O Plano Real fez ontem dez anos. Teria sido, segundo a maioria dos homens que hoje ocupam o governo federal, um estelionato eleitoral. Um golpe de propaganda, um engodo, uma promessa pública demagógica que levou o então ministro da Fazenda de Itamar Franco, Fernando Henrique Cardoso, a ganhar as eleições. E por esta e principalmente por razões adicionais e negociações não confessadas, o que não significa inconfessáveis, a se reeleger como presidente da República.
Foi, para os técnicos que o elaboraram e o ministro e candidato que o sancionou e aplicou, um plano diverso dos que antes foram apresentados por outros governantes e fracassaram. Os planos anteriores, além da contenção dos preços via congelamentos e tabelamentos, além de confiscos, tinham em seu bojo uma promessa de desenvolvimento econômico e social que o Real não teve. Ele apenas estabeleceu uma pré-condição.
Para o povo, o importante era a contenção dos preços de bens de consumo em geral e dos alimentos. Era-lhe um tanto difícil entender um plano que contivesse só o objetivo de frear e, se possível, acabar com a inflação galopante. Inflação que chegou a projetar 5.000% ao ano, um número tão abismal que fazia prever a desorganização total da economia, da administração, da sociedade brasileira, enfim.
Mas em toda a sua concepção, jamais o Plano Real visou congelamentos, tabelamentos, punições ao comércio e à indústria e outros aparentes remédios que outros planos aplicaram e que amainaram por curto espaço de tempo a justa revolta do povo, mas não suas vicissitudes. Isso porque os preços subiam porque o valor do dinheiro caía e não o inverso, como se tentava fazer crer.
O Real teve o mérito de entender isso. Valorizar o dinheiro foi mais importante do que controlar ou congelar preços. O dinheiro é uma mercadoria que, trocada por bens, precisa ter o seu valor o quanto possível estável, e o sistema de utilização de valores de referência levou a isso que parecia um milagre. A inflação despencou com o Plano Real. O que se conseguiu foi a valorização do novo dinheiro e não a desvalorização das mercadorias. Um real passou a valer um dólar e isso parecia um milagre, que credenciava o pai do plano, ministro Fernando Henrique Cardoso, a ser eleito presidente da República.
A estabilização da moeda em valor igual ao do dólar fez com que as classes mais pobres da população fossem de imediato beneficiadas. Calcula-se que seus ganhos aumentaram, em termos de poder de compra, 17%. Isso porque, ao receberem os seus salários, os trabalhadores podiam planejar o mês. A pressa em correr para o supermercado, antes que, já no dia seguinte, as mercadorias começassem a aumentar, o que era o seu salário encolher, desapareceu.
Os menos aquinhoados foram os primeiros beneficiados, pois os mais ricos, capazes de fazer poupanças e aplicações, em geral na ciranda financeira, tinham nos juros auferidos o ?hedge? para as perdas do dinheiro que utilizavam em suas compras e manutenção. Mas continuou e, de certa forma, continua até hoje, a má interpretação do que foi realmente o Plano Real. Ele não foi um plano econômico. Foi um plano de estabilização da moeda e, nisto, temos de reconhecer que deu certo. Muito certo. Faltam os demais planos, de desenvolvimento econômico, que ele não continha nem prometia…