Maria Marlice, uma amazonense de 45 anos, anda inventando moda. Junto com outras quatro mulheres, ela exercita sua criatividade confeccionando caixas de papelão revestidas de tecidos e fitas, comercializadas nas Lojas ?Leve Curitiba? administradas pelo Instituto Pró-Cidadania de Curitiba (IPCC).
Tudo o que é arrecadado na venda destes e outros produtos nas lojas é revertido para a Assistência Social que o IPCC, em parceira com a Fundação de Ação Social (FAS), desenvolve junto às famílias que necessitam do apoio do município.
Ao mesmo tempo em que ajudam o IPCC a arrecadar recursos para atender famílias de baixa renda, Maria Marlice e suas amigas também são beneficiadas. Internas da Penitenciária Feminina do Paraná (PFP), localizada no município de Piraquara, elas participam de um programa social desenvolvido pela direção do presídio que prevê convênios com empresas interessadas em projetos de responsabilidade social.
A produção chega, por mês, a 600 caixas decoradas e que servem como porta-chá ou para guardar medicamentos, itens de costura e dezenas de outros objetos menores.
A própria Maria, há nove anos transitando por diversas prisões do Brasil, agora pode "desestressar, ter uma ocupação, descobrir um talento e ainda ajudar outras pessoas", afirma sorridente. Ela, que também está concluindo o ensino fundamental, é uma das 150 detentas beneficiadas por uma política pública de remissão de pena – a cada três dias trabalhados, um dia da pena é reduzido – e ainda há uma remuneração pela produção.
Iniciativa
A idéia de utilização dessa mão-de-obra partiu de Bárbara Grecco Sass e de Alba Guth, proprietárias da Box Home Caixas Artesanais, que encontraram apoio na diretora do PFP, Valderez Camargo da Silva. "Estamos disponíveis para as empresas que estejam interessadas em participar deste programa. Basta apresentar um projeto que vamos avaliar", adianta a diretora.
Bárbara, advogada recém formada, conhecia as potencialidades deste grupo social. "Elas são responsáveis, esforçadas e muito criativas", salienta a ?professora?".
"Muitas outras estão interessadas e a fila de espera por uma vaga está cada vez maior em função dos benefícios concretos que esta atividade promove junto às internas", destacou. Os delitos são os mais variados, sendo que neste grupo estão presas condenadas por tráfico, assalto a mão armada e homicídio. "É preciso bom comportamento e o compromisso com a produção para se integrar ao projeto", esclarece Bárbara.
Atualmente, a Penitenciária Feminina de Piraquara abriga 350 mulheres, 150 delas envolvidas diretamente com o programa de remissão, e prestando serviços para empresas privadas. A responsável pelo setor, Vera Lúcia, explica que todos os serviços internos são realizados pelas próprias internas, como alimentação, limpeza e manutenção dos uniformes e outros ajustes. "Algumas são bem esforçadas e inteligentes e demonstram grande habilidade. Outras preferem ficam nas celas. Quem não está trabalhando, está na cela", disse.
Liberdade
Vanessa, de 22 anos, dois filhos, é matogrossense e está prestes a deixar Piraquara. "Quando sair, vou procurar algo nesse ramo, pois descobri um talento que me distrai, faz passar o tempo e me dá um dinheirinho". Outra artesã, Elaine, comemora a possibilidade de sair em liberdade condicional daqui a oito meses: "Aqui estamos ajudando os dois lados. A nós mesmas e as outras pessoas", afirma.
Também prestes a conseguir liberdade, Ângela, 22 anos, quer voltar para Foz do Iguaçu e viver com os dois filhos e a mãe. "Agora sei que posso conseguir um sustento para mim e meus filhos", afirma a mulher que em cada caixa coloca a expectativa de uma oportunidade.
Para cada mulher que deixa de trabalhar como artesã, outras cinco estão à espera de uma vaga. "Às vezes, o desempenho delas é tão interessante para a empresa que elas são contratadas para quando deixam o presídio", informa Vera Lúcia.
?Leve Curitiba?
O Instituto Pró-Cidadania de Curitiba é uma organização não-governamental, parceira da FAS, na manutenção de programas sociais como o de Atendimento Familiar, que oferece auxílio para famílias que estão em situação de vulnerabilidade social. O IPCC atende pela demanda de alimentos, fraldas geriátrica e infantil, além do encaminhamento aos programas de geração de renda e capacitação profissional desenvolvidos pelo município.
Além de doações, o instituto mantém diversos programas de geração de recursos. Um deles é a rede de lojas ?Leve Curitiba?, que comercializa produtos que difundem os símbolos da cidade, divulgando Curitiba para os turistas que visitam a capital. São mais de 60 profissionais que têm sua produção à disposição dos visitantes em seis lojas: Parques Tanguá, Barigui e Jardim Botânico, Rua 24 horas, Aeroporto Internacional de São José dos Pinhais e Rodoferroviária.