Nesses tempos dicotômicos de globalização e regionalização, recessão mundial e intensificação das relações comerciais, intensifica-se o debate em torno da importância do fortalecimento do Mercosul.

O governo federal tem demonstrado a opção pela intensificação das relações não só com os membros do bloco econômico, mas também com os demais países da América do Sul. Em seu discurso de posse, o presidente Lula já afirmava: “A grande prioridade da política externa durante o meu governo será a construção de uma América do Sul politicamente estável, próspera e unida, com base em ideais democráticos e de justiça social. Para isso é essencial uma ação decidida de revitalização do Mercosul, enfraquecido pelas crises de cada um de seus membros e por visões muitas vezes estreitas e egoístas do significado da integração.”

No plano político, os fatos apontam para uma estratégia nesse sentido. Nos quatro meses do novo governo, o Brasil já recebeu a visita dos presidentes da Venezuela, Hugo Chávez; da Bolívia, Gonzalo Sánchez de Losada; do Peru, Alejandro Toledo, além de ter agendado a recepção aos presidentes do Equador, Lucio Gutiérrez, e do Chile, Ricardo Lagos. Ainda que o tempo tenha sido escasso para a realização de medidas concretas, parece estar definido o direcionamento da política externa brasileira aos vizinhos latino-americanos. Magnoli afirma que se trata de um resgate da história nacional: “Lula comporta-se, no cenário externo, como herdeiro da tradição principal da diplomacia brasileira. A liderança da América do Sul foi a meta do barão do Rio Branco, o “pai fundador” da nossa política externa contemporânea.” (MAGNOLI, Demétrio. Folha de São Paulo, 19/01/2003, p. A-14)

Sob o ponto de vista do Mercosul, o cenário se apresenta ainda mais favorável. Lula visitou e recebeu a visita de Eduardo Duhalde, atual presidente da Argentina. A relação do Brasil com este país é considerada pelo Chanceler Celso Amorim como o “pilar da construção do Mercosul”, mostrando-se positivo o fato de o candidato que lidera as pesquisas de intenção de voto no segundo turno das eleições para presidente, Nestor Kirchner, demonstrar preferência pelo bloco regional, em detrimento de um acordo com os EUA (que, contraditoriamente, está no plano de governo do outro candidato, Carlos Menem, justamente o signatário do Tratado de Assunção – que instituiu o Mercosul, em 1991). Além disso, o recém-eleito presidente do Paraguai, Nicanor Duarte Frutos, mostrou durante o processo eleitoral sua visão voltada ao fortalecimento do Mercosul.

Do ponto de vista externo, a realidade parece convergir para a reaproximação dos países que compõem o Mercosul. Resta, contudo, transformar esse potencial político em realidade.

Algumas decisões importantes nesse sentido parecem começar a aparecer. Um exemplo disso está nas recentes ações do BNDES, no sentido de desenvolver estudos e negociações para financiar exportações da Argentina para o Brasil, através da abertura de linha de crédito. O novo governo brasileiro já vinha tomando iniciativas nesse sentido, em relações bilaterais com outros países da América do Sul, como Venezuela e Bolívia.

São decisões como essas que efetivamente demonstram um interesse não meramente retórico no fortalecimento do Mercosul e na liderança da América do Sul. Mas muita coisa ainda há que ser feita para não se repetirem os erros cometidos nos governos anteriores, quando foram construídos importantes arcabouços jurídico-institucionais, porém, desprovidos de vontade política de realização e de aceitação das restrições que os países devem sofrer ao fazer parte de um processo de integração.

Tatyana Scheila Friedrich é advogada, mestre pela UFPR, membro e atual secretária do Nupesul (Núcleo de Pesquisa em Direito Público do Mercosul/UFPR) e Professora de Direito Internacional Público no curso de Direito das Faculdades Curitiba e nos cursos de graduação e pós-graduação em Relações Internacionais da Universidade Tuiuti do Paraná – UTP.

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