inovações que pregou. E Ratzinger foi quem lhe impôs o silêncio obsequioso na pregação de sua Teologia da Libertação.

Dizemos que influirá a idade na perspectiva de que venha a ser papa por um espaço mais curto de tempo que seu antecessor, quando será sucedido talvez por um italiano, quem sabe por um sul-americano, mas de qualquer forma provavelmente por um papa mais liberal. Dois papas igualmente conservadores, ambos respeitáveis e respeitados, com larga autoridade e dignos da admiração de um bilhão de católicos, parece-nos que não serão suficientes para impedir que os ventos da evolução liberal atinjam a igreja, a partir do próximo papa, quando então poderá voltar a ser, de fato e de direito, a grande força que, ao longo da história, conquistou perante toda a humanidade. Idade avançada e provável papado curto não querem significar mera transição. Basta recordarmos o pontificado revolucionário de João XXIII.

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