No campo econômico, e também no social, o Brasil não pode se conformar em andar. Precisa dar saltos, tal o atraso em que vive. Não há como dissociar um desses campos do outro. São interdependentes.
No que tange ao problema social, o ano que se finda parece um ano perdido. Perdido também no que se refere ao combate à corrupção. Dizemos isso, repetindo a palavra abalizada do presidente da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) e cardeal-arcebispo de Salvador, dom Geraldo Majella Agnelo. Ele afirmou achar que 2004 foi um ano perdido na ação social do governo e da sociedade e também que não observou avanços no combate à corrupção.
"Estou muito inclinado a ver que ainda é um ano perdido. Contudo, não quero culpar unicamente o governo, mas também os setores que procuram influenciar o governo a não fazer, e não se preocupar", disse ele, em Salvador, quando fez um balanço do ano que se finda.
Para o cardeal-arcebispo, há setores que não querem o crescimento e o desenvolvimento do Brasil. E isso se daria "com uma boa educação e trabalho para todos e não com esmola".
Aí, parece que ele critica o Fome Zero. "Não vou dizer que é um paliativo, mas tenho medo que as pessoas achem que se resolva o problema dando esmola desse jeito." Acrescentaríamos que é mais de se temer que governo e sociedade entendam que as prementes necessidades sociais estão sendo assistidas porque existe esse e outros programas benemerentes, governamentais ou da sociedade, contabilizando como vitórias números que, isoladamente divulgados, parecem substanciais, mas que diante das necessidades brasileiras são ínfimos e estão longe de significar aproximação de uma situação de justiça social.
Hoje se faz no Brasil uma ruidosa e intensa campanha publicitária anunciando vitórias. E elas existem, sejam no campo econômico, como no social e até no político. Só que, diante da imensidão dos problemas, são um grão de areia num imenso deserto. A propaganda é maior que a ação e os problemas, maiores que ambas.
Indagado a respeito da queda dos níveis de corrupção no Brasil este ano, ele respondeu: "Ainda não", acrescentando: "Estamos preocupados com isso há muitos anos e surgiu até a lei de combate à corrupção eleitoral". Mas aduziu que, ao invés de criarem outros mecanismos nesse campo para coibir o roubo, observou-se uma tentativa de mudar a lei anticorrupção. "Houve várias tentativas de esvaziá-la e ainda há." O prelado estava se referindo às protelações na CPI do Banestado, à blindagem do presidente do Banco Central, dando-lhe título e foro privilegiado de ministro, e os movimentos visando retirar do rol de crimes mais graves muitos dos ilícitos que reclamam maior rigor da lei penal. Sobre a legislação anticorrupção, disse o prelado que "houve várias tentativas de esvaziá-la e ainda há".
Dom Geraldo levanta ainda uma séria dúvida sobre os resultados de pesquisa recentíssima do IBGE que constatou a obesidade como um problema maior, no Brasil, que a desnutrição.
Ele teme que a pesquisa não corresponda à realidade ou que esteja sendo usada, através de intensa propaganda governamental, como instrumento para dar a impressão de que inexiste ou é pequeno o problema da desnutrição, quando ele pode ser constatado em qualquer cidade brasileira, em qualquer favela, em qualquer lugar dentro do território nacional. Só não vê quem não quer, pois até cegos constatam essa vergonha.