Em estilo jocoso, Machado de Assis escreveu um romance intitulado O alienista. Profissão hoje muito requisitada e português esquecido, alienista, que vem do latim, uma língua chamada de morta, seria o psiquiatra de hoje. O alienista de Machado começou a observar que na cidade onde morava tinha muita gente com comportamentos por ele considerados anormais. Não teve dúvida: foi internando um a um no hospício. Cada dia aparecia mais uma exceção ao que seria a regra da normalidade. E mais gente ia para o hospício. O hospital foi inchando como as nossas superlotadas penitenciárias e, a certa altura, o alienista viu que já não tinha mais ninguém solto. Todo mundo já estava internado. Só ele permanecia solto.
Seria alienista o único são, com a cabeça no lugar? Pensou bem e acabou descobrindo que poderia estar havendo um equívoco. Talvez um equívoco estatístico. Que tal se todos eram normais à sua maneira e louco era ele próprio. Acabou tendo uma crise de honestidade e soltou todo mundo. Depois, trancou-se no hospício e jogou a chave pela janela.
A história vem à mente diante dos fatos que hoje ocorrem no Brasil. A Polícia Federal todos os dias prende carradas de gente. É a turma da máfia dos sanguessugas, dos desvios de dinheiro dos Correios, das maracutaias no projeto de inclusão social, das negociatas com terras e madeira, de assaltos a bancos. Enfim, não tem fim. Não fosse a frouxidão das nossas leis, a essas alturas restaria livre um alienista e uma parcela pequena da nossa sociedade. Seria o nosso presidente e candidato a bis o alienista e aquela multidão de presos, flagrada pondo a mão no jarro, os alienados?
Afinal de contas, a tese, por mais absurda que pareça, encontra algum respaldo na realidade. Lula costuma dizer que ele de nada sabia. Era, nessa versão, não o alienista, mas o alienado.
Não sejamos tão pessimistas acreditando que na realidade brasileira de hoje se repete a engraçada história do romance de Machado de Assis. É certo que se a gente pegar, como Diógenes, uma lanterna e sair por aí, é capaz de encontrar muitos honestos. Aliás, a maioria esmagadora dos brasileiros. A bandidagem é exceção, felizmente, senão estaríamos perdidos. Na dúvida, deve-se raciocinar em favor do réu, manda o Direito Romano do qual herdamos as virtudes e não poucos defeitos. Lula, que está sendo julgado pelo eleitorado, é réu. E, na dúvida, absolva-se o presidente Lula.
A solução estaria nas eleições, mas uma parte ponderável do eleitorado está alienada. Não louca, mas enganada, e é capaz de eleger alienistas-alienados. Ou alienados metidos a alienistas.