O Poder Judiciário do Paraná está dando um salto de qualidade em relação às audiências. Desde o final de 2001, duas varas criminais da região de Curitiba usam um sistema novo para colher depoimentos. Ao invés do convencional, quando o juiz ouve o réu ou testemunha e, posteriormente, dita o que foi respondido ao escrivão, agora as audiências estão sendo gravadas. Em uso na 2.ª Vara Criminal de São José dos Pinhais e na 10.ª Vara Criminal de Curitiba, o sistema consiste em colher o depoimento (áudio e vídeo) através de uma câmera e posteriormente gravá-lo num CD-Rom. Do CD constam todos os demais procedimentos relativos ao processo. O CD original fica anexo aos autos, mas cópias dele são distribuídas às partes. Uma cópia escrita dos depoimentos continua fazendo parte do processo.
O juiz Roberto Luiz Santos Negrão, da 2.ª Vara Criminal de São José dos Pinhais, onde o sistema é usado desde novembro de 2001, contou que além da agilidade para a realização das audiências, a audiência digital também dá mais tranqüilidade no tocante à qualidade das informações. “Quando há intermediação sempre há o risco de se mudar algo, mesmo inconscientemente. Já nesse sistema, o juiz não precisa mais ditar o depoimento, dando mais segurança de que o que está registrado é exatamente o que o depoente quis dizer”, afirmou. Outra vantagem comentada diz respeito ao julgamento de recursos. “Com o sistema atual o juiz ou desembargador lê o depoimento e o interpreta. Com a gravação ele tem a oportunidade de rever o depoimento e analisar em que condições o réu deu a resposta. Um não dito de forma categórica significa algo. Um não dito de maneira titubeante pode significar algo diferente. No papel não é possível esta interpretação”, salientou Negrão.
No ano de 2001, sem a audiência digital, a 2.ª Vara de São José dos Pinhais realizou cerca de 250 audiências. Já no ano passado, com a inovação tecnológica, foram feitas 555 audiências. Somente nos quatro primeiros meses de 2003 já foram duzentas audiências. “A média é de oito e dez minutos por audiência, enquanto no método convencional levava de meia hora até quarenta minutos”, relatou Negrão.
Par o advogado e professor de Direito, René Ariel Dotti, a inovação é muito boa para o Judiciário. Para ele, o custo benefício da compra de novos equipamentos para as varas é plenamente aceitável, já que a qualidade das audiências melhorará muito. Dotti destacou um fator importante na relação pessoal existentes nas audiências. Trata-se das tensões emocionais geradas pelo próprio depoimento. Quanto o juiz é obrigado a ditar o depoimento, pode acontecer que uma ou outra palavra não seja exatamente da forma como foi falada. Assim, as partes podem recorrer, tornando a audiência ainda mais demorada e gerando um certo constrangimento. “Com a audiência digital isto não acontece. O juiz atua com mais tranqüilidade e o próprio réu e seus advogados têm a certeza de que tudo que está sendo dito entrará para os autos com absoluta fidelidade”, destacou Dotti, afirmando que a eficiência dos atos processuais é um dos desafios permanentes para a boa prestação jurisdicional.
Sponholz acha viável a inovação
Uma parceria entre o Tribunal de Justiça do Paraná e a Ordem dos Advogados do Brasil – Seccional Paraná (OAB-PR) pode vir a viabilizar a realização de audiências digitais nas varas criminais das principais cidades do Estado. O desembargador Oto Luiz Sponholz, presidente do TJ, informou que a parceira está praticamente firmada. Através dela, o custo aproximado de R$ 5mil para a compra do equipamento necessário (computador, câmera, microfones, gravador de CD) seria divido pela metade entre TJ e OAB-PR. Inicialmente as audiências digitais seriam levadas para as varas criminais das comarcas de entrancia final (Curitiba, Ponta Grossa, Londrina, Maringá, Cascavel e Foz do Iguaçu). Hoje, o Paraná tem 360 varas criminais e cíveis em suas 155 comarcas. “O sucesso dessa ação nas varas criminais vai gerar a expectativa de que se leve também para as varas cíveis. Isto é uma tendência natural”, afirmou o desembargador Sponholz.
Em algumas varas do interior de São Paulo já há audiências digitais. Sponholz destacou que outra facilidade imposta pelo novo sistema é que, quando um processo é levado a uma instância superior, ou no Supremo Tribunal Federal (STF) ou no Superior Tribunal de Justiça (STJ), todas as informações e gravações contidas no CD-Rom também podem ser analisadas. “A letra é fria. Já a gravação pode permitir melhor interpretação, inclusive para magistrados que não estiveram presentes no momento do depoimento”, destacou o presidente do TJ.
A visão favorável às inovações tecnológicas é clara nas declarações de Sponholz. Ele destacou que depoimentos via teleconferência que estão sendo realizadas em São Paulo podem ser uma alternativa para agilizar e baratear os custos da Justiça. “Recentemente uma decisão do STJ confirmou a legalidade dessas audiências. O tribunal entendeu que elas não violam o princípio da identidade física. Se isto for confirmado, não há motivo para não fazer depoimentos por teleconferência no Paraná”, destacou, ressaltando o fato de que a transferência de pessoas para depor, principalmente aqueles que já estão presas, gera muita despesa ao Poder Judiciário. (LM)