As verdadeiras bestas

O diretor-geral da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), delegado da Polícia Civil de São Paulo Mauro Marcelo de Lima e Silva, pediu exoneração e deixou o cargo. O pedido foi apresentado ao vice-presidente da República e presidente em exercício José Alencar, pois enquanto a fervura da crise por aqui continua queimando, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva representa o Brasil, como convidado especial, nas comemorações do 14 de Julho, em Paris, festa da Revolução Francesa que cortou muitas cabeças na guilhotina. Cabeças por aqui também continuam rolando. Primeiro caiu o deputado José Dirceu (PT-SP), todo-poderoso ministro-chefe da Casa Civil. Depois vieram três dirigentes do PT, inclusive o presidente do partido, José Genoino. Caiu também, no Ceará, um assessor do irmão de Genoino que transportava reais e dólares de forma imprópria e origem desconhecida, parte do dinheiro na cueca. O irmão de Genoino levou um tombo, mas ainda é deputado estadual no Ceará.

Não rolaram cabeças só no PT, mas também no governo, com alguns ministros perdendo cargos, poderes ou status. Outros foram devolvidos, por serem deputados, à Câmara Federal. Agora cai o diretor-geral da Abin – Agência Brasileira de Inteligência, substituta do SNI, órgão de investigação e segurança que não foi nada popular durante a ditadura militar. Um certo Mauro Marcelo de Lima e Silva pediu demissão depois de haverem descoberto no Congresso que ele, revoltado com o tratamento dado pela Comissão Parlamentar de Inquérito dos Correios ao agente Edgar Lange, que compareceu como testemunha, e não como indiciado ou suspeito, qualificou os inquisidores de ?bestas-feras?. E a CPI de ?picadeiro?.

Não é o primeiro caso. Um empresário que alugou equipamentos e mandou gravar uma tentativa de extorsão, depois de depor no Congresso, disse que nunca mais repetiria seu ato. Quis desmascarar os corruptos e corruptores e acabou sendo tratado como se fosse réu e não um colaborador da moralização no serviço público. O mesmo teria acontecido com o agente da Abin e, por isso, seu chefe fez declarações tão desastrosas em mensagem que circulou na rede interna de computadores (intranet) do órgão que dirigia.

É certo que as comissões de inquérito, inclusive e principalmente as CPIs que se instalam para investigar a interminável fila de escândalos em que se envolvem governo, PT, outras siglas, membros de outros partidos situacionistas e oposicionistas e parlamentares-religiosos transportadores de malas com óbulos para sua igreja, devem agir com rigor. Há, entretanto, de se distinguir suspeitos, indiciados ou mesmo condenados, de testemunhas. Estas são, ao deporem, colaboradores do poder público e fornecedoras de dados que podem auxiliar a defesa dos interesses do povo. Isso, até prova em contrário. Portanto, não podem ser tratadas com agressividade e desrespeito. Alguns parlamentares, ansiosos pela verdade ou porque querem aparecer como heróis diante da opinião pública, estão recebendo testemunhas com quatro pedras na mão.

Sob o ponto de vista político, a queda do diretor-geral da Abin significa mais uma defecção no governo Lula. E os que estão saindo nem sempre têm sido substituídos pelos melhores, ou seja, por gente honesta e também competente.

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