Houve um tempo em que várias nações latino-americanas eram chamadas pelos estadunidenses de repúblicas de bananas. A expressão tinha um evidente tom pejorativo, pois não se resumia à constatação de que muitas delas, especialmente as caribenhas e centro-americanas, tinham na banana o seu principal produto de exportação, como reconheciam que, como grandes importadores, os Estados Unidos, através da gigantesca empresa United Fruit, dominavam esses países. Os interesses norte-americanos sobre a produção de banana sustentavam ou derrubavam governos e a maioria deles era mantida como ditaduras ferozes contra seus cidadãos e dóceis em relação a Washington. Evidente que não mereciam respeito, pela sujeição aos interesses dos EUA. De tempos para cá, democracias se instalaram na América Latina e se consolidaram. Uma delas é a do Brasil, país que nunca foi, nem econômica nem politicamente, uma “banana republic”, embora alguns de seus governos, no passado, possam ser criticados por alguma sujeição a interesses continentais liderados pelos EUA.
O fato histórico da existência de “banana republics”, tanto quanto a ignorância de muitos norte-americanos, inclusive alguns de seus líderes, sobre o que existe abaixo do Rio Grande, é indesmentível. Ainda recentemente, um presidente norte-americano confundiu o Brasil com a Bolívia e muitos de seus concidadãos pensavam (e não poucos ainda pensam) que a capital do Brasil é Buenos Aires.
O secretário do Tesouro dos Estados Unidos, Paul O’Neill, por maledicência, ignorância ou equívoco, referiu-se ao Brasil e países vizinhos como se fossem repúblicas de bananas. Insinuou que os organismos financeiros multilaterais não devem nos dar crédito enquanto não provarmos que o dinheiro não irá parar em contas numeradas na Suíça. Ele confunde alhos com bugalhos e mostra crassa ignorância. O Brasil, como outros países, inclusive e principalmente os Estados Unidos, sofre do mal da corrupção. Talvez lá ela seja até maior que aqui. Mas não somos uma república de bananas nem estamos dispostos a receber puxões de orelhas de uma autoridade estrangeira que não tem nem autoridade nem conhecimentos para isso. Somos uma democracia e, como tal, a corrupção que aqui se verifique terá os mecanismos investigatórios atuando e punições legais a serem aplicadas. Diferentes eram as repúblicas de bananas dominadas pelos interesses econômicos norte-americanos, onde eles impunham cruéis e podres ditaduras, para garantir seus interesses, mesmo os mais escusos. Sem desejarmos cair em linguagem chula, diríamos que Paul O’Neill foi maledicente e burro. E que ele, com todos os seus títulos, deveria ter um mínimo de conhecimento sobre o Brasil e comportar-se com o respeito que seu cargo recomenda e nosso país merece.
O governo brasileiro já reagiu, manifestando à embaixadora norte-americana Donna Hrianak o profundo mal-estar que as infelizes declarações de O’Neill provocaram. Ela e outras altas autoridades norte-americanas contornaram o incidente, pedindo indiretamente desculpas ao Brasil, que as aceitou. No campo diplomático, ficamos numa paz armada. O secretário do Tesouro dos Estados Unidos tem viagem marcada para o Brasil. Será recebido, se vier, mas certamente sentirá o gosto azedo da recepção. Se por mau humor ele deseja xingar a mãe, que não seja a nossa mãe-pátria. Que xingue a dele mesmo, pois lá não faltam escândalos a serem condenados.