José Luiz Ames
Vivemos organizados em coletividades. Esta forma de existência pode parecer óbvia, mas jamais para um filósofo. Este se pergunta: Que explicação podemos dar ao fato de vivermos organizados em coletividades em vez de existirmos isoladamente? Qual a finalidade desse tipo de vida coletiva? Aristóteles, filósofo grego do século IV a.C., na sua obra Política, traz uma explicação que se tornou clássica: ?O homem é por natureza um animal político?.
A explicação de Aristóteles aponta para o fato de haver na natureza humana uma tendência a viver em sociedade e que ao realizar esta inclinação o homem realiza o seu próprio bem. Quer dizer, se vivemos em sociedade é porque esta é a finalidade do ser humano. Isso é tão próprio do homem quanto é próprio da semente de pessegueiro tornar-se uma árvore e produzir pêssegos.
O fato de tender naturalmente à vida coletiva mostra que o homem é um ser carente. Carente de alguma coisa que o leve a desejar e carente de alguém que o leve a se associar. A carência aponta para a incompletude humana. O homem tem sempre necessidade de um outro semelhante a ele e tão imperfeito quanto ele. Ele se associa para alcançar uma vida perfeita e auto-suficiente. Um ser que não sentisse a necessidade de associar-se seria um deus ou um animal, diz Aristóteles. Os primeiros não fazem política porque são perfeitos. Os animais não fazem porque não pensam, nem falam.
O homem tende à vida em sociedade porque nela, e somente nela, se torna plenamente humano. Pode-se, portanto, dizer que a vida política é para o homem a melhor das vidas possíveis. Um homem vivendo em sociedade está no seu lugar na hierarquia dos seres. Não é nem deus nem animal, mas o melhor dos animais, porque capaz de justiça.
Fora da cidade, o homem é o pior dos animais, porque dispõe de faculdades intelectuais que constituem armas temíveis sem a educação para a justiça.
A lição que Aristóteles nos proporciona é de que viver coletivamente é a única chance de sermos humanos. Existir politicamente é viver solidariamente com outros seres semelhantes. O isolamento significa a destruição de nossa humanidade. Quanto mais interagimos tanto mais humanos nos tornamos.
A aspiração à felicidade conhece um único caminho: a vida em comunidade. Fora dela não apenas não há chance para uma vida plena, como simplesmente é impossível qualquer vida humana. Quem se fecha na vida privada da família, do clube, do trabalho, da igreja nega a si próprio a possibilidade de ser plenamente humano.
Essa lição de Aristóteles nos abre o caminho para outra: se nós somos seres naturalmente inclinados para a vida em sociedade e se esta vida é a melhor vida possível, então ninguém pode dispensar-se da tarefa de pensar a coletividade. Este assunto merece uma reflexão mais profunda.
* José Luiz Ames é doutor em Filosofia pela Unicamp e professor de Filosofia na Unioeste/ Campus de Toledo.