Este governo e os que o antecederam toleraram a agiotagem. E reservaram como vítimas exatamente as pessoas mais pobres, aquelas que não têm condições cadastrais para levantar em bancos organizados os recursos de que precisam. Verdade que também nestes os juros lembram agiotagem. Passando pelas ruas das grandes cidades, os cidadãos, em especial os de aparência mais humilde, são abordados com papeletas de propaganda desta ou daquela financeira. E elas não são poucas. Existem às dezenas.
As ofertas são tentadoras. Empréstimos na hora ou em menos de vinte e quatro horas. Dispensam-se avalistas, comprovação de renda e o que mais seria indispensável em qualquer transação séria com dinheiro. Na área central de Curitiba há uma financeira depois da outra e inocentes aceitam o gentil convite de pegar dinheiro a longo prazo, com prestações módicas e sem a necessidade, em geral irrealizável, de apresentar fiança e cadastro. Empresta-se até pelo telefone. Trata-se de um negócio que deveria ser proibido ou, pelo menos, severamente fiscalizado, pois é agiotagem oficializada.
A dispensa de garantias justifica-se pelo fato de que os juros que cobra são tão altos que, se um percentual de mutuários deixar de pagar, o dinheiro nem faz falta. A maioria das financeiras nem sequer se dá ao trabalho de ingressar na Justiça para receber o dinheiro que emprestou, pois a sua rentabilidade no bolo de negócios é tão grande que nulifica os efeitos dos calotes. No mais, as classes mais humildes costumam ser melhor pagadoras que as mais abastadas.
O pobre mutuário entra numa dessas lojas porque ganha pouco, não tem dinheiro muitas vezes para necessidades essenciais ou dele precisa para pagar outra dívida vencida e não quitada. O que lhe esclarecem é o valor das prestações. Estas são baixas, porque estendidas em longuíssimos prazos.
O raciocínio do cliente, que quase sempre não entende as complicações do mercado financeiro, é que, se dá para pagar a prestação, é um bom negócio. Bom negócio é, sim, para os donos das financeiras, pois os juros são tão altos que, diante deles, os cobrados pelos grandes bancos até parecem benemerência.
Ser pobre não é prêmio. Pobre e explorado, nos parece um crime. E o governo nada fazer, uma omissão indesculpável, numa época em que já temos um código de defesa do consumidor. Quando saiu a Constituição de 1988, chegou-se a nela incluir juros máximos de 12% ao ano. Um sonho impossível. Tentou-se argumentar que, acima desse percentual, seria agiotagem. O mercado financeiro tem desmentido. Mas juros elevadíssimos como o da agiotagem financeira que hoje se pratica, isto sim é explorar a camada mais pobre da sociedade e merece de nossos governantes alguma providência.
A idéia do cliente de que pagar, a perder de vista, prestações que cabem no seu modesto orçamento é aceitável é um grande equívoco. O dinheiro tem um preço e deve ser preço justo. Muito acima desse preço justo é achacar de quem não tem e mais precisa.
De outro lado, se compararmos os juros cobrados por essas ditas financeiras, verdadeiras arapucas, com os juros considerados extorsivos dos bancos, acabaremos concedendo indulgências aos banqueiros. Eles emprestam a juros elevados, mas muito longe da exploração que se pratica contra as famílias de baixa renda.