As transformações da família no Brasil

O Direito de Família vem passando por inúmeras e significativas transformações. A nova abordagem das relações familiares, com tons mais humanitários, é há muito trabalhada, porém seus resultados concretos ganharam força nos três ou quatro últimos anos.

As maiores inovações transformadoras se deram a partir de 2008 com a legislação que instituiu a guarda compartilhada. Através dela busca-se o bem estar dos filhos de casais separados. É uma forma de permitir que o não guardião da criança tenha acesso a seu filho de forma plena, participando ativamente de sua formação e acompanhando seu crescimento. A necessidade da criação de tal modalidade de guarda deveu-se ao fato de que o guardião da criança, não raro, impede que o não guardião e seu filho mantenham contato, privando-os do convívio.

Os dados mais recentes do IBGE indicam que em 87% dos casos de separação dos pais, as crianças permanecem sob a guarda da mãe. Assim, o não guardião é, na maior parte das vezes o pai, que involuntariamente mantém-se distante de seus filhos e faz com que os laços que os unem fiquem menos firmes.

Muitas mães, e falamos mães quando nos referimos às guardiãs por conta dos dados do IBGE, promovem o afastamento dos pais e filhos por serem portadoras da Síndrome da Alienação Parental (SAP). Isso significa que impedem ou dificultam o contato entre eles, de forma proposital, não com a intenção de impor danos às crianças ou adolescentes e, sim, aquele que um dia foi seu marido ou companheiro.

A alienação voluntária é percebida nos casos onde a mãe, movida por um sentimento de vingança, deseja punir o seu ex-marido por mágoas deixadas pela separação. Utiliza-se para isso de seus próprios filhos, as maiores vítimas que acabam por nutrir, muitas vezes de forma irreversível, sentimentos negativos em relação ao pai.

Faz parte do processo de alienação denegrir a imagem do pai, que passa a ser visto como pessoa não merecedora de sua confiança e amor. Cria-se no filho a falsa ideia que seu pai o despreza já que não o procura para manutenção dos vínculos. Chegam a ser definitivamente rompidos laços entre pais e filhos diante de grave conduta de alienação da guardiã. Pais acabam por desistir de seus filhos na medida em que tomam consciência que nada mais há a ser feito para resgatar o afeto de seus filhos frente a uma mãe alienadora.

As ações da alienadora chegam a ser tão contundentes que há tempos existem processos judiciais onde os filhos, já mais velhos, acionam seus pais buscando indenização por danos morais decorrentes de abandono afetivo.

Não são raros os casos onde há mãe denuncia o pai, sem qualquer fundamento, de abusar sexualmente de seus próprios filhos. Promove, assim, o ódio, sentimento este que acompanhará os filhos ao longo de sua vida, diante de tamanha gravidade. Os laços tornam-se irrecuperáveis.

Em decorrência da usual prática da alienação parental, em 2010 entrou em vigor legislação que trata de tal síndrome. A nova lei pune o alienante no intuito de preservar o bem estar da criança podendo haver, de acordo com a gravidade do caso, a inversão da guarda dos filhos. Note-se que a expressão “alienação parental” foi criado em 1985, por um psicólogo americano, mas só recentemente, de forma bastante tardia passou a ser utilizada no Brasil. A demora na criação da lei permitiu que muitas crianças fossem vítimas da síndrome da alienação parental da qual sua guardiã era portadora.

Ainda existe entre nós a idéia de que a mãe é um ser irrepreensível, quase sagrado, mantendo-se, ainda, o pai na condição de vilão. Temos entre nós, por uma questão cultural que até hoje permanece, a convicção errônea de que o pai é aquele que se separa da mãe de seus filhos, omisso e que usa de artifícios com o objetivo de não lhes pagar pensão alimentícia. Criou-se e mantém-se a distorcida imagem da mãe santificada e do pai vilão, não merecedor do amor de seus filhos. Trata-se de um preconceito que precisa ser combatido com rigor, cabendo ao Poder Judiciário promover e incentivar a guarda compartilhada, tratando com severidade os casos de alienação parental.

Também em 2010 foi decretado o fim do instituto da separação judicial, desobrigando o casal de se submeter a esse processo quando pretendem o divórcio. Para obtê-lo era necessário aguardar o prazo de um ano após a separação judicial ou dois anos após a separação de fato. Com a nova legislação em vigor o casal pode imediatamente buscar o divórcio estando, assim, aptos para novo casamento.

O conceito de família também sofreu profundas alterações, reconhecendo-se, hoje, inúmeras modalidades de núcleos familiares, caindo por terra o conceito tradicional que exigia a presença do pai, mãe e seus filhos. Os novos arranjos da sociedade exigem proteção do Estado. Tomamos como exemplo a família monoparental, largamente observada em nossa sociedade, constituída por um dos pais e seus filhos. Verificamos também como núcleos familiares o grupo formado apenas por irmãos sem a presença de seus pais.

A grande alteração, no entanto, se deu também em 2010, ao decidir o Supremo Tribunal Federal que é possível a união estável entre pessoas do mesmo sexo reconhecendo, assim, a existência da família homoafetiva.

Podemos assegurar que os últimos quatro anos foram marcantes para o Direito de Família. Isso atende aos anseios da população já que os flexíveis e constantes arranjos da sociedade têm que ser observados, reconhecidos e protegidos pelo Estado.

Sylvia Maria Mendonça do Amaral, especialista em Direito Homoafetivo, Família e Sucessões, sócia do escritório Mendonça do Amaral Advocacia e autora dos livros Histórias de Amor num País sem Leis e Manual Prático dos Direitos de Homossexuais e Transexuais – sylvia@smma.adv.br

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