Depois de 14 anos de idas e vindas, a lei que protege o que resta da mata atlântica afinal entra em vigor. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva sancionou ontem (23), em uma cerimônia no Palácio do Planalto, o texto aprovado em 29 de novembro pelo Congresso, depois de mais de uma década de tramitação, dois arquivamentos e várias manobras que por pouco não a descaracterizaram totalmente.

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A área original da mata atlântica vai do Rio Grande do Sul ao Piauí, incluindo Minas Gerais, e abriga hoje 3.409 municípios. Da cobertura original de 1,1 milhão de quilômetros quadrados, hoje só restam 6,98% de área vegetal conservada, segundo a ONG SOS Mata Atlântica.

Desde 1992, quando o ex-deputado Fábio Feldmann (PV-SP) apresentou a proposta da lei, a cada ano a mata atlântica perdeu 100 mil hectares. ?A área do bioma da mata atlântica compreende 70% da população brasileira. São 120 milhões de pessoas cuja existência está intimamente ligada aos serviços ambientais providos pela mata atlântica?, disse a ministra do Meio Ambiente Marina Silva.

Prática

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Apesar de existir um decreto de proteção editado em 1993, que valia até a sanção da lei, o efeito na contenção do desmatamento foi pequeno. Apenas de 2000 para cá é que houve uma queda significativa na destruição da mata, com uma redução de 70% do ritmo. Apesar disso, alguns Estados, especialmente Santa Catarina e Paraná, não pararam com a destruição.

Apenas os catarinenses derrubaram 48 mil hectares, mais do que outros sete Estados do Sul e Sudeste juntos nesse período. ?O decreto já instituía o domínio amplo das áreas de mata atlântica mas não tinha força de lei. Alguns Estados, como o Paraná, não se sentiam obrigados a cumpri-lo, especialmente sobre as matas de araucárias, que não consideravam parte do bioma da mata atlântica?, diz Miriam Prochnow, coordenadora da rede de ONGs em Defesa da Mata Atlântica.

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A lei proíbe o desmatamento da área que resta de mata, incentiva a recuperação de locais hoje degradados e limita a exploração econômica a empreendimentos de desenvolvimento sustentável. Um fundo financeiro, que ainda precisa ser regulamentado, terá recursos federais para projetos de regeneração das áreas degradadas mas não totalmente desmatadas.

O texto ainda cria oportunidades para que fazendeiros que tenham descumprido o Código Florestal possam regularizar sua situação. A lei prevê a manutenção, em cada propriedade, de uma reserva de mata nativa de 20% da propriedade. Quem desmatou a mais poderá regularizar sua situação comprando terras ainda preservadas e doando-as para o poder público criar unidades de conservação. ?É um dispositivo muito importante, porque vai permitir a ampliação das áreas conservadas?, afirmou Miriam.

Caminho Longo

A lei da mata atlântica é a primeira a proteger um dos biomas definidos como patrimônio nacional pela Constituição. Os demais são a zona costeira, a Amazônia e o Pantanal – cerrado, caatinga e campos sulinos não têm tal status.

Sua aprovação não foi fácil. Por duas vezes a proposta foi arquivada. Foi reativada pela primeira vez em 1997, quando o então deputado Paulo Bornhausen (PFL-SC), na comissão de Minas e Energia da Câmara, transformou o texto de forma que, na prática, permitisse a derrubada do que restara. O projeto foi arquivado de novo e só recuperado em 2003, com apoio do governo Lula.

A data de sanção não foi escolhida aleatoriamente. Ontem fez 18 anos que o ambientalista Chico Mendes foi assassinado.