Era de se prever. A Câmara dos Deputados, aproveitando a chegada do papa ao País e com a certeza de que a ilustre visita ocuparia toda a opinião pública, sorrateiramente aprovou um vultuoso aumento de vencimentos para os parlamentares (deputados e senadores), para o presidente Lula e seus ministros e, como há vinculação, para os deputados estaduais e vereadores.

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O caradurismo foi tão evidente que o presidente da Câmara e do Senado e muitos outros parlamentares foram de Brasília a São Paulo para receber Bento XVI e voltaram no mesmo dia para, à noite, enquanto o noticiário estava pleno de informações e imagens da chegada do Sumo Pontífice, reunirem-se e aprovarem em votação simbólica projetos elevando em 28,05% os salários dos políticos, ou seja, deles próprios e ainda da turma do governo.

Na verdade queriam mais. Lutaram por um aumento que significasse ganhos iguais aos dos ministros do Supremo Tribunal Federal, ou seja, R$ 24.500,00 por mês para cada um. Mas o próprio supremo derrubou a pretensão.

Pelo projeto, que ainda precisa passar pelo Senado Federal, deputados e senadores passam dos atuais R$ 12.847 para R$ 16.512,09. Lula, que recebe atualmente R$ 8.885, receberá retroativamente a 1.º de abril, R$ 11.420. Já o salário do vice-presidente Alencar e dos ministros sobe de R$ 8.362 para R$ 10.748. Isto sem considerar as mordomias.

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Para felicidade geral da nação, não houve unanimidade. Alguns parlamentares e mesmo bancadas se posicionaram contra o aumento, embora algumas recuassem ?a posteriori?, deixando aos deputados, individualmente, a decisão. A princípio foram contra: o PSDB, o DEM (antigo PFL), o PSOL e até mesmo alguns petistas.

Mas o argumento principal a favor era o proclamado pelo deputado Eduardo Valverde, do PT, que dizia: ?Não é aumento ou reajuste, é reposição?. Evidentemente foi apoiado por vários colegas, todos interessados no dinheiro a mais que passarão a receber.

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O deputado Carlos William (PTC – MG), apresentou uma emenda que permite aos deputados e senadores renunciarem ao reajuste, devolvendo o dinheiro ao orçamento da Câmara. Assim, evitariam doações que poderiam ter sentido demagógico.

É a emenda ?pega demagogo?, numa alusão aos oposicionistas que se disseram contra o aumento. Se eram contra, vamos ver se devolvem.

A majoração dos ganhos dos políticos causará aos cofres públicos uma despesa a mais de R$ 610 milhões, incluídos aí deputados estaduais e vereadores cujos subsídios são vinculados aos dos deputados federais.

Cabe aqui e nos parece essencial uma discussão sobre o quantum que passaram a ganhar os nossos políticos e se realmente é elevado ou não. Na verdade, se tivéssemos políticos que honrassem seus mandatos (infelizmente são poucos), não seriam muito altos. Mas está provado que são servidores do povo que pouco ou nada fazem. E quando muito trabalham, não raro é para seus próprios interesses ou de terceiros, muitas vezes com negociatas e maracutaias que se transformam em casos de polícia. Não há independência entre os poderes. Assim, combinam seus ganhos e quem paga, o povo, não é consultado.

Se comparados aos ganhos de altos executivos, o que seria legítimo se bem trabalhassem, não são ganhos exagerados. Entretanto, comparados ao salário mínimo que é quanto ganham trabalhadores aposentados, pensionistas da previdência e muitos brasileiros em empregos estafantes de jornada integral, são absurdamente altos.

Nos parece que os salários dos políticos deveriam partir de uma comparação com o salário mínimo. Que para ganharem mais, teriam de conseguir um mínimo decente para o trabalhador. O mínimo, como os ganhos dos políticos, começam a ser vinculados à inflação e ao PIB, mas o problema está no ponto de partida. Fossem os nossos políticos, na maioria, bons e trabalhadores chegaríamos à conclusão de que não são eles que ganham muito. Os brasileiros comuns, os eleitores, é que ganham pouco.