Os alunos municipais de Curitiba estão colaborando para acabar com o analfabetismo na cidade. Por meio de um questionário, elaborado pela Secretaria Municipal da Educação, crianças, jovens e adultos que freqüentam as escolas do município estão ajudando a identificar quem são e onde estão os 3,4% dos homens e mulheres de Curitiba que não sabem ler e escrever. O levantamento será útil para definir a abertura de novas turmas de educação de jovens e adultos, nas escolas municipais.

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Alunos de todas as 167 escolas municipais já receberam o questionário e foram orientados a preenchê-lo com o auxílio dos pais. A ação faz parte do projeto "Ler é um Direito", desenvolvido pela Secretaria Municipal de Educação para levar para dentro das salas de aula pessoas que não tiveram a oportunidade de escolarização.

Os questionários foram entregues há pouco mais de um mês e os resultados já começaram a aparecer. Na Escola Municipal Professor Dario Persiano de Castro Vellozo, na CIC, a pesquisa serviu de incentivo para os alunos da Educação de Jovens e Adultos (EJA). Mais do que fornecer informações sobre pessoas que precisam de escolarização, o projeto serviu para que os alunos incentivassem seus conhecidos a freqüentar as aulas.

O operador de máquinas Aloísio dos Santos estava na segunda semana de aula quando o questionário foi parar em suas mãos. Aos 46 anos, o homem de mãos habilidosas para o trabalho braçal precisou vencer o cansaço e a vergonha para aprender a desenhar letras, formar palavras, reconhecer os números. Motivado pelas conquistas que vinha fazendo durante as aulas, Aloísio não pensou duas vezes antes de preencher o nome do cunhado no questionário que levou para casa.

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"Com estudo a gente consegue serviço mais leve e as chances de crescer na vida são muito maiores. Se a oportunidade está perto de casa nós não podemos deixá-la passar", disse Aloísio, explicando porque fez questão de não só indicar o cunhado como levá-lo para a sua sala de aula.

"Foi emocionante ver o Aloísio chegando com o questionário nas mãos e o cunhado ao lado, pronto para iniciar os estudos", disse a professora do EJA, Lourdes Fonseca Pereira. A professora, uma grande incentivadora do projeto, é responsável por uma das duas turmas de alfabetização de jovens e adultos que a escola oferece no período da noite.

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Para o novo aluno, o convite era o que faltava para retomar os estudos que havia interrompido quando criança, antes mesmo de concluir as primeiras séries do ensino fundamental. O motorista José Pereira da Silva, de 41 anos, motivado pelo cunhado, tornou-se um dos primeiros alunos a iniciar a iniciar os estudos por meio do projeto Ler é um Direito.

Orgulhoso por ter conseguido fazer os quatro filhos estudarem, José disse ter sofrido muito por falta de estudo. "Logo que Aloísio me chamou para estudar fiquei irritado por ele propor estudo nesta fase da vida. Depois pensei no que já passei e no quanto poderei melhorar de vida sabendo ler ao invés de ter que decorar letras e placas", disse o motorista.

Mudar de vida e conseguir novo trabalho é o desejo comum entre os adultos que buscam os bancos escolares. Sueli Terezinha Assumpção está desempregada há mais de um ano. Com 39 anos de idade e dois filhos para criar, acredita ser por falta de estudo que as oportunidades não aparecem para ela.

"Parei de estudar criança porque não conseguia passar de ano. Cresci achando que o tempo da escola já havia passado para mim", conta Sueli. Com menos de um mês de aula, Sueli já se destaca na turma, e seu desempenho está sendo utilizado como exemplo na hora de convencer as amigas a iniciarem o estudo. "Descobri que nunca é tarde e que, mesmo adulta, vou conseguir aprender", completou.

Zerar o analfabetismo

Para a secretária municipal da Educação, Eleonora Bonato Fruet, a participação de alunos e da comunidade é fundamental para a identificação e localização das pessoas que precisam ser alfabetizadas. "Só assim conseguiremos vencer o desafio de zerar o analfabetismo e isto significa melhorar as condições de vida de 40 mil pessoas que vivem nesta cidade", disse Eleonora.

Atualmente, 117 escolas do município oferecem o curso de Educação de Jovens e Adultos (EJA) para quase oito mil alunos, em 313 turmas. O esforço para acabar com a exclusão dos que não sabem ler e escrever conta com a colaboração de uma rede de voluntários. São dezenas de alfabetizadores que ocupam espaços cedidos por escolas, igrejas, unidades de saúde e clubes de serviços para ajudar, por meio das letras e dos números, a melhorar a vida de outros 1.327 alunos.

Depois que o levantamento for concluído, a Secretaria Municipal da Educação organizará listas com os nomes das pessoas, por faixa etária e regiões onde se concentram. Os dados servirão para a Prefeitura atender as pessoas nos locais próximos de suas casas e em horários adequados ao ritmo de vida que elas levam.

Outra medida para atrair a participação de novos alunos é o investimento na capacitação dos professores que atuarão com os adultos. A preocupação em tornar agradável a educação dos adultos se deve ao fato do grupo de pessoas com 50 anos ou mais representarem 9,4% dos analfabetos da cidade, segundo dados divulgados em 2000 pelo IBGE. Os números também são expressivos entre a população na faixa dos 40 aos 49 anos. A porcentagem é de 3,1%.

Entre os que procuram vencer o desafio das letras e dos números, são as mulheres as mais dispostas em aprender. Entre os 318 alunos que freqüentam os cursos oferecidos por voluntários nas igrejas, 300 são mulheres.

Nas escolas também são as mulheres as mais dispostas a aprender. A maioria das salas de aula é freqüentada por mães que precisaram deixar de lado os estudos para criar os filhos. "Quero aprender a ler para entender as cartas. Não pude estudar quando era nova porque meus pais achavam que escola não era lugar para mulher. Depois de casada a vida era cuidar da casa e da família", disse a dona de casa Maria de Lourdes de Freitas.

Aos 57 anos de idade, Maria de Lourdes vai para a escola acompanhada do neto Alisson de Freitas, de 9 anos. O menino é aluno da 5ª série de uma escola vizinha a que vó estuda. "Venho trazer a vó para não deixar que ela desanime", disse o menino que, em casa, é quem ajuda Maria de Lourdes a estudar.