A preclusão no Processo Executivo Trabalhista

1. Introdução

A palavra preclusão tem sentido de “perda, caducidade de um direito de um termo ou de uma faculdade legal ou processual que não foi exercitada dentro do tempo prefixado”(1).

Existem três tipos de preclusão: a) temporal, como prevista no art. 183 do CPC, caracterizando-se com a perda da faculdade de praticar ato processual em virtude de haver decorrido prazo, sem que a parte o tivesse praticado, ou o tenha praticado a destempo ou de forma incompleta ou irregular; b) lógica, “que extingue a possibilidade de praticar-se ato processual, pela prática de outro ato com ele incompatível”(2); e c) consumativa, que ocorre “quando a perda da faculdade de praticar o ato processual decorre do fato de já haver ocorrido a oportunidade para tanto, isto é, de o ato já haver sido praticado e, portanto, não pode tornar a sê-lo”(3).

2. Efeito preclusivo em caso de ausência de manifestação sobre cálculos apresentados pela parte contrária

O parágrafo 2.º do artigo 879 da CLT, com a redação da Lei n.º 8.432, de 11.06.92 (DOU 12.06.92) estabelecia: “Elaborada a conta e tornada líquida, o Juiz poderá abrir às partes prazo sucessivo de 10 (dez) dias para impugnação fundamentada com a indicação dos itens e valores objeto de discordância, sob pena de preclusão”.

De imediato, surgiu controvérsia sobre a exata interpretação desse texto legal, que até hoje seguia polêmica e longe de ser pacificada.

A primeira corrente defendia a seguinte tese: “Aberta vista dos cálculos, terão as partes que se manifestar sobre aqueles. Não o fazendo, não mais poderão externar sua manifestações quando dos embargos, no caso do executado, ou na impugnação, na hipótese do exeqüente, pela ocorrência da preclusão. As partes não mais poderão falar sobre a questão nos embargos à execução ou na impugnação de que trata o parágrafo 3.º do artigo 884 da CLT, em razão da ocorrência da preclusão”(4).

A segunda corrente, que podemos chamar de restritiva, assim se posicionava: “A faculdade prevista no parágrafo 2.º do artigo 879 da CLT tem aplicação restrita aos cálculos apresentados pelo contador, e não pelas partes, sob pena de tratamento diferenciado aos litigantes, em flagrante ofensa ao artigo 125, I, do CPC, uma vez que a preclusão estabelecida estaria restrita ao devedor”(5).

Ainda não pacificada essa questão, surge a Lei n.º 10.035/00, que acrescenta os parágrafos 1.º-B e 3.º ao artigo 897 da CLT.

O § 1.º-B do art. 879 da CLT menciona: “As partes deverão ser previamente intimadas para a apresentação do cálculo de liquidação, inclusive da contribuição previdenciária incidente” e o § 3.º do mesmo dispositivo estabelece: “Elaborada a conta pela parte ou pelos órgãos auxiliares da Justiça do Trabalho, o juiz procederá à intimação por via-postal do Instituto Nacional do Seguro Social (…) para manifestação, no prazo de dez dias, sob pena de preclusão”.

Em face, assim, do que está posto no artigo 879 da CLT, pela Lei n.º 10.035, através dos parágrafos 1.º-B e 3.º, pode-se entender que, desde 26.10.00, como leciona o Professor Antônio Manoel Teixeira Filho: “a critério exclusivo do juiz, os. cálculos de liquidação poderão ser feitos pelas partes ou por algum auxiliar do juízo, como é o caso do contador. Sendo assim, se uma das partes deixar de manifestar-se acerca dos cálculos apresentados pela outra, haverá, para aquela, preclusão, por forma a impedi-la de discutir os cálculos (por meio de embargos, de agravo de petição, de recurso de revista etc.) na mesma relação processual. Não fosse assim, não faria sentido a preclusão de que trata a lei”(6).

O que pode se controverter é se existe condição para a aplicação dessa regra geral. A Seção Especializada do E. TRT da 9.ª Região, em sua maioria, entende que sim, ou seja, posiciona-se no sentido de que não havendo a necessária intimação sob pena de preclusão, ela não se aplicaria(7).

3. Oportunidade de apresentação de cálculos pelas partes continua sendo faculdade do juiz

Sobre a alteração legislativa em comento, é importante salientar que não desapareceu o caráter facultativo da abertura de prazo para impugnação aos cálculos de liquidação. O parágrafo 3.º do artigo 879 da CLT deixa evidenciado que a iniciativa para a liquidação do julgado compete às partes ou aos órgãos auxiliares da Justiça do Trabalho.

4. Evidente erro material

Essa preclusão, entretanto, vale lembrar, representa penalidade dirigida à parte, e não ao juiz. Este pode, evidentemente, rever a conta mesmo diante de eventual preclusão para a parte. Isto ocorre, por exemplo, em caso de manifesto erro material que eive a coisa julgada. Erro do tipo corrigível de ofício, na forma dos artigos 833 e 897-A, parágrafo único, da CLT.

Eventual preclusão temporal no processo de execução não pode se sobrepor ao dever de obediência à coisa julgada, terreno em que o juiz atua de ofício, por se tratar de matéria de ordem pública (arts. 473 e 267, § 3.º, do CPC).

Assim, por exemplo, o fato de o exeqüente não ter requerido, em cinco dias, a atualização entre a data do depósito e a de ciência da disponibilidade do crédito não milita em favor do executado, mais ainda se expressamente garantida no título executivo e, ainda, naturalmente, pela lei (art. 293/CPC), independente de pedido (Súmula 211 do C. TST)(8). Esta é uma circunstância apta a afastar a incidência da preclusão.

Contrario sensu, se os cálculos são elaborados de acordo com a sentença, reformada, todavia, por acórdão que restringe a condenação, mesmo o executado tendo perdido prazo para embargar, o juiz, da mesma forma, em respeito ao princípio constitucional da coisa julgada, pode determinar a adequação da conta.

5. Conclusões

a) A preclusão é a perda, extinção ou consumação de uma faculdade processual, que pode ser temporal, lógica e consumativa;

b) Em face da nova redação do artigo 879, com os parágrafos 1.º-B e 3.º, não remanesce mais o antigo entendimento no sentido que somente os cálculos apresentados pelo contador atrairiam a preclusão. Sempre que determinado pelo juiz, sob prévia e expressa cominação, se uma das partes não se manifestar sobre os cálculos apresentados pela outra, terá que ser reconhecida a preclusão, impossibilitando que sejam controvertidos em embargos e agravo de petição;

c) Não desapareceu o caráter facultativo da abertura de prazo para impugnação aos cálculos de liquidação (parágrafo 3.º do art. 879 da CLT);

d) A preclusão, entretanto, representa penalidade dirigida à parte, e não ao juiz, que pode, sempre, diante de manifesto equívoco (erro material), rever a conta, mesmo diante de eventual preclusão para a parte.

Notas:

(1) NUNES, Pedro. Dicionário de Tecnologia Jurídica. Vol. II. 9.ª ed. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1976. p. 681.

(2) NERY JUNIOR, Nelson e NERY, Rosa Maria de Andrade. Código de processo civil comentado. 6.ª ed. São Paulo: RT, 2002. nota de rodapé 3 ao art. 183. p. 534.

(3) Ob. e p. cit. nota 4 ao art. 183.

(4) MARTINS, Sergio Pinto. Comentários à CLT. 4.ª ed. São Paulo: Atlas, 2001., p. 855.

(5) TRT-PR-AP-3.491/98. Rel. Juiz Luiz Eduardo Gunther. Ac. 6.632/99. 2.ª T. DJPR 16.04.99.

(6) TEIXEIRA FILHO, Manoel Antonio. Execução no Processo do Trabalho. 7.ª ed. São Paulo: LTr, 2001. p. 22.

(7) TRT-PR-AP 27511-1998-651-09-00-4. Rel. Juiz Luiz Eduardo Gunther. DJPR 26.03.04.

(8) “Os juros de mora e a correção monetária incluem-se na liquidação, ainda que omisso o pedido inicial ou a condenação”.

Luiz Eduardo Gunther

é juiz do TRT da 9.ª Região e professor das Faculdades Integradas Curitiba, e Cristina Maria Navarro Zornig é assessora no mesmo Tribunal.

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