Para os militantes de movimentos ligados à questão agrária, o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva merece dez elogios e 29 críticas por seu trabalho nas áreas da agricultura familiar e reforma agrária. O balanço foi apresentado hoje, em Porto Alegre, durante o Fórum Terra, Território e Dignidade, organizado pela Via Campesina como atividade paralela à Conferência Internacional sobre Reforma Agrária e Desenvolvimento.

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O documento é assinado pelos movimentos dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra (MST), dos Atingidos por Barragens (MAB), das Mulheres Camponesas (MMC), dos Pequenos Agricultures (MPA), pela Comissão Pastoral da Terra (CPT) e pela Associação Brasileira de Reforma Agrária (Abra).

No balanço, as entidades consideram avanços do governo atual a implantação do seguro rural, o aumento do volume de crédito para os pequenos agricultores, para educação no campo e para assistência técnica, a ampliação dos incentivos para a construção de casas, o programa Luz Para Todos, a demarcação da área indígena Raposa Serra do Sol, e a adição do biodiesel de origem vegetal no óleo diesel.

Críticas

A questão agrária mereceu 11 das 29 menções a medidas que, segundo as entidades, representam derrotas para a agricultura camponesa e os movimentos sociais no campo. O governo é criticado por não assentar prioritariamente as famílias acampadas, não implementar uma reforma agrária que ataque a concentração da propriedade de terra, não atualizar índices de produtividade, não mobilizar base parlamentar para impedir a CPMI da Terra e o relatório que considera ocupações crimes hediondos e não tomar iniciativa para pressionar o Judiciário a punir os responsáveis pelos massacres de Corumbiara (1995), Carajás (1996) e Felisburgo (2004).

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O documento também acusa o governo de "inoperante" por não dar uma demonstração clara de que combate a violência no campo e seus responsáveis, como o latifúndio, a polícia militar de alguns Estados e o agronegócio, por não tomar iniciativas para remover leis e medidas de governos anteriores que emperram a reforma agrária, por não mobilizar sua base parlamentar para aprovar a expropriação de fazendas que exploram trabalho escravo por não demarcar áreas indígenas históricas e por manter programas de assentamento orientados pelo Banco Mundial, como o Banco da Terra.

Além de distribuição de terra, as críticas se referem a diversos outros aspectos econômicos. Um deles é a liberação do plantio de soja transgênica sem considerar as demandas de camponeses e ambientalistas e a falta de fiscalização da rotulagem de produtos com organismos geneticamente modificados. Outros são a manutenção da Lei Kandir, aumento do crédito para a agricultura empresarial e apoio à formação de florestas para abastecimento de indústrias de celulose.

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E mais, vão até ao salário mínimo, que não dobrou seu poder aquisitivo, à construção de hidrelétricas, à não intervenção no mercado do leite, a posições levadas à Organização Mundial do Comércio pró agronegócio e à manutenção da política econômica neoliberal.

"Admitimos que houve avanços em relação aos governos anteriores", comentou um dos coordenadores nacionais do MST, João Paulo Rodrigues. "Mas temos que conseguir mais avanços", destacou, informando que o movimento contabilizava 200 mil acampados no início do governo Lula e que o número caiu pouco, para 120 mil. De 2003 a 2005 foram assentadas 145 mil famílias, mas, pelos cálculos do MST, só 80 mil saíram de acampamentos.

Para Rodrigues, a atualização do índice de produtividade seria suficiente para o governo poder desapropriar 50 mil hectares somente no Rio Grande do Sul, onde 2.500 famílias aguardam assentamento, algumas há seis anos.

Lúcido

O secretário executivo do Ministério do Desenvolvimento Agrário, Guilherme Cassel, considerou o balanço "lúcido" e disse que o documento reflete o amadurecimento das relações entre o movimento social e o governo. "Não é pouca coisa sair de uma pauta só de reivindicações e críticas e reconhecer avanços de nosso governo", avaliou. "O formato com que o balanço foi apresentado mais nos aproxima do que distancia "

Cassel reiterou que há diferenças de critérios entre o número de famílias assentadas que o governo contabiliza, de 245 mil, e as que o movimento contabiliza, de pelo menos 80 mil a menos, porque não considera assentamentos em lotes de desistentes e aquisições individuais. Prometeu, no entanto, que a meta de assentar 400 mil famílias em quatro anos será cumprida Assim que o orçamento da União for aprovado o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) poderá adquirir terras para assentar 20 mil famílias, destacou o secretário.