Durval de Noronha Goyos Jr.
O Acordo sobre Medidas de Investimento Relacionadas ao Comércio, mais conhecido por Acordo Trims, acrônimo derivado da designação em língua inglesa, é um dos tratados a regular o regime jurídico da OMC (Organização Mundial do Comércio). Nele, os países desenvolvidos inseriram, para vedá-las, as medidas de apoio ao crescimento econômico usadas pelos países em desenvolvimento.
Assim, o Acordo Trims veda: a necessidade de participação de capital nacional em qualquer empreendimento; a necessidade de licenciamento a empresa local; as restrições quanto a remessas monetárias; as restrições quanto a câmbio de moedas; as restrições quanto a vendas domésticas; as obrigações quanto a conteúdo local; as obrigações quanto a necessidade de exportação; e os requisitos de substituição a importações.
Todavia, como lembro no meu livro ?A OMC e os tratados da rodada Uruguaia?, o subsídio à produção e à exportação, medida que distorce o comércio e promove a imoralidade, não foi elencado entre as práticas vedadas, quando disfarçado pelo manto da verba de pesquisa acadêmica, porque a prática é de interesse dos países desenvolvidos.
Essa prática é generalizada para diversos setores, como o aeronáutico e o farmacêutico. Nos Estados Unidos, por exemplo, a lei Bayh-Dole permitiu que universidades e pequenas empresas patenteassem descobertas decorrentes de pesquisas patrocinadas pelo governo federal daquele país, como lembra a pesquisadora americana, Márcia Angell, em livro recentemente publicado pela Record, ?A Verdade sobre os Laboratórios Farmacêuticos?.
Assim, as universidades repassam suas patentes para as grandes empresas americanas, por um valor muito inferior à colocação em mercado dos respectivos produtos. Da mesma forma, o custo do insucesso na pesquisa é arcado pelo governo dos EUA. Para se ter uma idéia da dimensão desse custo, mencione-se que apenas um dentre cinco mil candidatos a medicamento chega ao mercado, conforme citado pela mencionada pesquisadora.
Como decorrência dessa prática onerosa para os contribuintes e para os consumidores, os grandes laboratórios farmacêuticos reduziram substancialmente o desenvolvimento de pesquisas e alcançaram uma lucratividade sem paralelos no universo da atividade empresarial, mesmo que operem com direto impacto na saúde pública.
Outros países desenvolvidos também lançam mão dessa prática desleal e perniciosa, como o Canadá e a União Européia. Às vezes, os subsídios são fornecidos por unidades federadas, ao invés de pelo governo central, o que dificulta a sua identificação.
Durante as negociações da Rodada Doha da OMC, em que se declarou uma prioridade pelo desenvolvimento, ainda não se tratou de uma profunda alteração do Acordo TRIMs, que se faz tanto urgente como necessária, de maneira a eliminar as distorções permitidas pela formatação atual, bem como combater as injustiças por ela geradas.
Durval de Noronha Goyos Jr. é advogado admitido no Brasil, em Portugal e na Inglaterra e Gales. É árbitro do Brasil na OMC (Organização Mundial do Comércio) e professor de Direito do Comércio Internacional na pós-graduação da Universidade Cândido Mendes (RJ).