Frederico Eduardo Z. Glitz

Alimentos, consumidor e informação

Recentemente a Agência nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) editou resolução (de n.º 24/2010 de 15/06/2010) por meio da qual visaria “assegurar informações indisponíveis à preservação da saúde de todos aqueles expostos à oferta, propaganda, publicidade, informação e outras práticas correlatas cujo objetivo seja a divulgação e a promoção comercial dos alimentos” (art. 2.º).

Isto é, em termos mais simples, haveria a exigência de que a publicidade em torno de produtos alimentícios disponibilizasse maiores informações ao consumidor (teor de açúcares e gorduras saturadas, por exemplo). A meta da regulamentação seria a proteção do público infantil e do consumidor.

O teor da Resolução enfatiza, ainda, que a informação deveria ser prestada de forma “adequada, ostensiva, correta, clara, precisa e em língua portuguesa” (art. 5.º) e de forma a se destacar o caráter promocional da publicidade (art. 6.º).

Entretanto, instada por pedido do Conselho Nacional de Autoregulamentação Publicitária (Conar), a Advocacia Geral da União (AGU) emitiu parecer recomendando a suspensão da aplicação da referida Resolução. O argumento: trata-se de matéria a ser regida por lei federal.
De fato, o parecer da AGU é adequado, ainda mais quando já existe tal lei: o Código de Defesa do Consumidor (Lei n.º 8.078/1990).

Especialmente quando ele consagra o dever de informação como princípio das relações de consumo (art. 4.º, IV) e como direito básico do consumidor (art. 6.º, III).

Quanto a este último aspecto, aliás, o direito à informação é amplo o suficiente para abranger as especificidades da composição química e orgânica dos alimentos comercializados, seja os teores de sódio, gorduras e açúcares ou mesmo se há, ou não, a presença de organismos geneticamente alterados (“transgênicos”).

Esse dever, ademais, não decorre “apenas” da necessidade de informação, mas igualmente das exigências postas pelo próprio CDC no que concerne à publicidade. Isto é, o fornecedor tem o dever de manter (e disponibilizar) dados técnicos e científicos que sustentem a publicidade que veicular (art. 36, parágrafo único), sendo considerada publicidade enganosa em caso de omissão (art. 37,§§1.º e 3.º).

As demais exigências previstas pela Resolução também encontram fundamento no CDC que prevê a necessidade de informação clara, ostensiva e correta (arts. 30 e 31), a responsabilidade do fornecedor pela qualidade do produto em razão de proteção da saúde e segurança (art. 8.º) e a exigência de que se possa, facilmente, perceber o caráter promocional da publicidade (art. 36).

Percebe-se, pois, que passados quase vinte anos da edição do Código de Defesa do Consumidor, ainda não se reconhecem plenamente as obrigações lá previstas. Embora se possa reconhecer mérito na iniciativa da Anvisa (e mesmo de outras tentativas recentes), bastaria a efetiva aplicação da legislação de consumo, já em vigor, para que se alcançassem os mesmos efeitos.

Esta, por exemplo, foi a recente conclusão a que chegou a Comissão de Defesa do Consumidor da Câmara dos Deputados quando rejeitou projeto que previa a exigência de que as informações referentes à quantidade e ao conteúdo dos produtos fossem divulgadas nas embalagens em caracteres maiores do que os utilizados para inscrição da marca.

Em matéria de proteção do consumidor, portanto, nem sempre quantidade é melhor que qualidade. Neste caso mais vale a efetiva aplicação do CDC, que a possibilidade de edição de promissoras regulamentações.

Frederico Glitz é advogado, mestre e doutorando em Direito Contratual das Relações Sociais, professor de Direito das Obrigações, Direito dos Contratos e Direito Internacional Privado da Faculdade de Direito das Faculdades Integradas do Brasil (Unibrasil). fglitz@gmail.com

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