A priori é mister elucidar o conceito de contribuição previdenciária para um melhor esclarecimento técnico. A contribuição pode ser definida como um seguro que os aposentados e/ou pensionistas pagam ao longo de suas vidas pelo risco de sobreviverem após seu período de trabalho público. Seguindo essa linha de raciocínio, a Previdência deveria ser encarada como uma poupança que se acumula durante décadas para finalmente ser usufruída pelos mesmos nos anos finais.
Quando na ativa, até a data de suas aposentações, os funcionários públicos contribuem mensalmente com uma parcela de seus vencimentos, para que assim, além de estarem contribuindo para o Instituto Previdenciário, ajudam a manter o equilíbrio financeiro e atuarial do Estado, garantindo que ao final de seus préstimos na vida pública sejam outrora recompensados de alguma forma.
Trata-se, em suma, de se questionar um importante aspecto do direito dos aposentados e pensionistas que vão de encontro com o paradoxo insolúvel do Estado que cobra as referidas contribuições (inconstitucionais), mesmo depois do servidor estar aposentado, e/ou de pensionistas de ex-servidores, haja vista o grande déficit financeiro que se acumula cada vez mais nas contas de cada Estado membro, município ou de toda União.
Com o advento da Emenda Constiucional n.º 20, de 15 dezembro de 1998, ficou cristalinamente entendido que a contribuição previdenciária não poderia mais ser objeto de desconto dos servidores públicos inativos ou dos pensionistas que recebiam de seus dependentes pensões de ex-funcionários públicos, como se assevera nos seus artigos 3.º e 40, caput, e parágrafo 12 (EC 20/98), e o artigo 195, inciso II da Carta Magna, conforme já decidiu o Supremo Tribunal Federal.
A administração (no caso o Instituto Previdenciário Paranaense aqui denominado como “Paranaprevidência”), ao continuar implantando a cobrança de tais contribuições aos aposentados e pensionistas, deixou de observar a imunidade constitucional que lhes havia sido assegurada, bem como os sagrados princípios da hierarquia das leis e do direito adquirido.
Doutra parte, em 21 de março do corrente ano, o governador do Estado do Paraná Roberto Requião, através de seu secretário de Administração e Previdência, Reinhold Stephanes, anunciou a suspensão da contribuição de cerca de 40 mil inativos e pensionistas do setor público estadual.
A medida atende a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), que concedeu liminar à Ação Direita de Inconstitucionalidade (ADIN) impetrada pelo Ministério Público Federal do Paraná em 2000. Segundo o secretário de Administração e Previdência, a medida visa também promover justiça social, e ao mesmo tempo não irá causar impacto nas finanças públicas.
Sendo assim, embora o STF tenha concedido apenas liminar, o secretário de Administração e Previdência do Paraná, Reinhold Stephanes comentou não temer que o julgamento do mérito seja contrário a decisão anterior. Além disso, a expectativa é que até lá a reforma previdenciária seja feita. Partindo desse pressuposto, paira a dúvida acerca da taxação dos inativos, que envolve principalmente os servidores públicos, em quaisquer das esferas, sejam elas de origem municipal, estadual ou federal.
Busca-se com tal medida, que adotem a mesma postura política tomada pelo governo do Paraná, não somente pelo entendimento adotado pelo Poder Judiciário, mas também pelo Poder Executivo, a fim de que suspendam imediatamente as contribuições retidas inconstitucionalmente, beneficiando aposentados e pensionistas, classes estas, que paulatinamente são lesadas pela má administração de governos estaduais, que serão os únicos beneficiados pela nova emenda e que insistentemente tentam reduzir o déficit atuarial, em prejuízo de servidores inativos e pensionistas, mascarando um mal maior.
A atual proposta da reforma atinge com clareza solar, direitos adquiridos de cerca de 3,5 mi-lhões de inativos do setor público, em se tratando de contribuição previdenciária (ver art.5.º parágrafo único e §1.º, art. 40, parágrafo 18 e art.149, §1.º da PEC n.º 40/2003). Pois com a atual proposta, os inativos contribuiriam com 11% sobre a diferença entre a remuneração e a o valor de R$ 1.058,00. Sendo assim, a emenda fere nitidamente cláusulas pétreas da Constituição Federal, precisamente em seu art. 60, § 4.º, que não pode ser simplesmente “digerida” pelo Constituinte Derivado.
A contribuição dos inativos pretende violar cláusulas pétreas da Carta Maior, não podendo assim o Congresso Nacional facilmente aceitá-la, pois do contrário a reforma se processará de modo inconstitucional, e desta forma as “Duas Casas” estariam desconhecendo os limites fixados pelo Poder Constituinte Originário.
A promulgação da Emenda Constitucional n.º 40/2003 dificultará sobremaneira, na decisão de mérito da contribuição previdenciária em Brasilía, e com certeza influirá em procedimentos que estão em discussão, dentre eles, a restituição dos valores atrasados da contribuição previdenciária, desde o advento da EC n.º 20/98.
Resta saber se tais argumentos expostos convencerão os 11 ministros do STF, liderados por Maurício Corrêa, a julgar o mérito da contribuição previdenciária favorável aos servidores inativos e pensionistas, após a promulgação da emenda, ou se o futuro desses se reservam aos nossos representantes políticos em Brasília, que inexoravelmente irão aprovar a futura Emenda, tentando de alguma forma corrigir injustiças, buscando utopicamente um maior nivelamento de conquistas sociais, dentre estes, o sobrestamento das contribuições previdenciárias.
Guilherme Tomizawa
é advogado, bacharel em Administração Pública, especialista em Direito de Família pela PUCPR e mestrando em Direito Público pela Universidade Gama Filho do Rio de Janeiro.