A anulação de 63 mil voos entre a quinta-feira e o domingo, o prejuízo estimado em US$ 200 milhões por dia e a insatisfação de 6,8 milhões de passageiros afetados reduziram com a paciência das maiores companhias aéreas da Europa ontem. Depois de realizarem voos de teste na França, Alemanha, Inglaterra e Holanda, as empresas passaram a defender a reabertura, ao menos parcial, dos aeroportos. Pressionados, ministros de Transporte dos 27 países se reúnem amanhã, por teleconferência, para decidir pela retomada de até 50% voos.
O final de semana marcou uma clara mudança de postura das companhias aéreas em relação ao suposto perigo representado pela nuvem de cinzas expelida pelo vulcão Eyjafjallajokull, na Islândia, desde a noite de quarta-feira. Até a noite de hoje, 96 horas depois dos primeiros distúrbios, 30 países haviam fechado total ou parcialmente seus espaços aéreos, entre os quais Grã-Bretanha, França, Alemanha e Holanda, onde se situam os maiores entroncamentos aéreos da Europa.
Insatisfeitas com a cascata de cancelamentos de voos – 8 mil no primeiro dia, contra 19 mil de hoje – e com o caos nos aeroportos, as principais companhias aéreas deram início à uma discreta ofensiva política pela liberação progressiva do espaço aéreo. Pela manhã, Air France, na França, Lufthansa, na Alemanha, KLM, na Holanda, e British Air, na Grã-Bretanha, realizaram voos nacionais, sem passageiros, nos quais testaram a resistência dos componentes mecânicos e eletrônicos das aeronaves, quando em contato com as partículas de cinzas abrasivas. O resultado impulsionou as empresas à reação contra as autoridades políticas de Bruxelas.
Em nota oficial, representantes da Associação Europeia de Companhias Aéreas (AEA) e do Conselho Internacional dos Aeroportos (ACI), órgão que reúne operadores aeroportuários, pediram a imediata liberação do tráfego. “Voos de verificação realizados por diversas de nossas companhias não indicaram nenhuma irregularidade. Isso confirma nosso pedido de que outras opções sejam postas em prática para avaliar o risco genuíno”, afirmou Ulrich Schulte-Strathaus, secretário-geral da AEA. “Empresas aéreas devem ser autorizadas a voar onde é seguro. É o que nossos passageiros estão nos pedindo.”
Olivier Janovec, diretor-geral da ACI Europa, apelou para o argumento econômico ao defender a liberação do espaço aéreo. “Com 313 aeroportos paralisados até o momento, o impacto já é maior do que o 11 de Setembro”, argumentou, valendo-se do mesmo diagnóstico feito pela Organização da Aviação Civil Internacional (OACI). “Ainda que a segurança continue sendo uma prioridade não-negociável, ela não é incompatível com o nosso legítimo pedido de que as restrições sejam reconsideradas.”
Postas contra a parede, algumas autoridades de aviação civil da União Europeia já tiravam o corpo fora da linha de tiro das companhias. Por meio de seu twitter oficial, a Eurocontrol, entidade que reúne em Bruxelas os escritórios nacionais de controle do tráfego da Europa, afirmou que “nós não tomamos as decisões de abrir ou fechar o espaço aéreo”. O órgão alega se basear em projeções meteorológicas e dados científicos para amparar suas recomendações.
Também provocados a reagir, os ministros de Transportes da UE realizarão uma reunião extraordinária na tarde de amanhã para “discutir os problemas causados pela nuvem de cinzas”. Hoje mesmo, entretanto, algumas autoridades já recuavam. “Segundo as previsões meteorológicas, a metade dos voos previstos na Europa poderia ser afetada amanhã”, afirmou Diego Lopez Garrido, secretário de Relações Exteriores da Espanha – país que exerce a presidência rotativa da UE. A disposição engendra uma contradição: enquanto a atividade do vulcão aumenta, o número de voos saltaria de 20,9% do total, no domingo, para 50%, na segunda.
Os governos também anunciaram as medidas para mitigar os efeitos da paralisação. Na França, uma linha imaginária foi traçada entre as cidades de Nice e Bordeaux, no sul do país. Nove aeroportos civis e cinco militares situados abaixo do limite serão abertos. No início da noite, a Air France confirmou o voo AF 4176, realizando em caráter excepcional o trajeto Toulouse-São Paulo, às 23h59 de hoje. Para tanto, os passageiros terão de deixar Paris às 7h da manhã de hoje, em ônibus, em um percurso de mais de seis horas de duração.
Enterro de presidente polonês
Em razão do risco causado pela nuvem de cinzas, quatro dos chefes de Estado e de governo mais esperados na Polônia para o funeral do presidente Lech Kaczinski, morto em um acidente aéreo no sábado, 10, na Rússia, não puderam comparecer à cerimônia.
Os presidentes Barack Obama, dos EUA, e Nicolas Sarkozy, da França, além da chanceler da Alemanha, Angela Merkel, e do presidente do Conselho da Itália, Silvio Berlusconi, desistiram de realizar a viagem. Já o presidente russo Dmitri Medvedev compareceu.