?O Ministério Público deve ficar atento ao que está ocorrendo no Rio Grande do Sul. Se o governo ceder à pressão dos sindicalistas da Fetag, para permissão de uso de sementes de origem desconhecida na safra 2006/2007, será um caso de lesa-patria que não atingirá somente o agronegócio mas a sociedade brasileira por extensão. Os representantes de todos os  órgãos governamentais envolvidos na agricultura já reconheceram que não existem razões técnicas para o uso de sementes de origem desconhecida, mas a Fetag ? Federação dos Trabalhadores na Agricultura no Rio Grande do Sul continua pressionando para esse uso ilegal?, denunciou ontem (04.09) o presidente da Abrasem ? Associação Brasileira de Sementes e Mudas, Ywao Miyamoto, durante reunião em Brasília. O próprio ministro da Agricultura, Luís Carlos Guedes Pinto, afirmou em entrevista que ?os estudos técnicos apontam uma baixa qualidade da semente clandestina, o que afeta o rendimento e provoca perdas para os agricultores?.

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Miyamoto alerta que, além dos agricultores gaúchos quererem utilizar sementes ilegais sem nenhum argumento técnico, se o governo vier a liberar o uso, esses agricultores ainda serão beneficiados com financiamentos e seguros do Banco do Brasil. De acordo com a Abrasem, não existe falta de semente certificada nem existe diferença de custo substancial entre semente ilegal e semente certificada. ?A diferença de custo por hectare é de apenas R$ 2,75?, informa Miyamoto. Além disso, a introdução de sementes de origem desconhecida pode acarretar doenças para as plantações de soja, ameaçando toda a produção. ?Só uma pressão política muito forte poderia levar o governo a aceitar uma situação dessas. E é disso que temos medo?, admite o representante dos produtores de sementes certificadas.

Além dos problemas fitossanitários e econômicos, com desestímulo à pesquisa no agronegócio, o uso de sementes de soja não certificadas é um total desrespeito à legislação do setor. ?De uma só vez, eles desobedecem à Lei de Proteção de Cultivares, à Lei de Sementes Certificadas e à Lei de Biossegurança?, afirma Miyamoto. O prof. Décio Zylbersztajn, da USP – Universidade de São Paulo, coordenador de pesquisa sobre o setor brasileiro de sementes, faz avaliação semelhante: ?O uso de sementes de origem desconhecida implica em redução da produtividade das culturas e o favorecimento à disseminação de pragas e doenças. Além disso, reduz a capacidade de competição das empresas que oferecem sementes legais e certificadas, tornando menos atraentes os investimentos em pesquisa de novas variedades.?

De acordo com dados da Abrasem,  existe na atual safra 2006/2007 uma sobra potencial de 8 mil toneladas de sementes certificadas, além do atendimento total da demanda histórica dos últimos 10 anos. ?Como até este momento os agricultores gaúchos adquiriram apenas 33 mil toneladas de sementes certificadas, ainda existe uma oferta de 100.000 toneladas de sementes certificadas à disposição deles?, esclarece. Com relação à alegação de que o governo tem que decidir imediatamente a questão para não atrapalhar o plantio de soja, também não corresponde à verdade dos fatos, acrescenta Miyamoto. ?Qualquer agricultor sabe que no Rio Grande do Sul só se começa a plantar soja em meados de novembro Isso significa que ainda faltam mais de 70 dias para começar o plantio?, adverte.

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Sobre o custo alto do produto, alegado pela Fetag, também não se justifica, de acordo com os dados da Abrasem. Para um custo total de R$ 800,00 despendido por hectare em uma lavoura de soja, aqui incluídos todos os itens como adubação, sementes, plantio, aplicações de inseticidas, fungicidas e herbicidas, colheita, transporte, entre outros, apenas R$ 32,50, ou 4,1% de R$ 800,00 destinam-se a uma saca de 50 kg de sementes certificadas necessárias para o plantio de um hectare. Dentro desse mesmo parâmetro de custos, se o agricultor optar pelo uso de grãos salvos, precisará de uma saca de 70 kg/ha, resultando num custo de R$ 29,75, ou 3,7% do total de custos por hectare.  ?Como é possível que uma diferença de apenas R$ 2,75 num universo de R$ 800,00 justifique toda essa pressão??, indaga.

Para o dirigente da Abrasem, o governo deve atentar para o fato de que uma nova MP permitindo o uso de sementes ilegais no Rio Grande do Sul abre um grave precedente para as demais culturas no País, assim como para novas culturas transgênicas a serem aprovadas para plantio, como algodão, milho e outras. ?O Brasil planta 22 milhões de hectares de soja numa área total de 45 milhões de hectares de produção agrícola. Os agricultores gaúchos de soja respondem por apenas 1 milhão de hectares. Se eles puderem usar sementes de origem desconhecida contrabandeadas, por que os agricultores de outros Estados não poderão fazer o mesmo??, indaga o representante dos produtores de sementes legais certificadas.

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