Amanhã teremos eleições. Serão eleitos alguns governadores e o presidente da República. Este, entre Lula e José Serra, na verdade dois social-democratas, um mais à esquerda e de oposição e outro mais afinado com o centro e situacionista. Tudo indica que perderá o governo. Perderá o situacionismo que, embora tenha obtido avanços em diversas e importantes áreas, encerra oito anos de mandato de FHC em meio a uma séria crise. Crise financeira, baixo desenvolvimento econômico, crise internacional, de segurança e o agravamento das questões sociais. Estas remanescem agudas e em níveis capazes de indignar qualquer cidadão de sensibilidade e bom senso. Novidade? Não, mas uma realidade que se arrasta por décadas, séculos, sem nunca ter sido enfrentada de forma radical, o que exige vontade política não só do presidente e sua equipe, mas também do Congresso Nacional, dos demais níveis de governo e de todos os cidadãos. Se não, só via revolução, o que é uma rima, mas pode não ser uma solução.

Escolhemos a democracia e a nossa, ainda longe da perfeição, vem se consolidando dia após dia e a olhos vistos. E o segundo turno de amanhã é um passo essencial, que comprova esse avanço. Tanto mais que as perspectivas são de que, pela primeira vez na história republicana, seja eleito um candidato de esquerda, Lula, que tomará posse de forma inconteste, com uma transição de poder tranqüila, adredemente preparada pelo atual governo de forma civilizada. Até cortês e colaboracionista.

Tanto na hipótese da vitória de Serra, quanto na quase certa de Lula, a prática vai chocar-se com a gramática de cada candidato. No caso de Serra, certamente menos, pois embora social-democrata dos mais à esquerda do atual governo, com várias passagens de discordância com a administração à qual serviu como parlamentar e duas vezes ministro, tem familiaridade com a prática. Sua gramática difere da que rege a administração FHC. Mas é mais em grau do que em fundamentos. E sua prática, mesmo tendo sido membro do governo, não será suficiente para manusear todos os assuntos da administração com a desenvoltura que imagina.

Muitos problemas apenas vislumbra, sem ter de enfrentá-los como presidente, como acontecerá se eleito. Revelarão que, na prática, nem toda a sua gramática, montada com participações no poder, como legislador e com invejável currículo acadêmico, evitará que tenha de enfrentar gravíssimos problemas nacionais e possa incorrer em impensados erros e fracassos.

O problema é mais grave para Lula, líder político e sindical inconteste, mas que não tem experiências administrativas, não tem prática e carrega uma gramática de teses idealistas, nem sempre consoantes com a realidade.

Parece que, já às vésperas de sua esperada eleição, seus assessores o vêm advertindo disso. De que deve, desde logo, ir dizendo ao povo que não espere milagres, que dê tempo ao tempo, pois sua gramática pode estar longe ou mesmo em vias de chocar-se com a prática.

Seja eleito um ou outro, à nação se pede paciência. Nada vai ser resolvido do dia para a noite. E no caso de Lula, cuja eleição é quase uma certeza, que lhe ofereçamos um amplo e largo voto de confiança. Afinal de contas, ele já nos está oferecendo a chance de darmos um largo passo rumo à consolidação da democracia brasileira.

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