Há poucos dias, comentando os movimentos políticos havidos em Cuba com a sucessão de Fidel, assunção ao poder de seu irmão Raúl Castro e o surgimento de expectativas de mudanças que significariam abertura democrática, dissemos que tudo poderia ser minimizado. Bastaria lembrar que a ilha caribenha, um dos últimos bastiões do comunismo no mundo, tem um PIB insignificante, população menor que a capital paulista e bem poderia ser ignorada, pois pouco significaria em termos de ameaça ao mundo ocidental.
Fizemos, entretanto, uma ressalva. Lembramos que sob o patrocínio do presidente venezuelano Hugo Chávez há um movimento objetivando criar na América do Sul um bloco de países de esquerda independentes da influência norte-americana e da comunidade européia. E que esse movimento, que vem atraindo Bolívia, Argentina, Equador, Peru e até certo ponto o Brasil, dava densidade aos eventos que ocorrem em Cuba e os torna preocupantes.
Não demorou muito para que fatos reais, palpáveis, viessem a comprovar nossas preocupações. A Organização dos Estados Americanos está reunida para encontrar uma saída para a crise surgida entre a Colômbia e o Equador, não faltando no episódio a Venezuela, que se apresenta como partícipe de larga importância e não como Pilatos no credo.
Como se sabe, tropas colombianas atacaram guerrilheiros das Farc em território equatoriano, matando Raúl Reyes, segundo homem da guerrilha de esquerda que há mais de quarenta anos luta contra o poder central da Colômbia. As forças guerrilheiras de esquerda, nos últimos anos aliaram-se ao narcotráfico, que as sustenta e delas recebe proteção.
O Equador não aceitou a invasão do seu território e ainda declarou que o ataque frustrou a libertação de reféns das Farc, negociação que vinha sendo feita por Raúl Reyes. A Colômbia, escudada em documentos que apreendeu com as forças terroristas, busca provar que elas vêm sendo apoiadas, inclusive financeiramente, pela Venezuela, ou melhor, por Hugo Chávez, seu presidente. E anuncia que vai denunciar tudo à Corte Internacional de Justiça.
Forças equatorianas e venezuelanas ocuparam as fronteiras com a Colômbia, cujo governo tem sido relativamente cauteloso ao não deslocar tropas para a região e insistir numa solução nos tribunais ou mediante mediação da OEA ou de algum país. O Brasil não está descartado.
A posição do governo brasileiro tem sido cautelosa. Lula e seu ministro das Relações Exteriores insistem em que a Colômbia peça, segunda vez e com clareza, desculpas ao Equador pela invasão de seu território. E que, de qualquer forma, o impasse seja solucionado pacificamente, sem o uso de armas, risco que reconhecidamente existe.
Interessa-nos, como sul-americanos, todos estes acontecimentos, mas em especial a posição brasileira. E no que toca à intervenção do nosso país, a intenção é a busca de uma solução negociada e, de qualquer forma, evitando o conflito armado.
Os eventos não terminaram e parece estarem ainda distantes de uma solução. O Brasil surge como um mediador ideal porque mantém boas relações com todas as partes envolvidas. Os acontecimentos, demasiado perigosos, demonstram à saciedade que há na América do Sul uma figura sinistra, o presidente venezuelano Hugo Chávez, disposto a usar de todos os meios, inclusive os recursos que aufere do petróleo, para conturbar a vida da região. E nos ensinam que o melhor caminho para a nossa diplomacia é a eqüidistância. Não há porque estimularmos uma guerra ridícula na América Latina. Nem razões para tomarmos posição a favor de um ou outro lado. O nosso lado tem de ser o da paz.