Ao acordar, na manhã desta quinta-feira, os fanáticos torcedores de futebol na Argentina necessitaram de uma dose dupla de alka-seltzer para digerir a dupla derrota sofrida no dia anterior. Primeiro, foi a seleção que perdeu o título da Copa das Confederações para o Brasil. E depois, o River Plate foi eliminado pelo São Paulo na Libertadores.
A solução para o indigesto fracasso foi a auto-ironia, ferramenta que os argentinos usam intensamente para diluir os efeitos de crises econômicas, políticas, além das esportivas.
O jornal "Olé" foi o primeiro a usar esse recurso. Na edição desta quinta-feira, os leitores ficaram surpresos ao ver que a capa estava em branco, sem manchete alguma. Apenas continha os dizeres: "Erro. 30/ 6/ 2005. Por motivos técnicos esta capa não pode ser impressa".
Dentro, o jornal deixou seu tradicional chauvinismo de lado para fazer um insólito reconhecimento à seleção do Brasil no título: "Parabéns".
No artigo, o colunista do "Olé" indica que os "fanáticos cegos pela camiseta argentina não deveriam ler o texto". Ali, o jornal afirma que "por um dia, ou por um momento, dá vontade de aplaudir o Brasil com mais inveja do que ódio pelo talento alheio".
O jornal "Clarín", o principal do país, indicou que o herói da jornada foi Adriano, "um animal da área, que sempre quer jogar contra a Argentina porque ele possui a fórmula para amargar-lhe a vida".
O "Clarín" também foi pródigo em elogios a Kaká e Ronaldinho Gaúcho. Segundo o jornal, "ficou claro que o potencial do Brasil é de outra categoria, que supera amplamente o bom material que a Argentina tem. Foi bom que a Argentina leve esse bofetada agora, quando ainda falta um ano para a Copa do Mundo, quando ainda existe tempo para a reconstrução. Há derrotas que proporcionam lições".
Para o tradicional e sóbrio "La Nación", a Argentina "levou uma surra". Segundo o centenário periódico, o Brasil investiu em "generosa criatividade e letal contundência".
Uma pesquisa realizada pelo jornal econômico "Infobae" entre os internautas perguntou "Quem foi o culpado do baile ontem perante o Brasil?". A pesquisa indicou que 59,19% dos internautas considera que "não há culpados, o Brasil é o melhor". Outros 26,31% acusaram o técnico José Pekerman da derrota. Para 14,5% dos pesquisados, os culpados são os jogadores.
Velório
Nesta quinta-feira, no River, o clima era de velório pela derrota para o São Paulo. Motivos não faltavam, já que além da surra da noite anterior, o time não conseguiu título algum desde o início deste ano.
Para complicar, as finanças não estão em seu melhor momento e, de quebra, existem profundas divergências políticas entre as lideranças do clube. Como se fosse pouco, no fim do ano o River terá eleições para definir a nova diretoria.
O técnico Leonadro Astrada fazia sua mea culpa: "Sou o máximo responsável pela derrota do River". Ele também definiu o jogo como um "fracasso" e reconheceu que o São Paulo "jogou melhor".
Tudo indicava que Astrada não renovará seu contrato em dezembro. E tampouco descarta-se que o técnico poderá se afastar do River antes do fim de ano.
Na manhã desta quinta-feira, os torcedores do River que conviviam com torcedores do Boca Juniors tiveram que suportar os mordazes comentários dos rivais.
Nos programas de TV, ao vivo, os apresentadores torcedores do River foram ironizados pelos câmeras, enquanto que no rádio, choviam sarcasmos disparados pelos colegas do estúdio.
"Foi um final triste, sem cores. Sem convicção, sem estímulo, sem entrega. Sem futebol. O River saiu pela porta dos fundos.
Ficou sem presente, ficou sem futuro, já que possivelmente tampouco jogue na próxima Copa Libertadores", disparou o "La Nación", que criticou o time por ter tido um desempenho "apático" durante todo este ano.
O erro, afirmou o jornal, foi o de achar que por ser o anfitrião, teria uma grande vantagem sobre o visitante. "E, da mesma forma que na Libertadores anterior, o River foi eliminado em seu próprio estádio".
Miguel Ángel Bertolotto, colunista esportivo do jornal "Clarín", foi categórico: "Quando a mente fica nublada, quando o desespero amarra as pernas, quando a ansiedade corta as idéias, quando os nervos pesam mais do que as intenções, não há nenhum milagre possível". Segundo ele, o River se despede da Libertadores sem glória.
A imprensa argentina também criticou as agressões realizadas por setores da torcida do River aos jogadores e torcedores do São Paulo.
Além das pedras jogadas contra os ônibus do time visitante antes do jogo, os torcedores, no fim da partida, jogaram pedras contra os cerca de 700 são-paulinos que estavam nas arquibancadas. A Polícia reprimiu os agressores com gás lacrimogênio e precisou até disparar tiros de borracha para cima.