Bem explicadinho

Os tucanos – e muitos outros brasileiros de fato preocupados com o futuro do Brasil – insistem: é preciso debater para esclarecer quais as reais propostas que alimentam os sonhos de nossos dois candidatos à Presidência da República. Mais que covardia ou nariz empinado, ou simplesmente parte de uma tática eleitoral, a fuga do debate é um ato de lesa-pátria e de ofensa grave aos eleitores, dizem os que apóiam José Serra. Eles querem puxar Lula para a arena, para a frente das câmeras.

Exagero? Basta apenas lembrar o plebiscito da dívida pública promovido pela Conferência Nacional dos Bispos do Brasil há dois anos, com o apoio ativo e a viva participação do Partido dos Trabalhadores. O que se articulava era o argumento do calote no pagamento da dívida pública, seja aquela externa, seja esta interna. Com a candidatura de Lula, o PT engavetou o argumento e, recentemente, preferiu não entrar no debate sobre a Alca. Mas os efeitos devastadores da tradicional postura do partido acerca da questão estão aí. O temor dos chamados mercados elevou o dólar para além da imaginação.

No último confronto do primeiro turno, perguntaram a Lula se ele era a favor – sim ou não – da transposição das águas do Rio São Francisco. É um projeto mais que centenário, a dividir opiniões em cada margem do rio. Embora ele tenha criticado o presidente Fernando Henrique Cardoso por ficar em cima do muro, tergiversou e sobre o mérito da pergunta acabou, também, nada dizendo. Para o candidato outrora com palpite e posição sobre tudo e todos, assim que as costuras por apoio eleitoral foram acontecendo, as coisas mais simples dependem de fundos estudos… O que é perfeitamente compreensível. Candidato que vai à luta é para vencer. E para vencer não pode cair em armadilhas, em pegadinhas.

Se pelo menos houvesse a sinceridade que faltou a todos até aqui, de dizer que ninguém está num concurso para super-homem e que, bem-intencionados, tributam o mais sério respeito ao parlamento, cuja contribuição é sempre mais decisiva que a isolada ação presidencial. Mas o papel do Congresso Nacional foi esquecido ao longo de todo o primeiro turno, mesmo em questões triviais, como prometida fixação de um novo salário mínimo. Teve candidato que chegou a mandar cunhar propaganda pessoal com valores, desprezando o fato de que muitas dessas promessas dependerão de apoio (e deliberação) do Legislativo, sem o que serão letra morta – aliás, vivo documento a solapar-lhes a própria credibilidade. Reformas como a da Previdência, que jazem inacabadas, e outras nem começadas, como a tributária, teriam acontecido há muito tempo fosse apenas a vontade pessoal de FHC – também um prometedor a seu tempo.

Onde buscarão recursos, como haverão de fazer, com que forças os candidatos haverão de contar (em meio a esse samba de crioulo doido de coligações e apoios) para realizar o milagre do paraíso descrito nos palanques eleitorais – eis a questão que precisa ficar bem explicadinha. Os eleitores e contribuintes merecem a mínima consideração e respeito, convocados que são para decidir na escolha. Ou, então, todas as esperanças criadas devem ser levadas à conta de um mero ato irresponsável de quem almeja o poder pelo poder.

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