Por resolução da Assembléia Geral da Organização das Nações Unidas reunida em 1997, o ano de 2011 foi designado “Ano Internacional do Voluntário”, com a finalidade de reconhecer e disseminar a prática do trabalho voluntário definido pela Organização das Nações Unidas como aquele “exercido pelo jovem ou adulto que, munido de interesse social e espírito cívico dedica parte de seu tempo sem remuneração alguma a diversas formas de atividades organizadas ou não, de bem estar social ou outros campos.”
O voluntariado fez-se presente ao longo da história brasileira desde o século XVI, com a fundação da Santa Casa de Misericórdia em Santos inspirada nas Casas de Misericórdia portuguesas, estas, por sua vez, fruto da doação de propriedades ou de dinheiro de homens ricos e damas da sociedade e destinada aos pobres. Desta época até meados dos anos 70 a atividade voluntária era praticada com viés meramente assistencialista. A partir da redemocratização do país em 1984 e com a promulgação da Constituição de 1988, cidadãos começam a participar e atuar dentro de organizações da sociedade civil buscando intervir em problemas sociais. A motivação para o agir voluntário passa a ser indignação contra a miséria, contra as más condições de saúde e educação, contra a insegurança pública, temas anteriormente discutidos em nível político. A política era o lugar que se julgava ideal para resolver estes problemas: o Estado seria capaz de resolver todos os problemas sociais. Com o fim do Império Soviético em 1991e a falência do estado do bem estar social, este caminho caiu por terra; os militantes políticos de outrora passam a atuar voluntariamente assumindo novos ideais: a preservação do meio ambiente, de a defesa do consumidor, a transparência política, o fim da corrupção além daqueles já citados anteriormente. É busca da transformação social através do trabalho voluntário.
O Programa Voluntários surgiu em âmbito nacional a partir do programa Comunidade Solidária (1995-2002), buscando valorizar o trabalho voluntário como expressão de uma ética de solidariedade e participação cidadã. Ao promulgar a Lei nº 9608 de 18 de fevereiro de 1998, também conhecida como Lei do Voluntariado, o Estado brasileiro reconheceu e valorizou o trabalho voluntário na busca pelo interesse público e pelo bem comum. Esta lei define o que é o trabalho voluntário como sendo aquele prestado gratuitamente por pessoa física a entidade pública ou privada sem fins lucrativos.
O trabalho voluntário não gera vínculo empregatício, nem obrigação de natureza trabalhista, previdenciária ou afim. Para tanto, deve ser assinado entre a entidade e o prestador do serviço voluntário um Termo de Adesão, donde deverá constar a identificação tanto da entidade como do voluntário, o tipo de atividade a ser desenvolvida e o(s) dia(s) e horário desta atividade. Este documento é de extrema importância tanto para que se afaste a possibilidade do vínculo trabalhista, como para que o prestador do serviço voluntário tenha sua atividade reconhecida inclusive para fins de currículo. As despesas efetuadas pelo prestador de serviço voluntário poderão ser ressarcidas, desde que previamente acordadas e que de fato ocorram no desempenho da atividade voluntária.
Antes de procurar um trabalho voluntário, é preciso refletir sobre as várias as áreas de atuação: saúde, educação, meio ambiente, cultura, esporte, segurança pública, cidadania, para daí escolher a entidade, devendo esta localizar-se, preferencialmente em local próximo ao seu trabalho ou residência. Feita a escolha sobre a área de atuação, é preciso visitar a instituição não apenas para conhecê-la fisicamente, mas também para entrevistar-se com o Coordenador de Voluntários que deverá prestar esclarecimentos sobre o trabalho a ser desenvolvido. É, ainda, de bom alvitre que o candidato a voluntário pesquise a respeito da entidade na qual desenvolverá seu trabalho voluntário, se é regularmente constituída, quais os valores que norteiam o seu dia a dia. Aqui cabe pontuar que não existe possibilidade de a entidade pretender existir apenas com base no trabalho voluntário: aquela que assim proceder, está desvirtuando a finalidade deste e pois, sujeita ao rigores da fiscalização do Ministério do Trabalho.
Algumas empresas instalam Programas de Voluntariado Empresarial, as vezes, com o intuito de aprimorar o ambiente organizacional interno. Consiste tal Programa no apoio formal e organizado da empresa a colaboradores e aposentados que desejem servir uma comunidade com seu tempo e habilidades. Este apoio pode se dar de inúmeras maneiras: dando visibilidade ao tema do trabalho voluntário, permitindo que o colaborador exerça sua atividade voluntária durante o horário de expediente, convidando entidades que queiram receber voluntários para se apresentarem aos colaboradores, entre outros. Aqui, o Termo de Adesão também será assinado entre a entidade e a trabalhador voluntário. Entretanto, não se deve permitir que um Programa de Voluntariado Empresarial se transforme em estratégia de marketing sob pena de fracasso.
É imperioso ressaltar, mais uma vez, que o Trabalho Voluntário não se presta a substituição de mão de obra remunerada, nem muito menos substitui a ação do Estado. Por fim, cito as palavras do professor Oscar Garcia proferidas em palestra há dez anos: “… o voluntariado nasce da nossa necessidade de trocar o que cada um de nós tem de melhor com o que os outros têm de melhor a oferecer. Nós temos saúde, educação, recursos, contatos, aptidões, talento e consciência. A comunidade tem sonhos, desvantagens estruturais e uma imensa necessidade de acreditar nos seus sonhos, de colocá-los em prática. Nossa fortuna fácil e gratificante está em descobrir que nossos talentos traem um benefício concreto para a vida de outras pessoas”.
Maria Valéria Russo Schmidt é Membro da Comissão de Direito do Terceiro Setor da OAB/PR. Especialista em Direito do Terceiro Setor. Presidente do Conselho Diretor da Cultura Inglesa. Advogada.