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Nos últimos meses, um grande número de servidores públicos federais aposentados vem sendo surpreendido com a notícia de que suas aposentadorias, às vezes concedidas há mais de uma década pela Administração federal, estão tendo seu registro negado pelo Tribunal de Contas da União (TCU), o que impede que continuem sendo pagas tal como vinham sendo há anos.

Em alguns casos, as modificações atingem parcela substancial dos proventos; noutros, o TCU chega a determinar aos aposentados que retornem ao trabalho, por entender faltar-lhes tempo de serviço ou de contribuição.

Os motivos invocados pelo TCU para a negativa de registro – decisão que normalmente é tomada sem que sequer sejam ouvidos os ex-servidores afetados –, têm sido das mais diversas ordens, estando ligados ora ao não preenchimento dos requisitos legais para a aposentadoria, ora à ilegalidade de alguma verba incorporada aos proventos. Em face dessa situação, levando em conta especialmente o longo tempo havido entre a concessão da aposentadoria e a sua revisão pelo Tribunal de Contas da União, muitos servidores têm ingressado na Justiça com vistas a seguir recebendo seus proventos normalmente.

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Os fundamentos vão desde a decadência (extinção pelo decurso do prazo) do direito de a Administração rever o ato de aposentadoria, até a aplicação dos princípios da segurança jurídica e do devido processo legal, que obrigariam o TCU a, pelo menos, ouvir o servidor atingido antes de negar registro à aposentadoria.

Surpreendentemente, porém, o posicionamento do Supremo Tribunal Federal – e, conseqüentemente, de boa parte dos Tribunais – acerca dessas questões tem sido reiteradamente desfavorável aos ex-servidores. No que diz respeito à aplicação do prazo qüinqüenal de decadência, o STF vem entendendo que a aposentadoria seria um ato administrativo complexo, que não se completaria antes do registro pelo TCU. Por isso, até que ocorresse o registro, o prazo de decadência para a Administração rever o ato de aposentadoria sequer começaria a fluir.

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Já no tocante à aplicação do princípio do devido processo legal, o Supremo vem entendendo que, nesses processos de registro de aposentadoria não haveria mesmo necessidade de dar oportunidade de defesa ao servidor aposentado, uma vez que a discussão sobre a legalidade do ato concessório se estabeleceria exclusivamente entre o TCU e o órgão responsável pela concessão da aposentadoria.

Tal entendimento vem sendo recebido com consternação pela comunidade jurídica, abismada com o fato de a mais alta Corte de Justiça do País compactuar com a não observância do princípio da ampla defesa e, ainda, em total contrariedade ao princípio da segurança jurídica, aquiescer com a não imposição de qualquer limite temporal para que o TCU examine a validade dos atos concessórios de aposentadoria.

Causa surpresa, de fato, que a Corte Suprema prefira, ao invés de resolver a questão com base nos princípios constitucionais claramente aplicáveis, deixar a perigo a segurança alimentar de ex-servidores já idosos, que programaram suas vidas tendo em conta o padrão remuneratório que
a própria Administração lhes prometera e, que muitos anos depois, pretende repentinamente lhes suprimir.

Ainda há esperança de que esse posicionamento mude, pois não é resultado de pronunciamento definitivo pelo STF. Contudo, enquanto isso não ocorre, há um precedente do próprio Supremo que vem trazendo alguma esperança aos servidores, no sentido de resguardar que possam, ao menos, discutir administrativamente as decisões do TCU, quando passado longo tempo entre a concessão da aposentadoria e a negativa de registro.

Trata-se do julgamento do Mandado de Segurança nº 25.116, de que foi relator o Min. Carlos Britto, pelo qual foi anulado acórdão do TCU que negara o registro de aposentadoria a um professor. Nesse processo o STF reputou que, passados 5 anos e 8 meses entre a data da concessão da aposentadoria até a negativa de registro, o TCU, antes de poder alterar a forma de percepção da aposentadoria, deveria ter oportunizado ao aposentado o exercício do direito ao contraditório e à ampla defesa.

Se essa posição traz algum alento, porém, não resolve a questão, pois continua deixando em risco a segurança alimentar de servidores que confiaram no que lhes prometera a Administração e com base nisso fizeram seus projetos e assumiram suas obrigações.

Entendemos que, para acabar com esse terrível quadro, o ideal seria que o STF, usualmente tão apegado ao reconhecimento das garantias constitucionais, aplicasse diretamente a casos assim o princípio da segurança jurídica, que visa a proteger situações consolidadas pelo tempo, mesmo quando eivadas de alguma ilegalidade, a fim de resguardar a confiança dos administrados na correção da conduta do Estado, de cujos equívocos, nessa história toda, os servidores aposentados nada mais são do que vítimas.

Guilherme Follador
e Isabella Bittencourt Mader são advogados do escritório Assis Gonçalves, Kloss Neto Advogados Associados.